Mato Grosso é superpotência no agronegócio do Brasil e forte concorrente no mercado internacional. Mas, essa consideração contrasta com outra situação no cenário de produção que está ligada de forma direta àquilo que é cultivado porteiras adentro. Os caminhos que levam o que é produzido no campo, para fora do País – na verdade, até para outros Estados – são precários.
Isso foi percebido e é discutido desde que Mato Grosso entrou nesse mercado. Em fins da década de 1980, foi projetada a Zona de Processamento de Exportação (ZPE) em Cáceres para criar alternativa de logística; no entanto, somente agora a proposta começa a sair do papel, e gera expectativa de desenvolvimento social e tecnológico para vários municípios e a expansão do catálogo de países que poderão se tornar clientes. Incluindo os vizinhos latino-americanos.
O edital de chamamento de empreiteiras para as obras foi lançado na terça-feira (11) em parceria das secretarias de Desenvolvimento Econômico (Sedec) e de Cidades (Secid), que estimam despesas de quase R$ 17 milhões para primeira etapa de trabalhos. Uma área de 239,68 hectares, dividida em cinco módulos, com espaço que poderá abrigar cerca de 230 indústrias, está demarcada para instalação da zona de exportação. Os perfis candidatos variam de produção de grãos a fabricantes de sapato, considerando as cartas de intenção já apresentadas ao governo estadual.
Conforme o secretário de Desenvolvimento Econômico, Ricardo Tomczik, o resultado será definido na segunda quinzena de novembro próximo, e a empresa vencedora, até o dia 15 de dezembro, para começar a colocar mãos à obra.
“Acredito que para esse ano será baixa a arrecadação de dinheiro para investimento na ZPE, mas já estão previstos na LOA (Lei Orçamentária Anual) os quase R$ 17 milhões que serão necessários para as obras desta primeira etapa. Ou seja, está tudo encaminhado e esperamos que até em dois anos a zona de exportação esteja pronta para operar, dependendo das instalações das empresas”, explica.
No primeiro módulo previsto no edital serão instalados a sede da Administradora da Zona de Processamento de Exportação de Cáceres (Azpec); restaurante; postos de controle de pedestres e de veículos; galpão de armazenagem; postos do Ministério da Agricultura e da Receita Federal para facilitação do processo de exportação – comercialização dos produtos locais para outros mercados consumidores.
Conforme Tomczyk, o complexo da ZPE tem modelo comparativo ao de um distrito industrial, com variação de tamanho da área de cada para instalação de acordo com a atividade de cada empresa. As integrantes terão o benefício de redução de tributação para as áreas de transporte, telecomunicação e de energia e deverão cumprir a cotação de 80% para exportação do que for produzido e 20% para negociação no mercado nacional. Um projeto em trâmite no Congresso Nacional tenta alteração desse modelo para 60% e 40%, respectivamente.
AUTORIZAÇÃO
A autorização para instalação de zonas de exportações é hoje concedida pelo Governo Federal, e os Estados assumem a responsabilidade de colocar as atividades em andamento. Conforme o secretário Tomczyk, 17 zonas, incluindo a de Mato Grosso, estão hoje autorizadas a negociar no mercado internacional, no entanto, apenas uma está em operação.
“Se todo o cronograma for cumprido, Mato Grosso será um dos primeiros Estados a abrir espaço para exportação através de zonas aduaneiras. Isso quer dizer que a ZPE de Cáceres ainda é válida para aumentar as atividades econômicas do Estado e para gerar desenvolvimento tecnológico; mesmo depois de tanto tempo parada”, comenta.
Engenheiro diz que ZPE abre Mato Grosso para o mundo
Para o engenheiro Adilson Reis, que participa de pesquisa sobre o impacto da ZPE de Cáceres, as principais mudanças que serão sentidas com a implantação da zona será impulso para desenvolvimento de atividades hoje tolhidas no município. Ele participa do grupo de conselheiros, que acompanha o desdobramento do projeto.
“A implantação da ZPE de Mato Grosso em Cáceres é um instrumento de atração de investimentos e de criação de empregos. A partir disto, abre-se um leque inimaginável de oportunidades externas a ela, considerando que o seu alcance é suprarregional, até porque Cáceres, obviamente, não produz insumos suficientes para a verticalização/exportação, porém, temos concentrados aqui todos os órgãos e instituições ‘satélites’ ao processo, inclusive nas áreas de saúde, ensino e pesquisa”, explica.
Ele diz que as atividades da ZPE vão impulsionar atividades presentes em um raio de 400 quilômetros de Cáceres. O engenheiro aponta a beneficiamento para ao menos quatro cadeias produtivas. As relacionadas ao couro poderão gerar desenvolvimento para curtumes, carnes, leite, ossos; para o cultivo de cana os produtos derivados poderão passar por açúcar, combustível, bebidas, por exemplo. Também é estimado crescimento para atividades de exploração de madeira (reflorestamentos com Teka; extração da borracha); e mineral (calcários, brita, ferro).
“Na área da agricultura temos, segundo pesquisas, a possibilidade ainda da produção de mais de 4 milhões de toneladas de grãos com o aproveitamento de áreas já abertas (capoeiras e pastos antigos). Em logística de transporte a região é praticamente toda atendida pela malha rodoviária estadual e eixos federais (BR-070/174) e sistema hidroviário Paraguai-Paraná, cuja regulamentação é tratada pelo Comitê Intergovernamental da Hidrovia – CIH (Tratado Porto de Cáceres-Porto de Nueva Palmira-Uruguai)”, pontua.
Reis diz ainda que atividades científicas também podem ser beneficiadas com a implantação da ZPE, visto que a demanda industrial irá gerar conhecimento sobre os potenciais de exploração e produção. Exigências que colocarão a oportunidade de Mato Grosso a âmbito mundial.
“As ZPEs são o instrumento mais utilizado no mundo para promover atração de investimentos voltados para as exportações, capaz de colocar as empresas nacionais em igualdade de condições com seus concorrentes internacionais, além de gerar empregos e promover o desenvolvimento regional a partir dos insumos regionais existentes; estimula novas áreas de pesquisas e difunde novas tecnologias. É extremamente importante, apesar das falas de vários críticos e ‘especialistas’, que ainda não perceberam que este é um processo que não se encerra em si mesmo”.
Indústrias deverão acompanhar desenvolvimento
O deputado estadual, Leonardo Albuquerque (PSD), que preside a comissão de acompanhamento do projeto da ZPE, na Assembleia Legislativa, diz que abertura do complexo pode gerar aproximação de produtores de Mato Grosso a países na América Latina para o estabelecimento de relações comerciais, como Argentina, Uruguai e Bolívia.
“Por incrível que pareça a relação de Mato Grosso com países da América do Sul é muito ruim, quase não existe. Considerando que Mato Grosso é uma das potências da produção agropecuária do País e do mundo, tendo a China entre os principais clientes. Mas estamos de costas para os Países costa oeste do nosso continente, sem nenhuma relação diplomática com fins comerciais”, critica.
O atrofiamento comercial também é apontado pelo engenheiro Adilson Reis. Ele diz que o potencial produtivo de Mato Grosso pode elevar o Estado ao protagonismo nacional no fornecimento de grãos. “Mato Grosso pode se tornar um grande produtor de grãos para o mundo. Tem potencial para isso e o desenvolvimento que a ZPE poderá trazer vai impulsionar nosso mercado para um nível espetacular, com o rio Paraguai como o caminho de saída”.
Para o secretário Ricardo Tomczyk, a expansão da área industrial deverá estar acoplada ao desenvolvimento da zona de exportação, para suprir a deficiência de processamento de produtos primários em Mato Grosso. Hoje, a economia estadual tem sua base na produção de commodities e exportação.
O engenheiro Adilson Reis diz que as oportunidades podem ser elencadas por tipologias, como o beneficiamento e exportação de derivados de madeiras a partir da produção de móveis; tintas imobiliárias e industriais; industrialização de peles de jacarés, fabricação de calçados, bolsas, cintos e adereços; produção e exportação de instrumentos e pincéis; beneficiamento e exportação de derivados da borracha natural; produção e exportação de produtos derivados de origem animal.