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Uniselva possui mais de R$ 340 milhões em contratos

A Fundação Uniselva possui mais de R$ 340 milhões em contratos ativos com empresas privadas e o setor público, cujo valor mínimo é R$ 100 mil. Levantamento feito pelo Circuito Mato Grosso mostra 78 contratos assinados, por exemplo, com o governo do Estado, a Secretaria de Saúde (SES) e o TCE (Tribunal de Contas do Estado).

O maior soma R$ 120 milhões de convênio assinado em 2011, na gestão de Silval Barbosa (PMDB), para auxílio na execução de projetos de construção do novo prédio do hospital Júlio Muller, em Cuiabá. As obras estão paradas desde 2014.

A cláusula de liberação de recursos do contrato estabelece que o montante deveria ser liberado anualmente de acordo com o andamento dos serviços. Até 2014, seriam liberados R$ 60 milhões. Na primeira parcela, liberada em 2011, foi de R$ 2 milhões; em 2012 e 2013 houve repasse das maiores quantias, R$ 25 milhões em cada período, e em 2014 outros R$ 8 milhões estavam previstos para repasse, completando 50% do valor global.

O portal da transparência da fundação, onde estão disponíveis os dados, não apresenta nenhum aditivo de tempo ou dinheiro.

R$ 71 milhões com o TCE

O segundo contrato mais volumoso também foi assinado com o setor público. O TCE-MT fechou convênio em 2014 com a Uniselva no valor de R$ 71,72 milhões para elaboração de pesquisas sobre atividades de controle externo para implantação na área de auditorias do tribunal.

O convênio, oficializado em janeiro de 2015, tinha validade por vinte meses e ao fim do prazo o Tribunal de Contas renovou o contrato de convênio, em agosto de 2016, com aditivo de prazo e recurso. Nessa mudança, houve suplementação de R$ 30,7 milhões do convênio, estendido até outubro deste ano.

A Secretaria de Estado de Saúde (SES) também tem convênios milionários com a Uniselva, todos assinados com dispensa de licitação em um mesmo dia. Eles somam R$ 5,15 milhões.

A SES assinou convênio de R$ 3,74 milhões com a fundação para implantação e manutenção de softwares de domínio livre que serviriam para controle de dados de vigilância sanitária e painel de indicadores de atividades da rede SUS em Mato Grosso. A Uniselva recebeu prazo de quatro anos para o serviço.

Outro, com valor de R$ 903 mil, foi firmado para a realização de um levantamento para identificado de produtos agrotóxicos utilizados em municípios-polo do agronegócio. O convênio tem validade de 24 meses.

O terceiro convênio destina R$ 516 mil para atualização de registro RCBP, que ser de base para proporção de casos de câncer por população, e RHC, levantamento semelhante ao anterior limitado a hospitais, em Cuiabá e Várzea Grande. O prazo para a conclusão do serviço é de 36 meses.

Também aparecem na lista de conveniados a Uniselva os ministérios da Saúde, com contrato de R$ 948 mil, da Cultura (R$ 1,5 milhão), do Trabalho e Emprego (R$ 1,5 milhão), dos Esportes (R$ 6,9 milhões), o DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura e Transporte), cujo contrato foi firmado em R$ 13,8 milhões, CEF (Caixa Econômica Federal), que contratou serviços por R$ 2 milhões, e a Prefeitura de Cáceres, com convênio de R$ 308 mil.

No levantamento feito pelo Circuito Mato Grosso de contratos com valor acima de R$ 100 mil pela Fundação Uniselva foi identificado que a maioria dos 78 contratos ativos é com referência nominal à própria instituição. São 51 convênios cujos valores de contrato variam de R$ 101 mil a R$ 13,8 milhões.

Doze têm valores acima de R$ 1 milhão. E os mais vultosos são de R$ 13,8 milhões, R$ 9,2 milhões, R$ 6,9 milhões e R$ 5,4 milhões.

TCE diz que há segurança em convênios com fundações

O TCE-MT disse, em nota, que tem total segurança dos contratos firmados com a Fundação Uniselva. Conforme o tribunal, a Corregedoria Geral da instituição abriu investigação para apurar as condutas e todos os denunciados servidores pelo MPE (Ministério Público Estadual) que foram desligados ou afastados de cargo comissionado. 

“Não devemos confundir nem macular a imagem das instituições públicas por conta da conduta isolada e imprópria de pessoas que porventura tenham se aproveitado indevidamente de cargos públicos, funções e postos de trabalho e, assim, traído a confiança neles depositada”, disse.

A reportagem procurou representante da presidência para comentar o contrato de R$ 71 milhões, com aditivo de R$ 30 milhões, e a assessoria informou que no tribunal “não há ninguém falando sobre o tema”. 

Presidente do TCE, Antônio Joaquim, aponta 'plena segurança em convênio' investigados e "quem tem conta para pagar, certamente vai pagar". Em nota divulgada anteriormente, escreveu: “Os convênios e as prestações de contas estão à disposição dos órgãos de controle, não havendo nenhum desconforto que esses documentos sejam auditados ou investigados”.

O presidente expõe também que, "até onde se sabe, um servidor e alguns poucos prestadores de serviço do TCE-MT se aproveitaram da relação pessoal que mantinham com alguns funcionários da Faespe para praticar irregularidades em convênio da fundação com outra instituição. Apuração interna está sendo realizada para verificar se foi cometida alguma irregularidade no âmbito do convênio com o Tribunal de Contas;  A Corregedoria Geral do TCE-MT já abriu investigação para apurar essas condutas e todos os denunciados à Justiça pelo MPE já foram desligados ou afastados de cargo comissionado. As pessoas que porventura tenham ludibriado os controles do Tribunal de Contas e das entidades convenientes e a boa fé dos seus gestores serão penalizadas. Quem tem conta para pagar, certamente vai pagar".

Antonio Joaquim conclui que "não devemos confundir nem macular a imagem das instituições públicas por conta da conduta isolada e imprópria de pessoas que porventura tenham se aproveitado indevidamente de cargos públicos, funções e postos de trabalho e, assim, traído a confiança neles depositada. Neste aspecto, as instituições foram vítimas da má conduta de pessoas e não autoras da trama denunciada. O TCE-MT confia nas instituições que estão investigando as denúncias. Devemos, portanto, aguardar a conclusão desse processo, para tomar as demais medidas cabíveis que esse caso requer".

A Secretaria de Saúde (SES) confirmou os convênios da Uniselva por meio da UFMT (Universidade Federal de Mato Grosso), à qual a fundação é ligada. Mas não comentou sobre a dispensa de licitação utilizada para o fechamento dos contratos.

Gaeco investiga contratos da Uniselva

O Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco) pediu autorização à juíza Selma Arruda, da Sétima Vara Contra o Crime Organizado da Capital, para compartilhar com a Polícia Federal provas produzidas durante a Operação Convescote, que investiga desvio de cerca de R$ 3 milhões por meio de prestação de serviço fictícia nos convênios firmados entre a Faespe (Fundação de Apoio ao Ensino Superior Público Estadual) e diversos órgãos públicos nos anos de 2015 e 2017.

De acordo com o pedido, contido na denúncia contra 22 suspeitos de envolvimento na organização criminosa, a suspeita é de que as mesmas irregularidades cometidas no âmbito da Faespe – ligada à Universidade Estadual de Mato Grosso (Unemat), também tenham ocorrido em convênios firmados entre órgãos públicos estaduais e a Fundação Uniselva, ligada à UFMT.

“Em que pese a Fundação Uniselva ser uma entidade de direito privado sem fins lucrativos e os recursos em tese desviados serem estaduais, os convênios por ela firmados também teriam a UFMT como subscritora, o que evidencia interesse direto da União e justifica a remessa solicitada ao Ministério Público Federal”, disse o Gaeco.

Instalada em 10 de junho de 2002, a Uniselva tem por objetivo apoiar inúmeras atividades da UFMT no âmbito dos projetos ensino, pesquisa, extensão, desenvolvimento institucional, científico, tecnológico e de estímulo à inovação, mediante gestão administrativa e financeira necessária à execução desses projetos.

De acordo com a Operação Convescote, o esquema funcionava da seguinte maneira: instituições públicas firmavam convênios com a Faespe para prestação de serviços de apoio administrativo. A fundação, por sua vez, contratava empresas de fachada para terceirização de tais serviços. Ao final, os recursos obtidos eram divididos entre os envolvidos, sendo que o responsável pela empresa normalmente ficava com uma pequena porcentagem do montante recebido e o restante era dividido entre funcionários da fundação e servidores do TCE.

Fundações não deram certo em Mato Grosso, diz OAB

O presidente da Comissão de Direito Administrativo da OAB-MT (Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso), Allan Machado, critica a validade das fundações em Mato Grosso. Ele diz que o modelo não mostra resultados convincentes para amparo com atividades voltadas para a sociedade. Ele cita como exemplo a administração do Hospital Regional de Colíder, que apresenta várias dificuldades no atendimento ao público do SUS.

“As fundações não deram muito certo em Mato Grosso, não apresentam eficiência no serviço, é algo questionável”.

O advogado afirma que a regra para a criação de uma fundação é a realização de serviços em prol do social e as entidades não podem ter fins lucrativos. “É um critério haver o interesse público para a sua criação. A fundação pública é uma entidade da administração pública indireta, e tem como utilidade a desconcentração da administração pública. Ou seja, a administração pública direta (União, Estados, municípios) cria entes da Administração Pública Indireta (autarquias, fundações, empresas públicas), em busca de uma maior eficiência”.

No entanto, não existem regras claras de como esses serviços devem ser fiscalizados, uma polêmica para os críticos do modelo que afirmam ser um dos sugadores do dinheiro público.

“A fiscalização deve ser feita diretamente pelo ente da administração direta (o Executivo) que criou a fundação, bem como pelos órgãos de controle externo (Tribunais de Contas e o Ministério Público)”.

Ele explica que existem dois tipos de fundações públicas: as de direito privado, constituídas sem a dotação orçamentária do Poder Público, e as de direito público, instituídas através de dotação orçamentária do ente público que as criou. Neste modelo, pode haver algum tipo de aporte, mas as fundações têm autonomia administrativa.
 
Sem agenda para a imprensa

A fundação foi procurada para explicar o modelo desses contratos, mas a assessoria informou que representantes da direção estavam sem agenda para atender o jornal. 

Em nota, a Uniselva se afirma “uma entidade de direito privado sem fins lucrativos, com objetivo apoiar os projetos de ensino, pesquisa, extensão, desenvolvimento institucional, científico, tecnológico e de estímulo à inovação, colaborando para o desenvolvimento da comunidade acadêmica, bem como para propiciar atividades que ampliem os conhecimentos científicos e culturais, colocando-os ao alcance de toda a sociedade”.

Linha pela qual se teria guiado para firmar o contrato tripartite com o Tribunal de Contas do Estado, em 2015, no valor de R$ 71 milhões. 

Redação

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