Política

Vaga no TCE-MT acirra disputa entre deputados na Assembleia Legislativa

Afinal, quem não gostaria de ganhar mensalmente quase R$ 60 mil (entre salário, auxílios moradia e alimentação, e verba indenizatória), se beneficiar com um cargo vitalício e ainda ter o poder para fiscalizar as contas do governo do Estado e dos 141 municípios de Mato Grosso?

Em aberto desde dezembro de 2014, quando o ex-conselheiro Humberto Bosaipo renunciou ao cargo por complicações com a Justiça, a vaga no Tribunal de Contas do Estado (TCE-MT) de indicação do Legislativo já tem, pelo menos, três nomes na disputa: José Domingos Fraga (PSD), Guilherme Maluf (PSDB) e Sebastião Rezende (PSC).

A sucessão foi paralisada por uma decisão do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), que atendeu ao pedido da Associação Nacional dos Ministros e Conselheiros Substitutos dos Tribunais de Contas (Audicon), que propôs uma ação apontando a inconstitucionalidade de uma Emenda Constitucional aprovada pela Assembleia Legislativa em 2011. 

O Legislativo havia estipulado que os técnicos do TCE-MT só estariam aptos a tomar posse como conselheiro após 10 anos de atuação dentro do órgão de controle externo do Estado.

Para destravar a sucessão, os deputados estaduais aprovaram uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que revoga tal determinação.

No entanto, o que muitos ainda não parecem saber é que o cargo de conselheiro no TCE-MT pode ser ocupado por qualquer brasileiro com mais de 35 anos e menos de 75, com notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos, financeiros ou de administração pública. Mesmo assim, a Corte de Contas de Mato Grosso ainda é uma das únicas que ainda vem sendo ocupada somente por políticos.

Três deputados acirram disputa pela “vaga no céu”

Desde o início de 2015, o deputado Zé Domingos Fraga se articula para ser indicado para a vaga deixada por Humberto Bosaipo no TCE-MT. Ele foi um dos principais fomentadores da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que busca destravar a sucessão da vaga em aberto.

No entanto, nos últimos meses outros deputados apresentaram interesse em também concorrer a tal vaga. Fato que, de acordo com os bastidores, criou chateação de Zé Domingos, que já anunciou não disputar mais cargos políticos nas próximas eleições caso não vá para o TCE-MT.

“Não tenho nada contra quem quiser colocar o seu nome. Mas deixo claro que meu nome já vem sendo cogitado desde a época em que a vaga foi aberta. Desde então, nunca perdi a esperança de poder estar contribuindo com a sociedade com um pouco da minha experiência”, frisou.

O segundo a confirmar o desejo de se candidatar para a vaga foi o primeiro-secretário do Legislativo estadual, Guilherme Maluf (PSDB). Ele afirmou que já conta com o apoio do seu partido – são quatro deputados tucanos no Parlamento de Mato Grosso.

O tucano ressaltou que a disputa pela indicação da Assembleia Legislativa para a vaga na Corte de Contas pode trazer desgastes na relação com os outros parlamentares, principalmente com Zé Domingos, que articula sua ida para o TCE-MT há mais tempo. No entanto, afirmou que é necessário ter maturidade.

“Nós somos colegas e nos damos muito bem. Mas, se tiver que haver uma disputa, acredito que a maturidade irá nos fazer entender que um irá ganhar e dois vão perder. Pode até ficar uma rusga, mas o que há de se fazer se é uma vaga só? “Tenho esse projeto e havendo essa vaga colocarei o meu nome [para a disputa]. Não conseguindo a indicação, eu saio da política ou me candidato a novos cargos”, pontuou.

Correndo por fora, o deputado Sebastião Rezende (PSC) é o terceiro nome na disputa até então. Ele, no entanto, garantiu que não tem se mobilizado para viabilizar sua indicação e que isso será feito no momento certo.

“A vaga ainda não está disponibilizada pra que os postulantes se habilitem, então não tenho feito nenhuma mobilização neste sentido. Em um momento oportuno irei discutir com os demais deputados e ver a possibilidade de viabilizar [essa indicação]. Colocar um nome sem ter viabilidade aqui no Parlamento não tem sentido”, declarou.

Rezende ainda disse que não pretende ir para o “embate” com os dois colegas parlamentares, para conquistar os votos do Legislativo.

“Eu não diria um embate. Entendo que no momento oportuno nós podemos fazer essa conversa de parlamento. São 24 deputados estaduais que têm voto aqui na Casa, e obviamente que eu preciso ouvir os demais deputados. Se não houver viabilidade, obviamente não tem sentido eu me colocar e fazer um enfrentamento”, pontuou.

José Domingos – é natural de Nortelândia. Engenheiro agrônomo, foi funcionário da extinta Empresa Mato-grossense de Extensão Rural (Emater). Filiado ao Partido Social Democrata (PSD), está no terceiro mandato consecutivo como deputado estadual.  José Domingos foi empossado no dia 25 de março de 2011 como secretário de Estado de Desenvolvimento Rural e Agricultura Familiar de Mato Grosso (Sedraf), permanecendo no cargo por um ano. Vereador e prefeito da cidade de Sorriso por três vezes, hoje Fraga acumula um total de 22 anos na vida pública. 

Guilherme Maluf – é cuiabano, pai de três filhos e médico. Em 2004, decidiu entrar na vida pública. Disputou e foi eleito um dos vereadores mais votados da capital. Dois anos depois, foi eleito deputado estadual. Conseguiu se reeleger em 2010. Em 2012 enfrentou a disputa pela Prefeitura de Cuiabá e saiu derrotado. Em 2014, o deputado do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) foi reeleito com mais de 24 mil votos para o seu terceiro mandato na Assembleia Legislativa. Foi eleito presidente da Assembleia Legislativa, função que ocupou durante o biênio 2015-2016. Atualmente, é o primeiro-secretário da Casa de Leis.

Sebastião Rezende – é engenheiro civil e advogado, 50 anos, nasceu em Rondonópolis. Entrou na vida pública em 2002, quando disputou o primeiro pleito eleitoral e foi eleito deputado estadual. Foi reeleito em 2006, 2010 e em 2014 foi o terceiro mais votado. Em 2013 e 2014 foi presidente da Comissão de Infraestrutura, quando acompanhou as obras de Mobilidade Urbana e do MT Integrado. O deputado é membro titular da Comissão Permanente de Saúde e relator da Reforma da Constituição Estadual e vice-presidente da Frente Parlamentar em Favor da Família. 

Auditores exigem rito de escolha para maior transparência

Acompanhando de perto todo o processo, a Associação dos Auditores de Controle Externo (Audipe) cobra mais transparência no rito de escolha do substituto de Humberto Bosaipo.

De acordo com a presidente da associação, Simony Jin, é necessário estabelecer normativas para a inscrição e escolha do novo conselheiro a fim de saber se o escolhido cumpre todos os requisitos básicos para o cargo.

“Não há transparência neste processo. O maior problema não é se [os postulantes] estão ou não cumprindo os requisitos, pois isso não se torna claro dentro das indicações da forma que está sendo feito”, declarou ao Circuito Mato Grosso.

A presidente observa ainda que dentro da sociedade é preciso transparência, um princípio essencial, segundo ela, em uma sociedade democrática.

“Dizem que qualquer cidadão que cumpra os requisitos pode se candidatar, mas não se dá nenhuma oportunidade para que eles, efetivamente, sejam candidatos”, completou.

Conforme a auditora, a escolha de pessoas incapacitadas para ocupar importante função pode acabar prejudicando a própria sociedade, que ficaria exposta a decisões que podem ser baseadas em questões outras que não as técnicas.

“Nós fazemos parte do corpo técnico do tribunal, que produz o material sobre o qual eles [conselheiros] vão julgar. Dependendo de quem está como conselheiro, há interferência nos trabalhos. Podemos ter um material muito bem produzido, mas ter negociações políticas [que mudem o julgamento]. Acabamos perdendo como sociedade, pois o TCE-MT é um órgão sério, que deve ser, efetivamente, os olhos do povo”, declarou.

“Se colocamos pessoas que não estão gabaritadas para cumprir essa função, a sociedade perde, pois não teremos uma fiscalização efetiva dos recursos públicos, por mais que tenhamos um corpo técnico eficiente”, disse.

Lugar de político cansado? 

Simony Jin ainda afirma que a sociedade e a classe política têm uma visão errônea do TCE-MT, idealizado par ser um ponto de controle sobre os recursos públicos. 

“Há uma visão errada do que seja o Tribunal de Contas. O tribunal foi idealizado para ser uma casa com a finalidade de ser um ponto de controle sobre o recurso público. Por isso, precisamos de pessoas com capacidade para fazer esse controle. Alguém que não tenha nada que o impeça de fazer o correto”, disse.

“Aqui não é um lugar para um político cansado. Aqui não é uma casa para compensação. Muito se pensa nos privilégios que o cargo traz. Mas não pensam na responsabilidade. Isso está expresso na ausência de normativa para a escolha de um novo conselheiro”, pontuou.

Para garantir a transparência do processo e o direito de não só deputados participarem da disputa, a Audipe protocolou junto à Mesa Diretora do Legislativo estadual uma proposta de resolução estabelecendo um rito básico para a escolha do novo conselheiro. 

Curriculum Vitae; cópia autenticada do diploma de conclusão do Ensino Superior; estudos, publicações, títulos, entre outros documentos que comprovem, de forma objetiva, notório saber nas áreas que envolvem a função; e a comprovação de atuação na atividade profissional que exija os conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros ou de administração pública, por mais de 10 anos.

Certidões cíveis referentes a improbidade administrativa e de execução fiscal e criminal nas esferas federal e estadual; e a declaração que conste nunca ter sido indiciado em inquérito policial ou processado criminalmente, ou, caso contrário, apresentação dos esclarecimentos pertinentes quanto às acusações imputadas.

Liminar barrou nome de Janete Riva para o TCE

Os pretensos candidatos a uma vaga no TCE devem ficar atentos à sua vida pregressa. No dia 17 de dezembro de 2014, a ex-secretária de Cultura do Estado Janete Riva teve seu nome barrado pela desembargadora Nilza Maria Pôssas de Carvalho, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT).

O TJMT determinou a suspensão do ato indicativo de Janete Riva ao cargo de conselheira do tribunal para a vaga do ex-conselheiro Humberto Bosaipo. A decisão, em caráter liminar, atendeu a mandado de segurança impetrado por um advogado que também se candidatou ao cargo.  Janete é mulher do deputado estadual José Riva (PSD), que responde a mais de 100 ações na Justiça.

A Constituição Federal estabelece que os conselheiros devem ter reputação ilibada, notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros, ou de administração pública, e ainda mais de dez anos de exercício de função ou de atividade profissional que exija esses conhecimentos. 

Outra decisão

Também no dia 17 de dezembro de 2014, o desembargador Orlando Perri, presidente do TJMT, negou o recurso protocolado pela ALMT para derrubar a liminar que suspendeu a  indicação de Janete Riva. No dia 16, o juiz Luis Alberto Bertolucci, da Vara Especializada da Ação Civil Pública, havia decidido pela suspensão do processo indicativo da ex-secretária de Estado. 

Veja a íntegra da matéria veículada na edição 623 do Jornal Circuito Mato Grosso AQUI

Redação

About Author

Reportagens realizada pelos colaboradores, em conjunto, ou com assessorias de imprensa.

Você também pode se interessar

Política

Lista de 164 entidades impedidas de assinar convênios com o governo

Incluídas no Cadastro de Entidades Privadas sem Fins Lucrativos Impedidas (Cepim), elas estão proibidas de assinar novos convênios ou termos
Política

PSDB gasta R$ 250 mil em sistema para votação

O esquema –com dados criptografados, senhas de segurança e núcleos de apoio técnico com 12 agentes espalhados pelas quatro regiões