Neste ano, só 37,7% dos 175 calouros de medicina na Universidade de São Paulo (USP) são mulheres. Mas três delas, além de terem sido aprovadas no vestibular da Fuvest 2015, também conquistaram as maiores notas na USP e em outras seis instituições.
A estudante Ana Luisa Smith Rocha, de 18 anos, atingiu as notas máximas na primeira e na segunda fases da Fuvest, após ganhar o bônus do Inclusp, e ficou em primeiro lugar na Faculdade de Medicina da USP (FMUSP). Ela também foi a primeira colocada na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Karina Caciola, de 20 anos, foi a primeira colocada nas provas da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Já Maria Clara Lemos, de 20 anos, ficou com a nota mais alta do curso de medicina da Universidade Estadual Paulista (Unesp), da Pontifícia Universidade Católica (PUC) e da Faculdade de Medicina de Marília (Famema). Hoje, as três são colegas no curso da FMUSP.
O fato de serem minoria numérica na turma de calouros de 2015 não intimida as jovens. "Nos últimos anos, progressivamente, o número de alunas tem aumentado no Brasil", afirmou Maria Clara
"Se foi mulher que passou, ou se foi homem que passou, não necessariamente significa que homens são mais inteligentes, ou que mulheres são mais inteligentes, isso realmente não importa, porque no vestibular são muitas variáveis. Cada prova é uma prova, você pode estar bem num dia, estar mal no outro dia."
Elas também não ligam muito para o fato de terem superado todos os outros candidatos em relação à nota do vestibular. "Você estuda para passar, e o primeiro lugar é uma consequência de muito estudo", explicou Karina. "A diferença de nota entre quem passa e quem não passa também é muito pequena", disse Ana Luísa. "Se eu tivesse passado em último lugar, estaria super feliz do mesmo jeito", completou Maria Clara.
Nova rotina
Hoje, as três aproveitam as primeiras semanas de aulas na faculdade, que são realizadas no campus das Clínicas e na Cidade Universitária, no Butantã. Elas conversaram com o G1 após um dia repleto de aulas – o curso de medicina tem horário integral.
O período ainda é de adaptação, dizem elas. Uma das novidades que as jovens estranharam é o fato de os professores passarem poucos exercícios de lição de casa, em vez de as listas com dezenas de exercícios, típicas da vida dos vestibulandos.
Elas também já planejam participar dos treinos de esportes na Atlética, das ligas e programas acadêmicos, como o Diretório Científico, e de coletivos com o Geni, de mulheres estudantes.
Sonho realizado
As três afirmam que acabaram optando pela USP mais por motivos subjetivos, relacionados à realização do sonho de estudar no curso de medicina mais prestigiado do país. "Sempre foi um sonho desde criança. A USP tem um nome muito forte, pra todo mundo. Foi um sonho, não teve motivo específico pra falar 'foi por isso que escolhi'. Foi bem subjetivo", explicou Karina.
Maria Clara tem vários parentes médicos, inclusive seu pai e sua mãe, que têm diploma da USP de Ribeirão Preto. "Meu pai fez residência na USP em Ribeirão, minha mãe fez USP em Ribeirão, mas eu sempre gostei muito da USP São Paulo, sempre foi minha primeira opção. Ter passado aqui realmente me deixou muito muito feliz."
Já Ana Luísa, que é de Salvador e decidiu se mudar para São Paulo para fazer a graduação na USP, afirma que a primeira opção de seus pais era que ela ficasse na Bahia. "Eu fiquei bastante em dúvida, meus pais não queriam que eu viesse pra São Paulo, em primeiro lugar, mas eles me deram muito apoio. Eu acabei escolhendo a USP por causa também do renome da faculdade, por todo o reconhecimento, e por causa também do Hospital das Clínicas, que é fenomenal", disse ela.
Trotes
As três jovens disseram que as denúncias de violações de direitos na faculdade não as fizeram desistir de fazer a matrícula na USP, mas sucumbiram à apreensão antes da matrícula e da recepção de calouros. "Eu estava um pouco apreensiva sim", disse Ana Luísa. "Mas realmente não teve nada, a recepção foi maravilhosa, a primeira semana foi muito boa."
Karina afirma que nenhuma das expectativas que ela tinha sobre a faculdade foram quebradas. "A semana de recepção foi fantástica, a gente foi muito bem acolhido. Não tem essa de bixo, te chamam de calouro, o pessoal quer te chamar pelo nome", afirmou a jovem.
Sobre as denúncias de estupro, Maria Clara diz que não está preocupada. "É uma questão social que ocorre dentro da universidade, fora de universidade, acontece em todo o mundo. Isso é uma questão que deve ser resolvida. Mas isso não me fez desistir da USP. Acho que os problemas estão sendo solucionados, as investigações estão sendo feitas, e os culpados serão punidos."
Dicas de estudo
As três jovens afirmam que o resultado que tiveram no vestibular foi o resultado de uma fórmula simples: esforço e dedicação durante o ano. Veja a seguir as dicas que as primeiras colocadas deram em cada vestibular:
Como estudou na rede pública, Ana Luísa conseguiu o bônus do Inclusp sobre sua nota da Fuvest. Então, sua pontuação, que já tinha sido alta, acabou atingindo o limite máximo nas duas fases: na primeira, ela acertou 81 de 90 questões, antes da aplicação do bônus. Na segunda, sua nota chegou a 1.000 após a bonificação.
A jovem explica que se preparou para a maratona de vestibulares pensando principalmente na prova da USP., que ela considera a mais completa. "A Fuvest é uma prova que ainda não usa o Enem, e é uma prova bastante interdisciplinar, então não tem como você priorizar uma parte de matérias. Não dá pra você dizer 'ah, vou estudar isso e com isso vou passar'. Você tem que focar em tudo, e dar o seu máximo em todas as matérias", explicou ela.
Já a Unicamp tem uma especificidade que deixa muitos candidatos agoniados: a redação. "Acho que uma das partes mais importantes talvez seja humanas e redação. A redação da Unicamp é diferente, todo mundo sabe que é um estilo que não é aquela dissertação tradicional. Tem que treinar bastante a redação, para você conseguir fazer de uma forma que eles gostem."
Karina foi a primeira colocada nos vestibulares de medicina da Unifesp e da UFMG. Ambas usam a nota do Enem, e a Unifesp, que tem o vestibular no modelo misto, aplica ainda uma prova adicional aos candidatos.
Essa prova, aplicada para a seleção de cursos na área da saúde, não tem questões de humanas. Por isso, a tática de Karina foi "estudar matérias específicas, de exatas, e redação também, que para qualquer prova é importante".
Segundo a jovem, o segredo para aguentar os dois dias de prova do Enem é treino. "A estratégia legal para passar é saber administrar o tempo com a prova. São muitas questões, 90 questões por dia, no segundo dia ainda tem uma redação. Então é legal você fazer provas antigas, saber o jeito da prova para não ter surpresa no dia."
Quando Maria Clara recebeu a notícia de que havia sido aprovada na Fuvest, ela saiu de casa e foi direto para o cursinho comemorar com os colegas. O resultado saiu após a notícia de que ela havia sido a primeira colocada nas provas da Unesp e da Famema, mas a jovem nem esperou para checar sua colocação na USP antes de celebrar a conquista de uma vaga na sua primeira opção.
A estudante diz que sente uma afinidade maior com o vestibular da Unesp, que, segundo ela, "pega mais" em humanas. Por isso, ela afirma que investir nos estudos de sociologia, filosofia, história e geografia pode ajudar a aumentar a nota. Além de português e redação, que podem ser um diferencial.
Já para passar na Famema, a prova que ela fez foi aplicada pela Pontifícia Universidade Católica (PUC), no vestibular unificado. Ela afirma que as questões são variadas (em teste, escritas e redação), e que o tempo é curto. A dica que a agora caloura dá é tentar administrar o tempo para concluir a prova da melhor forma possível.
Fonte: G1