O desembargador Luiz Ferreira da Silva, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), manteve a multa de 20 salários mínimos (equivalente a R$ 26,4 mil) ao juiz aposentado e advogado, Pedro Pereira Campos Filho, por não comparecer à sessão do Tribunal do Júri de seu cliente.
Para o desembargador, o caso não trata apenas de desídia, mas há indícios de que o advogado tentou uma manobra para impedir o julgamento, caracterizando “inequívoco ato atentatório à dignidade da Justiça”.
Conforme os autos, Pedro Pereira foi nomeado para defender um acusado pelo crime de homicídio em março deste ano. Só que no dia 16 de junho, às vésperas do júri popular que estava designado para o dia 21, o réu revogou a procuração outorgada ao advogado, sob a alegação de que escolheria outro defensor de sua confiança. O juízo estranhou o ato extemporâneo e decidiu aplicar a multa ao advogado.
A Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso (OAB-MT) ingressou com mandado de segurança defendendo Pedro Pereira. Além de considerar a multa como um ato abusivo e ilegal, a entidade enfatizou que a revogação dos poderes outorgados produz efeitos imediatos, sendo que a lei não exige que o advogado permaneça nos autos por 10 dias.
Desta forma, requereu a concessão de liminar para sobrestar a decisão. No mérito, pediu o reconhecimento da ilegalidade da pena pecuniária.
Ao examinar o caso, o desembargador destacou que era obrigação do advogado comunicar a revogação do mandato com prazo suficiente para constituição de novo defensor, já que havia sido mobilizado todo aparato da Justiça para a realização do júri.
“Assim, deve ser considerado como ato de improbidade processual e de abandono do processo, a estratégia ou a desídia de cientificar a revogação do mandato apenas um dia antes da data aprazado para a realização do Júri. Isso porque, muito embora a questão contratual entre advogado e cliente seja estranha à Justiça, qualquer situação que importe em modificação na representação deve ser comunicada ao juízo, para que o réu esteja sempre representado na persecução penal, em todos os atos processuais, evitando, tanto quanto possível, o adiamento deles”.
Mas o que chamou a atenção do desembargador nos autos é a suspeita de que a revogação do mandato tenha sido elaborada por Pedro Pereira, e não pelo réu. É que o magistrado de primeira instância consignou que o documento contém termos e expressões jurídicas que só alguém com conhecimento em Direito é capaz de usar, o que o fez acreditar que tenha sido o próprio advogado que elaborou a peça, já que o réu é operador de máquinas, tendo somente concluído o ensino fundamental.
A “manobra” teria sido feita para frustrar a sessão de julgamento, vez que a Justiça já havia negado outros pedidos para a resignação da data do júri.
“Portanto, não se trata apenas de desídia, mas de possível má-fé do advogado visando o adiamento do ato processual, o que, se confirmado, caracteriza inequívoco ato atentatório à dignidade da Justiça”, destacou o desembargador.
“Nessas circunstâncias, em juízo perfunctório, não se identifica plausibilidade jurídica do direito tido por violado, porquanto o magistrado de primeiro grau reconheceu a desídia do advogado, ante a comunicação extemporânea de revogação do mandato, realizada somente um dia antes da sessão de julgamento do Tribunal do Júri”, concluiu Luiz Ferreira ao manter a multa.