Política

TCE derruba edital de R$712 milhões licitado às pressas por Mauro Mendes

Fotos: Ahmad Jarrah

Com Reinaldo Fernandes

O conselheiro substituto Luiz Carlos Pereira, do Tribunal de Contas do Estado (TCE-MT), determinou que a Prefeitura de Cuiabá suspenda todos os efeitos do edital da licitação para a modernização e expansão da rede de iluminação pública do município, no valor de R$ 712 milhões. A decisão foi tomada nesta quarta-feira 8 de fevereiro.

A licitação foi vencida pelo Consórcio Cuiabá Luz, que assumiria a prestação do serviço por meio de um contrato de parceria público-privada (PPP) com o Executivo municipal. O resultado do certame já tinha sido adiantado no começo de novembro pelo Circuito Mato Grosso com informações de bastidores de que o trâmite estava direcionado.

Esta foi uma das últimas ações adotadas pelo ex-prefeito Mauro Mendes (PSB), em dezembro do ano passado. Em janeiro deste ano, o atual prefeito, Emanuel Pinheiro (PMDB), determinou uma avaliação de conformidade do contrato da iluminação pública.

A decisão singular circulou no Diário Oficial de Contas desta quarta-feira (8) e atende a um pedido do Ministério Público de Contas (MPC), que impetrou recurso em novembro do ano passado contra a decisão do próprio TCE-MT, em liberar o prefeito da capital a dar seguimento à licitação.

Na medida, o órgão recorrente apontou sete irregularidades na parceria firmada entre a Prefeitura e o consórcio formado pelas empresas baianas FM Rodrigues e Cia Ltda, Cobrasin Brasileira de Sinalização e Construção Ltda e Sativa Engenharia Ltda.

De acordo com o MPC, uma das irregularidades no processo licitatório foi a ausência de transparência das decisões tomadas, “com estudos genéricos e superficiais, inexistindo aposição da fundamentação das opções de modelagem da PPP no processo administrativo licitatório”.

Além disso, o órgão apontou que houve desequilíbrio na distribuição dos riscos entre a Prefeitura e o consórcio. “… além de o pagamento da energia elétrica ter ficado apenas a cargo da Administração, ‘somente há previsão de reequilíbrio econômico em favor da Concessionária’”, diz trecho do pedido do MPC.

Em sua decisão, o conselheiro afirmou que a Prefeitura ignorou o fato de o MPC ter apresentado recurso, requerendo a suspensão do edital, por conta de irregularidades.

De acordo com Luiz Carlos, a retomada do processo licitatório ocorreu na mesma data da publicação da decisão do TCE-MT recorrida – 25 de setembro de 2016. “Época em que, como bem esclareceu a doutrina acima citada, mesmo antes de interposto o recurso, a decisão, por sua mera recorribilidade, já tinha os seus possíveis efeitos suspensos”, disse o conselheiro.

Ausência de sistema de telegestão pode gerar sobrepreço

O conselheiro substituto apontou que o edital de concorrência elaborado pela Prefeitura da capital estabeleceu a necessidade de um sistema de telegestão, assim como foi aprovado pelo Comitê Gestor do Programa PPP/Cuiabá. No entanto, tal sistema foi “suprimido” no contrato final entre o Executivo e o Cuiabá Luz, o que poderá gerar sobrepreço e grande ônus aos cofres públicos.

Luiz Carlos Pereira avaliou que a mudança não poderia ter ocorrido e que a supressão violou o princípio da eficiência, pois o sistema é tecnicamente identificado como o mais apropriado de controle do parque de iluminação.

Além disso, o conselheiro afirmou que a supressão também violou o princípio da legalidade.

“Uma vez que a escolha da modelagem trata-se de discricionariedade técnica, que torna o ato de escolha um ato tipicamente vinculado, ainda porque aplica-se ao caso a teoria dos motivos determinantes, de modo que externada pelo Comitê Gestor as condicionantes e modelagens de confecção do edital, este somente poderia ser confeccionado com base nas modelagens por ele aprovadas e escolhidas”, declarou.

Consórcio assumiria apenas 0,25% da perda com depredação

Luiz Carlos Pereira destaca como um dos pontos fundamentais em sua decisão de determinar a suspensão do contrato de iluminação pública da Prefeitura de Cuiabá a não divisão das despesas decorrentes de vandalismo com o consórcio vencedor do certamente.

“Isso implica em dizer que a PPP assumiria um risco de apenas 0,25% de perda/depredação das luminárias num parque composto por 67.618 luminosos”.

Essas despesas não foram consideradas quando da composição do valor dos investimentos necessários no sistema de iluminação pública, objeto do contrato da PPP, conforme consta na tabela descritiva anexa ao edital.

Na referida tabela, apesar de haver previsão de custo do “vandalismo” para formação da base de cálculo da contraprestação mensal, não há dados técnicos, nos autos, de que a quantidade de 167 luminárias, de 78.778 metros de cabos de 39 postes, corresponde orçamentariamente aos valores propostos, nem como de que os valores anuais sejam razoáveis.

O TCE observa, por fim, que necessariamente em um contrato deste porte deve haver compartilhamento objetivo de risco com a PPP.

Determinações do TCE à Prefeitura e ao Cuiabá Luz

Ao final das exposições em sua decisão, o conselheiro substituto fez as seguintes determinações:

– Intimar os secretários municipais de Gestão de Cuiabá, Rafael Cotrim Dias; de Serviços Urbanos, José Roberto Stopa, e o prefeito de Cuiabá, Emanuel Pinheiro (PMDB), a se absterem de dar continuidade aos atos administrativos decorrentes da concorrência 001/2016 ou atos inerentes à execução do Contrato nº 755/2016.

– Intimar o Consórcio Cuiabá Luz, na pessoa do seu procurador Maurício Magalhães, para se abster de praticar qualquer ato inerente ao referido contrato.

– Intimar todos os acima citados a apresentarem suas contrarrazões no prazo de 15 dias a contar da notificação.

– Determinar a expedição de ofício à Aneel para que, ciente desta decisão, forneça ao TCE cópia do Relatório Conclusivo do resultado das negociações com o Município de Cuiabá, e o cronograma de implementação da transferência do sistema de iluminação pública.

Cuiabá poderia construir 284 CMEIs com R$ 712 milhões

Cuiabá tem vários problemas por falta de aplicação de recursos. São deficiências que vão de falta de creches a baixo número de escolas para receber estudantes. É o caso dos Centros Municipais de Educação Infantil (CMEIs), que hoje têm 14 prédios distribuídos pela capital. Mas este número não cobre nem 50% da demanda de crianças em idade de ingressar na vida escolar. Cuiabá tem hoje cerca 35 mil crianças nessa faixa etária.

Com os R$ 712 milhões que serão investidos em iluminação pública nos próximos 30 anos daria para construir 284 CMEIs, considerando o valor atual de R$ 2,5 milhões, apontados pela Secretaria de Educação, necessário para a edificação de cada unidade.

Segundo a Secretaria Municipal de Educação, a Prefeitura tem o desafio de atender ao menos 50% desse público até o ano de 2023 em atendimento às medidas do Plano Nacional de Educação (PNE).

Para isso, é necessária a construção de mais 70 CMEIs, mas o orçamento da educação no município é insuficiente para custear a construção de mais unidades. Seria necessário dobrar o orçamento do ano passado, por exemplo, de R$ 176 milhões, nos próximos seis anos para conseguir alcançar a meta.

Buracos

Os R$ 712 milhões também dariam para cobrir gastos para a eliminação de 44 mil buracos que existem hoje pelo perímetro urbano de Cuiabá. A Secretaria Municipal de Obras informou que R$ 1,2 milhão foi alocado neste mês para serviços de tapa-buracos na capital.

Reportagem publicada na edição 617 aponta a existência 44 mil buracos em pistas e ruas de chão em áreas de periferia e avenidas principais, conforme dados da Secretaria de Obras. Na região Sul há 15.866 buracos; na Leste, 11.148; Norte, 10.364; e Oeste, 6.970 fissuras.

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Sandra Carvalho

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