Política

Delegado diz que prisões no caso dos grampos não são mérito da PJC

“Nunca uma polícia civil no território brasileiro agiu contra o governo de seu estado como agimos no ano passado. Claro que não foi mérito da Polícia Judiciária Civil de Mato Grosso. Se dependesse da instituição PJC-MT, nada teria acontecido”. A afirmação é do delegado Flávio Henrique Stringueta, um dos responsáveis pelas investigações do caso conhecido nacionalmente como Grampolândia Pantaneira.

Em texto lançado à imprensa logo após a cerimônia de premiação do GW100, na qual era indicado como personalidade do ano – categoria na qual também concorriam o promotor de justiça Mauro Zaque e o desembargador do Tribunal de Justiça Orlando Perri -, Stringueta destacou um movimento percebido na Justiça brasileira nos últimos tempos, o qual, segundo a interpretação, teria sido aflorado com a Operação Lava Jato.

De acordo com o delegado, por muito tempo a prisão de grandes figurões da política foi impensada até mesmo na instituição da polícia. Em suas palavras, Stringueta lembrou como foi isolado pela própria Polícia Civil ao pregar a ética profissional no meio dos colegas e devido à sua forma de atuação. Afirmou, ainda, que era visto como um “alienígena” por uns e como “oportunista” por outros. No entanto, em razão dos valores recebidos, nunca deixou-se ser dominado pelo medo. Segundo ele foi graças à essa postura que conseguiu atuar na operação Esdras, que prendeu coronéis e pessoas do primeiro escalão do governo do Estado.

“Isso é fundamental para que você faça o que precisa ser feito, doa a quem doer. Isso me proporcionou atuar nas investigações da tal Grampolândia Pantaneira sem medo de ataques pessoais e profissionais. Isso me ajudou a passar por grandes tribulações no ano de 2017, ser jogado a escanteio por minha instituição, estar no ostracismo. Mas hoje tenho certeza que eu fiz o correto, o que a sociedade queria que fosse feito, o que eu próprio queria que fosse feito se o investigador não fosse eu, mas eu fosse o recebedor da sua ação investigativa. Não tive medo, podem acreditar, mesmo atuando contra o governo, algo inédito no Brasil”, diz trecho do documento.

A respeito das prisões, Stringueta foi categórico ao afirmar que a Polícia Civil não atuou como deveria. Segundo ele, as ações da instituição dependeram do esforço do desembargador Orlando Perri, responsável pelo caso dos grampos ilegais. Diante disso, ele defendeu que as polícias civis de todos os estados tenham mais autonomia para atuar e considerou que “isso trará inúmeros benefícios à sociedade de bem”.

Confira abaixo o texto na íntegra:

A visão dos brasileiros.

O que fez o povo brasileiro começar a achar que o errado é errado?

Até muito pouco tempo atrás, essa pergunta não tinha sentido. O errado era certo, e ponto.

Quem fazia o certo não era bem visto. Ou era visto com desconfiança: olha aí mais um sujeito querendo aparecer para ser candidato a alguma coisa. Pois é, aquele que dizia ser defensor do ético, da moral média e dos melhores valores era visto como um oportunista.

E agora, por que essa mudança? Por que ser correto e se conduzir pelo direito passou a ser aceito pela maioria?

Desde que entrei na carreira policial, pensava em me esforçar o quanto possível para deixar uma polícia melhor para os meus filhos. No começo foi muito difícil. Muitos me viam como uma espécie de alienígena. Eu também me vi como um alienígena. Chegaram a me chamar de delegado frustrado, dizendo que eu queria ter sido promotor de justiça, como se essa classe fosse diferenciada (eticamente) das demais. Infelizmente, à época, era. Hoje não mais: seus benefícios imorais a tornaram eticamente "iguais", senão piores, do que as outras – sentam nos próprios rabos e falam das feridas das demais.

Eu já me vi em situações, no início de minha carreira, no mínimo embaraçosas. Cheguei a ser ignorado em rodas de policiais quando eu pregava a legalidade e a moralidade do trabalho policial. Literalmente me deixaram falando sozinho. Eu era novo e estava aprendendo. E aprendi a me isolar. Me isolar das más influências. Fiz a "minha polícia" por onde eu passei, com o auxílio dos "meus policiais", que compraram a "minha ideia".

Sabem, o que eu queria, já falei, era deixar algo diferente, e melhor, para os meus descendentes. Não havia a menor possibilidade de conseguir isso sem um esforço pessoal. Descobri que o meu esforço não era, e não é, tão difícil quanto vi no começo da carreira. Bastou fazer o que é certo. Os valores que meus pais me deram são suficientes para tanto.

Eu me lembro dizendo aos "meus policiais": nunca deixem que ninguém fique com seus "rabos nas mãos".

Isso é fundamental para que você faça o que precisa ser feito, doa a quem doer. Isso me proporcionou atuar nas investigações da tal GRAMPOLÂNDIA PANTANEIRA sem medo de ataques pessoais e profissionais. Isso me ajudou a passar por grandes atribulações no ano de 2017, ser jogado a escanteio por minha instituição, estar no ostracismo. Mas hoje tenho certeza que eu fiz o correto, o que a sociedade queria que fosse feito, o que eu próprio queria que fosse feito se o investigador não fosse eu, mas eu fosse o recebedor da sua ação investigativa. Não tive medo, podem acreditar, mesmo atuando contra o governo, algo inédito no Brasil – nunca uma polícia civil no território brasileiro agiu contra o governo de seu estado como agimos no ano passado.

Claro que não foi mérito da Polícia Judiciária Civil de Mato Grosso. Se dependesse da instituição PJC/MT, nada teria acontecido. Não como aconteceu. Fomos respaldados pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso. Minto, fomos respaldados pelo Dr. Orlando de Almeida Perri. Por isso a PJC/MT produziu tanto em 2017. Por isso que é essencial que as polícias civis de todos os estados tenham autonomia para atuar, o que trará inúmeros benefícios à sociedade de bem.

Lembram do que disse atrás sobre ser oportunista? Outro dia fui questionado por um colega delegado de polícia, com certo grau de espanto: tinha certeza que você seria candidato a deputado estadual?! Eu não tive reação, pois nunca pensei nisso. Só provou que algumas pessoas, talvez a maioria, pensava que eu seria mais um oportunista. Não mancharia minha reputação com algo assim. Não colocaria minha imagem em discussão para ser candidato. Não deixaria para ninguém a oportunidade de julgar minha conduta com base em parâmetros inadequados que são julgados nossos políticos. Infelizmente, ou felizmente, não serei eu quem será o "candidato da renovação". Desculpem minha omissão e covardia.

Dias atrás, fui agraciado com a indicação para receber o prêmio de "Personalidade do Ano", pela GW 100. Concorria com as sumidades Orlando Perri e Mauro Zaque. As minhas chances eram mínimas, percebem? Mas a indicação já foi uma vitória. Não esperava ter chegado tão longe. Só pensava em me aposentar e ter tornado a polícia de Mato Grosso um pouco melhor. Estou muito feliz pelo que recebi em troca. Deus me deu muito mais do que eu, creio, mereço. Parabéns ao Dr. Orlando Perri pelo prêmio, muito mais do que merecido. E parabéns também ao Dr. Mauro Zaque pela indicação, muito merecida também.

Voltando ao tema da minha reflexão, eu creio que a mudança de paradigmas da sociedade brasileira esteja na confiança que as instituições estão demonstrando ter. Principalmente a polícia federal, os procuradores da república e a justiça federal, especificamente na Operação Lava Jato. Não acreditávamos que políticos graúdos um dia seriam pegos. Mato Grosso está acompanhando esse caminho, já é o Estado que mais prendeu políticos graúdos fora da Lava Jato. Acho que tive um pouco de participação nisso. Se tive mesmo, creio que cumpri meu objetivo de dar aos meus filhos algo melhor do que recebi.

Clamo à população que nos acompanhem nessa nova era política/ética/moral para a melhoria do nosso país.

Flávio Henrique Stringueta.

Delegado de Polícia

Redação

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Reportagens realizada pelos colaboradores, em conjunto, ou com assessorias de imprensa.

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