Política

Ex-governador do MT montou esquema de corrupção com a família

Nesta manhã de domingo (3), o site O Globo fez uma matéria relatando o esquema de corrupção criado pelo ex-governador Silval Barbosa (PMDB), durante o período em que governou o estado mato-grossense, entre os anos de 2010 e 2014, que incluiu toda a sua família. Delator da organização criminosa, ele a esposa, filho e irmão também entraram na mesma barca e também firmaram acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República. Juntos eles devolverão aos cofres estaduais cerca de R$ 76 milhões.

Veja matéria na integra:

Inexpressivo politicamente fora de Mato Grosso, o ex-governador Silval Barbosa (PMDB) foi alçado ao cenário nacional na semana passada como delator do maior esquema de corrupção revelado em seu estado, inclusive com a divulgação de políticos locais escondendo maços de dinheiro em bolsas, mochilas e paletós. Acusado de liderar uma organização criminosa que pode ter saqueado até R$ 1 bilhão dos cofres públicos, ele mesmo é acusado de ajudar a engendrar o ambiente favorável à roubalheira no estado. Por quatro anos, o ex-governador pôs toda a família para participar do esquema: mulher, filho e irmão.

É esperada para daqui um mês a primeira sentença do ex-governador na Justiça de Cuiabá. Depois de ter ficado um ano e nove meses preso no Centro de Custódia de Cuiabá, ele conseguiu, em junho passado, ter a prisão transferida para seu apartamento duplex na capital mato-grossense. Enquanto estava na cadeia, viu a mulher e o filho pararem atrás das grades.

A ex-primeira-dama Roseli de Fátima Meira Barbosa e o filho Rodrigo da Cunha Barbosa foram alvos da investigação que está sendo chamada de Lava-Jato pantaneira. Mãe e filho estão soltos, aguardando julgamento. Rodrigo, assim como o pai, usa tornozeleira eletrônica. Roseli é acusada de participar de um desvio de R$ 8 milhões da Secretaria de Trabalho e Assistência Social, da qual era titular na gestão do marido, num escancarado nepotismo. Fraude em licitação, corrupção e lavagem de dinheiro estão entre os crimes a que ela responde na Justiça estadual. Na delação, a mulher de Silval confessou ter usado parte da propina recebida de uma empresa que prestava serviço à pasta para pagar fatura do cartão de crédito.

Rodrigo, de 33 anos, ficou preso por um mês em 2016. Ele é acusado de cobrar propina de empresários que mantinham contratos ou recebiam benefícios fiscais do governo do estado e usar parte do dinheiro para adquirir apartamentos. Antes de se envolver nos esquemas do pai, o rapaz se formou em Medicina em Presidente Prudente (SP). Pouco antes de Silval, então vice-governador, assumir a cadeira de Blairo Maggi, hoje ministro e um dos delatados por ele, Rodrigo voltou para perto da família.

O irmão mais novo de Silval, Antonio da Cunha Barbosa Filho, conhecido como Toninho, é um dos administradores da fortuna dos Barbosa. Sócio de diversas empresas com o irmão, ele é suspeito de lavar o dinheiro desviado do estado pela família. Por enquanto, ele é investigado, bem diferente da situação do irmão, que tem uma ficha corrida extensa. Na delação premiada que Silval assinou em março passado, seis páginas listam as ações e inquéritos a que ele responde. São crimes como corrupção passiva e ativa, lavagem de dinheiro, fraude e organização criminosa.

Mesmo diante da denúncia de que saqueou o estado em R$ 1 bilhão, os Barbosa conseguiram um ótimo negócio com a delação premiada feita na Procuradoria-Geral da República, em Brasília. Juntos eles devolverão aos cofres estaduais cerca de R$ 80 milhões, boa parte disso em bens, como um avião e terrenos.

Mesmo diante da série de denúncias contra a família do ex-governador, tímidos foram os protestos na região. Nas redes sociais, especialmente nas páginas de deputados flagrados pegando propina, internautas fizeram desabafos nos últimos dias, mas não passou disso. Nenhuma mobilização de rua aconteceu, mesmo estando entre os flagrados o prefeito de Cuiabá, Emanuel Pinheiro (PMDB), cujos maços de dinheiro caíam do bolso.

A Assembleia Legislativa de Mato Grosso ficou esvaziada nos dias seguintes à divulgação dos vídeos. Deputados não apareceram em número suficiente para dar início às sessões. Na quinta-feira, alguns dos delatados por Silval usaram a tribuna para se defender. Nenhum deu explicação para os maços de notas que receberam e criticaram a mídia pela divulgação das imagens.

Investigadores em Mato Grosso acreditam que a família tenha acumulado com as falcatruas muito mais do que o dinheiro que deverá devolver. O patrimônio dos Barbosa é estimado em bilhões de reais, parte dele em nome de laranjas, como o próprio ex-governador assumiu na delação. Um desses bens é uma mansão avaliada em R$ 3 milhões na badalada praia de Jurerê Internacional, em Santa Catarina, além de fazendas e empresas de rádio e TV no Mato Grosso.

Se condenado, Silval não cumprirá um dia da pena na prisão. O acordo determina que o ex-governador permaneça em prisão domiciliar e depois tenha a progressão da pena. Para os demais Barbosa, o cumprimento de pena começará no semiaberto

— Há 33 anos eu saía do Paraná, e o que levava na bagagem era a vontade de vencer e de contribuir para Mato Grosso — disse Silval, em dezembro de 2010, num discurso após ter vencido a eleição para governador.

Acompanhado dos pais, dos irmãos e da mulher, Silval migrou para o Centro-Oeste estimulado pelo governo militar e com planos de fazer riqueza nos garimpos de ouro.

EXTRAÇÃO DE OURO

A família se instalou na região do pequeno município de Matupá, na fronteira de Mato Grosso e Pará, onde Silval fez dinheiro e carreira política. Dona de barrancos, chegou no auge da extração de ouro na região. O negócio no garimpo prosperou e, no final dos anos 1980, Silval já fazia negócios com garimpeiros até no Pará. Um dos fundadores do garimpo Castelo de Sonhos, em Altamira (PA), Leo Heck é uma das testemunhas das andanças de Silval por lá.

— Ele nunca foi garimpeiro aqui. Nunca o vi com ferramenta alguma na mão. Mas ele entrava e saía do garimpo, negociando sei lá o que com os homens de lá — diz Leo, de 82 anos.

Com o dinheiro do garimpo, a família começou a abrir comércio em Matupá e, em 1993, Silval se tornou prefeito. Garimpeiros disseram ao GLOBO que, até hoje, eles têm garimpo na região, além de posto de gasolina, empresa de equipamentos para o garimpo e emissora de TV.

— Eu posso dizer a você que, se ele se candidatar a prefeito, é capaz que ele ganhe aqui em Matupá — afirmou um morador da cidade.

Em Cuiabá, Silval cresceu politicamente pelas mãos do político maior ficha-suja do país, o ex-deputado José Riva, que, especula-se, estaria negociando uma delação. Silval se tornou presidente da Assembleia Legislativa pelas mãos de Riva e vice na chapa de Blairo Maggi, em 2006, pelo mesmo caminho.

Na delação, o ex-governador disse que pagou “mensalinho” a deputados da Assembleia com dinheiro do governo durante sua gestão. Os vídeos da distribuição da propina, divulgado na semana passada, expuseram deputados e prefeitos colocando dinheiro roubado em sacolas, bolsos e caixas. Apesar do patrimônio milionário, os Barbosa mantinham uma vida discreta em Cuiabá. Uma das exceções, entretanto, foi o casamento do filho Rodrigo, em 2012. A festa, para cerca de mil convidados, reuniu políticos de Brasília, a nata da sociedade mato-grossense e muitos dos delatados hoje por Silval. Gravata italiana e caixa de prata cravejada de cristal foram os mimos dados aos padrinhos. O noivo usou terno Ricardo Almeida, e a noiva, vestido bordado com cristais Swarovski.

Ao recordar sua chegada a Mato Grosso e comemorar a vitória na eleição para governador, naquele discurso em 2010, Silval encerrou suas palavras com uma promessa que, hoje, após tudo o que veio à tona, soa piada:

— Agradeço cada um que confiou nesse projeto. Vou retribuir a confiança e a expectativa de cada um de vocês.

Procurado, o advogado da família Barbosa, Délio Lins e Silva não quis dar entrevista. O prefeito Emanuel Pinheiro também tem mantido silêncio.

Circuito denunciou

Realmente o conteúdo da delação é estarrecedor. Porém, não se pode deixar de atribuir ao próprio Silval Barbosa os crimes que ele cometeu em pouco mais de quatro anos à frente do governo do Estado. Os fatos narrados pelo ex-governador confirmam denúncias e alertas feitas pelo Circuito Mato Grosso desde a sua edição 300, a exemplo de editais de “cartas marcadas” ou certames duvidosos e ilegais que poderiam causar rombos ainda maiores ao erário. Enquanto isso, a população mato-grossense morrendo na fila do SUS, escolas caindo aos pedaços e pessoas passando fome por falta de emprego e assistência.

DENÚNCIAS CONFIRMADAS POR SILVAL BARBOSA

Incentivos fiscais em troca de propina

A delação de Silval Barbosa à Procuradoria Geral da República (PGR), em que revela um monstruoso esquema de corrupção em Mato Grosso com a participação de políticos, gestores, empresários e instituições financeiras, traz detalhes do esquema de propina envolvendo a concessão de incentivos fiscais.

Durante praticamente três anos o Circuito Mato Grosso mostrou que o governo de Silval Barbosa concedia incentivos fiscais milionários sem que houvesse retorno efetivo em melhoria na condição de vida da população.

Na delação, Silval Barbosa conta que, no ano de 2011, se reuniu com Wesley Batista, presidente do Grupo JBS, sendo que tal reunião foi agendada por Fernando Mendonça que mantém um parentesco com Wesley Batista. Da reunião participaram o colaborador e Wesley Batista.

Nessa conversa o ex-governador se recorda de ter pedido ajuda a Wesley para quitar dívidas da campanha eleitoral, sendo que ele teria concordado desde que fossem concedidos benefícios fiscais para a empresa.

O então governador agendou conversas com o secretário de Fazenda, não se recordando se foi o secretário Edmilson ou foi o ex-secretário MarceI de Cursi quem fez um estudo sobre quais benefícios seriam concedidos.

Silval Barbosa sabe que já no ano de 2011 houve um benefício fiscal para a empresa e que a partir dali começaram os retornos das propinas, cabendo a Pedro Nadaf, ex-secretário da Casa Civil, acompanhar repasses.

Inclusive a JBS assinou um acordo por meio de um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) com o Ministério Público Estadual para devolver R$ 380 milhões aos cofres públicos de Mato Grosso que não foram recolhidos devido a incentivo fiscal até 2011confirmado como parte de esquema fraudulento do governo.

Canal Livre e propina na Arena Pantanal

Na delação, Silval Barbosa também confirmou esquema que já havia sido denunciado pelo Circuito Mato Grosso em 2013. Silval relata que ele próprio, o deputado estadual Romoaldo Júnior (PMDB) e o então secretário da Agecopa, Eder Moraes, receberam dinheiro da construtora Mendes Júnior, responsável pelo obra da Arena, e também da Canal Livre, empresa que compunha o Consórcio C.L.E. Arena Pantanal juntamente com a Etel Engenharia Montagens e Automações. A obra da Arena custou em torno de R$ 500 milhões e teria rendido 3% de propina para o grupo de Silval, e o consórcio C.L.E. faturou R$ 108 milhões e teria repassado R$ 500 mil.

Na edição 446, o Circuito Mato Grosso apontou que a Canal Livre S/A não teria estrutura para realizar serviços tão complexos como a implementação da tecnologia da informação e comunicação (TIC) da Arena Pantanal. O contrato com o consórcio C.L.E. Arena Pantanal teve valor inicial de R$ 98 milhões. Porém, o jornal mostrou que no dia 15 de outubro de 2014 a empresa recebeu aditivo de R$ 12,626 milhões.

A reportagem publicada no mês de julho de 2013 apontava que os indícios de que uma pequena empresa de Várzea Grande – em contraponto ao porte das organizações que realizam o TIC em outras arenas brasileiras – na época chamou a atenção do Ministério Público Estadual (MPE-MT).

A reportagem fez um levantamento apurando que empresas responsáveis pelo TIC das chamadas “Arenas Multiuso” – caso da Arena Pantanal – possuíam certificações nacionais e internacionais em projetos de grande porte, como demanda este tipo de serviço. As empresas Nippon Electric Company (NEC, do Japão), responsável pela Arenas das Dunas, em Pernambuco e Fonte Nova, na Bahia, e a Sonda IT (a maior organização de infraestrutura de tecnologia da informação da América Latina) na Arena Corinthians, são exemplos citados pela matéria.

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Reportagens realizada pelos colaboradores, em conjunto, ou com assessorias de imprensa.

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