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Cães alegram e contribuem para a recuperação de crianças hospitalizadas

Se ficar dentro do hospital para tratar a saúde já é desafio (chato) a ser enfrentado por adultos, imagine como é para as crianças. Ter que ficar longe de parte da família e dos amiguinhos é um dos piores momentos do tratamento. Por conta disso, muitos dos pequenos respondem mal à ação dos remédios e demoram mais tempo para se recuperar.

Neste cenário surge aquele que já ganhou o título de melhor amigo do homem: o cão. Sim, os cães estão sendo adotados como importantes ferramentas para o tratamento e recuperação da saúde.

Dentro do hospital, a criança passa por diversas transformações, tanto físicas quanto psicológicas. Isto gera uma baixa na autoestima, o que deixa o sistema imunológico dela mais baixo e, com isso seu quadro clínico piora. Inserir o animal dentro do hospital é uma forma de devolver à criança o contato com o mundo externo.

Um estudo publicado no Journal of the American Association of Human-Animal Bond Veterinarians (periódico da Associação Americana de Veterinários de Ligação Animal-Humano), mostra que após 15 minutos de interação com um animal já são liberados no organismo neurotransmissores importantes, ligados às sensações de prazer e bem-estar.

A ciência vem comprovando que a terapia com o cão pode proporcionar redução na frequência cardíaca, relaxamento corporal e equilíbrio respiratório. Desta forma, um projeto piloto entre a classe escolar do hospital Júlio Muller e a Diretoria de Bem-Estar Animal da Prefeitura de Cuiabá, e outros parceiros, vem sendo desenvolvido na ala pediátrica da unidade. O objetivo é a construção de um ambiente lúdico, recreativo, transmitindo ao paciente um tratamento de maior confiança e interação.

Cães alegram e contribuem para a recuperação de crianças hospitalizadas Projeto piloto “Cão Terapia” é desenvolvido no Hospital Universitário Júlio Müller com objetivo de amenizar desconfortos dos pacientes internados Coordenadora da classe escolar hospitalar do Hospital Universitário Júlio Müller, a professora Valéria Melli Arisi conta que o hospital atende pacientes de toda a localidade e é referência no Centro-Oeste em Patologias Crônicas. “

Neste segmento a gente tem por objetivo a saúde e resgatar todo o direito que a criança tem para a infância. Como as hospitalizações são prolongadas, o objetivo do projeto era amenizar esses desconfortos de rotina”, alega.

A professora explica ainda que o cão terapeuta entra no hospital para dar legitimidade nos direitos das crianças, preconizados no Estatuto da Criança e do Adolescente. O projeto já ocorreu na Universidade Federal de Mato Grosso e ao Hospital Júlio Müller, vinculado ao curso de Veterinária, mas a ênfase deu na parte da ecoterapia.

O “cão terapeuta”, conforme ressalta Valéria, não foi o foco. Quando em 2018 teve alguns episódios da visita canina no hospital. “Decidimos retomar o projeto. Começaram a surgir parceiros. Alinhavámos para que as visitas esporádicas dos cães fossem mais constantes. Os cães terapeutas vem no hospital sempre que necessário. Não temos uma data prevista. O dia que o paciente demonstra apatia, indisposição e precisa de algum gatilho mais forte para tirá-lo daquela energia, os cães vêm e interagem, amenizam e distraem. Todos os dias é dia de cão terapia, depende da necessidade do paciente”, avalia.

A advogada Priscila Russo, “mamãe” dos cães terapeutas Ploc e Porcelana, afirma que a idealização da cão terapia era um sonho antigo. Ela destaca que adquiriu o Ploc em um momento muito triste da vida, em 2013, quando perdeu o pai e logo em seguida a mãe; foi o animal que a ajudou na recuperação. Isso fez com que surgisse a ideia de levar a mesma oportunidade a outras pessoas.

 “Eu nunca tive depressão e nunca tomei remédio. Mas tenho certeza de que o causador de eu não precisar Abril 2019 29 foi o Ploc. Eu sempre quis implantar isso dentro dos hospitais, quando passei a fazer parte”, afirma.

Priscila explica que a ideia de inserir um cão para o ambiente hospitalar ocorre devido ao suporte emocional que o animal dá. “Para a criança hospitalizada isso é muito importante. Passamos, por exemplo, por uma menina receber medicação. Ela não queria levantar-se da cama. Quando os cachorros chegaram, ela já se levantou. Já queria passar a mão neles. Isso dá alegria para uma criança que está hospitalizada, com a saúde frágil, melhora tudo”.

Apesar de não gostar do ambiente do hospital, Priscila conta que quando é para levar os animais para a cão terapia ela sente que está indo se divertir.

“É muito gostoso. Fazer parte da cão terapia é muito gratificante. Não tem preço chegar com um cachorrinho no quarto e a criança que estava triste abrir um sorriso”, reforça. Desde o início do projeto, o adestrador Evandro José Gollmann vem a somar à cão terapia. Ele, que está na profissão há pelo menos 13 anos, diz que fazer parte do projeto é inexplicável.

Evandro conta que foi convidado pela Secretaria de BemEstar Animal da Prefeitura de Cuiabá. Ele atua como treinador, fica responsável por escolher animais para a cão terapia e treiná-los. “É sugerido um padrão de comportamento nato e desenvolvido comandos, melhorando a interação entre o cão e a criança. Essa interação é saudável e a gente a enriquece com um pouco mais de informação no que se refere ao cãozinho entender”, diz. Evandro explica que além do contato direto vêm comandos de como se sentar, dar a pata, fingir-se de morto, rolar.

“O adestramento vem com mais recursos para ter uma interação mais agradável. Só dos pacientes verem o cãozinho já se alegram. Quando o animal obedece aos comandos, potencializa esta sensação positiva que eu não tenho dúvida nenhuma que traz um efeito extraordinário na melhora da saúde”, frisa.

Sobre a importância dos cães na unidade de saúde para o tratamento das crianças, Evandro diz que se for falar da intenção pura seria a consciência do bem que faz a interação com o animal. O adestrador cita que até mesmo na família dele, no caso de pacientes psiquiátricos, há inúmeras histórias de recuperação da saúde com esta aproximação.

 “A sensação de fazer parte da cão terapia é indescritível. Às vezes, quando a gente chega, a pessoa está abatida, conseguir ver o sorriso das pessoas, o olhar, tudo isso é uma sensação muito boa. Faltam palavras, não tem preço”, afirma.

Legenda

A pediatra Mariana Reginaldo Silva ressalta que todos os projetos que visam humanizar a pediatria, trazer alegria para os pacientes, melhora significativamente a condição do tratamento da criança.

“Uma criança demora muito menos pra se recuperar de uma doença no sentido de que ela vai estar muito mais calma durante a internação e aceitar os tratamentos que os profissionais propõem com mais tranquilidade. Ela vai enxergar a doença de uma forma amena e que o ambiente não é um ambiente ruim”, explica.

Mariana destaca que existem muitos estudos que mostram a recuperação das crianças, não só na cão terapia, mas em todos os projetos que envolvem o brincar e humanização da pediatria em geral.

“Temos um paciente com lúpus que a partir do momento em que o cão terapeuta Ploc fez contato com ele, conseguiu se levantar de um processo de depressão em que estava entrando por conta do descobrimento da doença. É notório que a recuperação dele está intimamente ligada com a cãoterapia”, afiança.

A pediatra reforça que toda vez que se traz práticas para amenizar a internação, deixar a criança mais tranquila, melhora o tratamento e diminui o tempo de internação. “Os reflexos se percebem na equipe inteira, na equipe profissional, nos pais, na criança, todo mundo fica muito mais tranquilo, o enfrentamento da doença melhora, é um conjunto de ações que trazem resultados”, afirma.

Além da melhora visível, a mamãe Jéssica Rosa da Silva conta que a cão terapia ajudou a filha, de apenas 6 a anos, ter contato com animais e gostar deles, o que antes não acontecia. Elas são moradoras da cidade de Juína e vieram transferidas ao Júlio Müller após a menina ser diagnosticada com a síndrome de Guillain Baré.

Trata-se de um distúrbio autoimune, ou seja, o sistema imunológico do próprio corpo ataca parte do sistema nervoso, que são os nervos que conectam o cérebro com outras partes do corpo. É geralmente provocado por um processo infeccioso anterior e manifesta-se com fraqueza muscular, redução ou ausência de reflexos.

“Foi muito bom este contato dela com os animais. Antes ela tinha medo, aqui ela se comportou totalmente diferente. Acho muito importante este projeto, ele traz distração às crianças neste ambiente do hospital e ajuda também no tratamento”, avalia Jéssica Rosa.

Visitas – Durante as visitas, além dos tradicionais afagos e brincadeiras, os cães estimulam a socialização das crianças, que dessa maneira se tornam mais receptivas ao ambiente hospitalar. Antes de todo atendimento, o cão terapeuta passa por higienização, garantindo não só sua saúde como também a segurança dos pacientes assistidos.

Todas as crianças internadas nos quartos, desde que não apresentem restrição médica, recebem a visita dos cães. Embora ainda não exista uma forma de quantificar os resultados das terapias assistidas, existem evidências suficientes que comprovam os efeitos positivos do contato com animais.

Alguns exemplos: ajudar a criança a entrar em contato com a realidade e a focar a atenção favorecendo estados de ânimo positivos, tanto de pacientes como de terapeutas, auxiliando a superar a depressão, além de estimular o contato social e físico, por meio do estímulo às carícias das crianças nos cães com prazer, são alguns dos benefícios apontados.

 Isso tudo, além de ser um excelente canal de comunicação emocionalmente seguro com as crianças, que não se sentem julgadas, pois ensina a responsabilidade e reforça a autoestima, sobretudo quando a criança ajuda a cuidar do cão, por meio da diversão e a brincadeira, uma distração positiva que ajuda a diminuir a sensação de isolamento.

Redação

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Reportagens realizada pelos colaboradores, em conjunto, ou com assessorias de imprensa.

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