Sinto-me como o componente que vê sua escola pisar na avenida após uma chuva destruidora, ou o carro mais elaborado perder pontos decisivos no desfile. Fui até ali na beira da avenida e vi todos os meus esforços e o de tantos outros que estavam comigo serem transformados em apenas mais um sonho de conquistar o campeonato.
Foram 10 meses de trabalho, o tempo da preparação de uma escola de samba, para lançar na Paratissima, em Turim, Itália, a Mostra Carnevale di Rio, trabalho realizado no barracão da Mocidade Independente, em 2010/11. Foram tantas as pessoas que torceram por mim e pelo meu sonho…
Muito mais do que os incontáveis apoios que recebi de gente que, na época da captação do material, estava na produção do enredo Parábola dos Divinos Semeadores: no barracão, na quadra e na Sapucaí. Gente do mundo do samba como Cid Carvalho e sua incrível equipe (não dá para citar todos nesse espaço); Maurício d’Paula, grande destaque carnavalesco; o presidente da Mocidade, Paulo Vianna; Ricardo Dias, que apostou no trabalho – inédito no carnaval, divulgando semanalmente fotos da construção do enredo verde e branco.
Na longa jornada de produção da Mostra a eles se juntaram José Antônio Rodrigues, do Plumas e Paetês Cultural; Levi Cintra, responsável pela parte gráfica do projeto; Gus Cid, montador das videografias que compõem a instalação; Felipe Ferreira, com seu lindo texto de apresentação e a chancela do Centro de Referência do Carnaval; Fábio Fabato e seu amor pela Mocidade; MdCsuingue, do Caipirinha Appreciation Society; Luca Esposito que fez o site; Sara Fiorentino, responsável pelas traduções, Massimo Finocchiaro, meu agente na Itália e a Sportnet, a patrocinadora.
Foi assim que cheguei a Turim. Pronta para botar o pé na Paratissima 2013. Só que a realidade aqui era outra! Nada com que já não estivéssemos acostumados, não fosse o fato de que teria que descaracterizar o lindo “enredo” sobre o barracão que havia criado.
E foi aí que falhei… Falhei por não concordar com as condições em que deveria trabalhar: reduzindo as dimensões de um projeto de 160 metros quadrados para mínimos 20 metros quadrados, trocando um espaço de arte pelo dos patrocinadores. A grandeza da proposta não caberia nos 2 metros e 60 centímetros de altura que foram disponibilizados. Ouvi todos os argumentos. Incluindo o de que o mais importante era fazer alguma coisa, porque no Brasil ninguém saberia o que realmente seria apresentado.
E falhei… Por não poder ser desleal com quem me inspirou e me trouxe, com sua energia maravilhosa, até aqui. Por não poder trair cada sorriso que vi nas milhares de fotos que editei para Gus Cid usar nas videografias. Não consegui descontruir a enorme energia e o carinho imensurável que recebi de todos vocês, que confiaram no meu trabalho. E assim, antes de entrar na pista, preferi desistir do desfile a ser responsável pela perda de pontos que poderia macular a essência do que pretendia apresentar para 100 mil visitantes.
Peço desculpas por ser fiel a nossa obra e, por isso, abrir mão de participar do evento italiano. Assumo a responsabilidade da derrota. Ela é tão dura e amarga quanto ver a agremiação que amamos não conseguir botar na avenida o sonho de um ano de suor e trabalho apaixonado.
Meu consolo é que, como todos do mundo do carnaval, sei que sempre resta uma esperança: a de que da próxima vez eu consiga fazer mais e melhor! Agora, sei que faço parte desse povo do carnaval porque, como vocês, começarei de novo… Sabendo que sempre haverá outro desfile. No meu caso espero que com o mesmo enredo: a Mostra Carnevale di Rio.
*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Essa crônica faz parte da série “É carnaval”, do SEM FIM… delcueto.wordpress.com