Jurídico

Advogado será investigado por chamar Justiça de ‘prostituta’ em ação cível

Por ter afirmado que o Poder Judiciário de Mato Grosso seria uma “verdadeira prostituta”, o juiz Luiz Octavio Saboia Ribeiro, da Terceira Vara Cível de Cuiabá, pediu que o Ministério Público Estadual (MPE) e a Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso (OAB-MT) apurassem a conduta do advogado Diego Osmar Pizzatto, que foi considerada pelo magistrado como deselegante e, inclusive, ilegal. As informações são do site MídiaNews.

Tudo iniciou em uma requisição a gratuidade nas despesas de uma ação cível. Segundo os autos, Pizzatto afirmou que alguns juízes do Estado estariam cedendo a pressões do Tribunal de Justiça para não conceder o benefício, “sob a argumentação de abuso de direito ou até mesmo excesso de pedidos dessa natureza”.

O advogado afirmou que o Judiciário estaria mais preocupado em recolher dinheiro do que em prestar as atividades jurisdicionais.

“Lamentavelmente essa personagem grega – supostamente divindade – tem se tornado em dias atuais uma verdadeira prostituta, ou seja, – explica-se -, está muito mais interessada em aumentar sua receita, em recolher as custas do processo, do que, precisamente, prestar a tutela jurídica estatal – fornecer o serviço (monopólio) jurisdicional”, disse.

A crítica do advogado teria relação com a orientação do TJ-MT para que os magistrados verificassem as condições econômicas das partes antes de decidir pela concessão ou não da gratuidade processual. Essa verificação, que segue critérios de cada magistrada, tem gerado polêmica nos últimos anos.

Em contrapartida, o magistrado Luiz Ribeiro rebateu na decisão dizendo que não faz nada sob “pressão” e que os “descontentes e insatisfeitos” têm o direito de recorrer de suas decisões.

“Saliento que este magistrado ‘não é filho de pai assustado’, não havendo, assim, que se falar em qualquer tipo de pressão – muito menos do eg. Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso – sobre este magistrado para decidir as demandas sejam decididas desta ou daquela forma”, rebateu.

Ao reconhecer que a figura do advogado é indispensável à administração da Justiça pontuou que o profissional deve atuar de forma independente e sem submissão aos demais atores do Judiciário, tudo conforme orienta o Código de Ética da OAB. No entanto indagou a conduta de Pizzatto.

“Indago-me: qualificar o Poder Judiciário como uma “prostituta” significa atuar com honra e dignidade da profissão, ou mesmo tratar a autoridade com respeito? E mais, ao atribuir tal adjetivo ao Poder Judiciário, estaria a ‘função essencial’ da advocacia sendo exercida pelo causídico em local inadequado? A atitude do causídico revela contribuição para o aprimoramento das instituições?”, questionou.

Luiz Ribeiro ressaltou que o direito à liberdade de expressão é sagrado, mas deve ser exercido com responsabilidade.

“O causídico ao afirmar que o Poder Judiciário atua como ‘verdadeira prostituta, ou seja, – explica-se -, está muito mais interessada em aumentar sua receita, em recolher as custas do processo, do que, precisamente, prestar a tutela juridica estatal’ (sic) deve compreender que sua assertiva além de desnecessária, atabalhoada e deselegante, se revela ilegal, seja em função do que preconiza o Código de Ética da OAB, sejam em função da possível configuração de ilícito penal, pois imputa aos membros do Poder Judiciário práticas ilícitas (ex.: prevaricação, corrupção, etc..)”, criticou o magistrado ao negar o pedido de gratuidade processual  por considerar dois veículos e boa renda mensal do cliente de Pizzato.

Por fim, o juiz determinou que o MPE, a OAB-MT e a Corregedoria-Geral da Justiça de Mato Grosso tomasse conhecimento de tal conduta para que seja apura as medidas necessárias.

 “Assim sendo, desde já, determino: a) Extraia-se cópia da dos autos e encaminhe-se ao Ministério Público do Estado de Mato Grosso para fins do art. 40 do CPP; b) Extraia-se cópia dos autos remetendo aos seguintes órgãos para conhecimento e adoção das providências que julgarem pertinentes: a. Presidência do Tribunal de Ética da OAB/MT; b. Presidência da Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Mato Grosso; c. Eg. Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Mato Grosso”.

Sem intenção de ofender

Em entrevista ao MidiaNews, Diego Pizzatto alegou que suas críticas não foram pessoalizadas e não teve a intenção de ofender o juiz Luiz Ribeiro.

“Acho que ele se sentiu ofendido com as argumentações jurídicas utilizadas no pedido. Não concordo com a interpretação do magistrado, que interpretou a questão para o lado pessoal. Não tive a intenção de ofender, de macular a imagem dele. Pode ser considerada uma argumentação pesada, mas meu interesse foi convencer o juízo de que meu cliente tinha os requisitos necessários para ser beneficiado com a Justiça Gratuita”, contrapôs.

Para o advogado, Saboia teria feito uma censura travestida e que nunca teve problemas em suas petições, ao qual teria utilizado termos “mais pesados”.

“Não vejo como uma censura escrachada, mas uma censura travestida com fundamentos jurídicos, cerceando a liberdade de atuação do profissional em relação à liberdade de manifestação do pensamento e da liberdade de expressão. Eu fiz uma metáfora com a Deusa Têmis, cujo próprio símbolo é uma metáfora processual por ser cega e com uma balança na mão. Utilizei o termo prostituta para justificar que o Poder Judiciário estava muito mais preocupado em arrecadar tributos do que prestar a atividade jurídico-estatal”, justificou.

"Fui cerceado de minha liberdade e acho que não é um juiz que vai ter que me dizer como eu tenho que escrever.  Essas são argumentações que eu utilizo em 10 anos de atividade jurídica e nunca tive problema com o tribunal ou com qualquer outro juiz. Eu costumo utilizar argumentações ainda mais pesadas do que essa, inclusive em sustentação oral no Tribunal de Justiça", continuou.

Quanto à suposta pressão a que os juízes estariam submetidos, Pizzatto justificou que a própria Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso (OAB-MT) já se posicionou no mesmo sentido, em razão da falta de critérios objetivos para a concessão da gratuidade processual.

“Tudo o que eu falei tem um fundamento especial. Quando digo que alguns magistrados agiriam sob pressão, é porque até o ex-presidente da OAB-MT, Maurício Aude, já registrou em um artigo que os juízes, com base em orientação da corregedoria, tem indeferido sistematicamente a Justiça Gratuita para as partes. O atual presidente da OAB, Leonardo Campos, também se manifestou no mesmo sentido, criticando os critérios de concessão do benefício".

O advogado ainda relatou que seu cliente optou por desistir da ação em razão de não ter condições de arcar com as despesas e por também não ser viável gastar mais ainda para receber uma dívida de pequeno valor.

"O meu cliente estava cobrando um cheque de R$ 2 mil. Ele tem uma pequena propriedade rural no município de Santo Antônio do Leverger. Ele vendeu umas cabeças de gado e não recebeu. Ele tem uma renda mensal de R$ 5 mil, como aposentado. Hoje ele tem mais de 70 anos. Acumular dois carros depois de 50 anos de contribuição é muito, é sinônimo de riqueza? Depois dessa decisão, meu cliente desistiu do processo, porque hoje as custas não saem por menos de R$ 700, R$ 800, em uma ação em que ele cobra R$ 2 mil. E a preocupação do Poder Judiciário foi muito mais em recolher e arrecadar do que em prestar a atividade jurisdicional. Foi nesse sentido que eu disse que a deusa Têmis estava se tornando uma prostituta”.

Redação

About Author

Reportagens realizada pelos colaboradores, em conjunto, ou com assessorias de imprensa.