Nada do bem, nem nada do mal. O que era muito positivo diante da latitude e da longitude que hora habitava.
Torino. Itália. Aqui mesmo, sem tirar nem por. Não havia se preparado para essa possibilidade improvável. Afinal, de tantos lugares na Europa, justo ali, no encontro dos círculos do bem e do mal? Cheio de segredos. Dos do Graal aos da maçonaria? Fonte do Bem e porta do Inferno… Afinal, o que era esse lugar? Não é para os fracos, sem dúvida.
Mas… Considerando que um de seus criadores, Adilson de Souza, havia passado pelos centros geodésicos do Brasil e da América do Sul, em Cuiabá e na Chapada dos Guimarães (quem estava onde, certamente era o de menos…), onde a menos de 60 quilômetros se concentravam as forças centrífugas energéticas de um país e de um continente, Torino não era pato, mas dava pra destrinchar.
Isso se a Bruxa resolvesse dar o ar da graça e fazer o que lhe cabia. Para isso a gente aceitava e considerava a possibilidade de andar por aí com uma bruxa, não é verdade? Aquela que viera com ele de Camino al Tagliamento na viagem trans-italiana do norte.
Graças a Deus os tempos eram outros e isso não era uma heresia que pudesse levar à fogueira da inquisição um cristão convicto como ele. Apenas mal acompanhado…
Quer dizer, se ela desse o ar da graça…
E deu. Largou de lado a timidez depois de um reconhecimento básico pelas possibilidades de ser atraída pelos círculos e, por assim dizer, soltou a franga no dia 31 de outubro. O dia. Um pouco antes da hora delas. Quer dizer, da nossa…
O lugar onde desabrochou (onde já se viu uma bruxa desabrochar?) foi especial. Lindo, por assim dizer e descrever. Grandes janelas, um jardim inspirador no meio de uma via movimentada de Torino. As folhas de outono se esparramando janelas abaixo. Abusadamente deslumbrante. Conversou, dialogou, se divertiu. Sabendo que caíra do lado certo dos círculos energéticos da cidade. Literalmente falando.
Uns poucos privilegiados puderam ver a bruxinha se banhando na Fonte do Bem ao entardecer sem dar a menor bola para a temperatura da água naquela quinta-feira gelada. E a noite ainda nem havia começado.
Foi aí que Bordolino, testemunha ocular dos fatos acima narrados, meio assustado com a transformação da companheira, optara por se recolher a tranquilidade do fundo da mala deixando as forças do mundo sobrenatural se ampliarem do lado de fora sem resistir ou pré-conceber os fatos que pudessem ocorrer ao seu redor.
A bruxa seguira seu caminho encontrando outras iguais aqui e ali. Fazendo contatos como diriam tecnicamente os viciados em networking do mundo atual. Só que um tipo de contato um pouco diferente dos que estes estavam acostumados.
Ela desabrochava! Ele se recolhia diante das correntes poderosas que se liberaram naquela noite mágica em Torino.
Vida, a bruxa ganhara vida! E, ele sabia, a partir dali a apatia que reinara nas últimas semanas desaparecia magicamente.
Por que agora o caminho estava aberto, as forças liberadas e o futuro ao alcance de ambos. Não mais com ele puxando o bloco tentando animar – sozinho – a festa, boneco dos cem instrumentos, cantando, tocando e dançando. Mas com a bruxa desembestada(no bom sentido), pronta para dar a partida para novas e inimagináveis aventuras, fazendo a algazarra correspondente a sua liberação.
Que viesse o mundo para ser palmilhado! Mares a serem singrados e terras estrangeiras exploradas. Com a parceira feiticeira estava pronto pra tudo. Depois que passasse a noite das bruxas, é claro, e o equilíbrio retornasse ao mundo exterior, em mais um ciclo celestial que recém iniciava-se, esse, dedicado apenas ao Bem que deveria reinar no planeta. Amém!
*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Essa crônica faz parte da série “No rumo”, do SEM FIM… delcueto.wordpress.com