É o que denunciam o Ministério Público Federal (MPF) e ONGs que atuam na região do em torno de Altamira, no Pará.
Para estas instituições, as obras da usina ─ a terceira maior hidrelétrica no mundo ─ estão diretamente ligadas ao aumento da degradação, devido ao forte crescimento populacional que provocaram na área.
A situação é mais grave na Cachoeira Seca, terra indígena do povo Arara já reconhecida pela Funai (Fundação Nacional do Índio), mas que aguarda por homologação do Ministério da Justiça. A própria Funai reconhece que o quadro é crítico em um relatório de março ao qual a BBC Brasil teve acesso.
O Instituto Socioambiental (ISA) faz uma estimativa, segundo a entidade, "conservadora", de que o equivalente a R$ 400 milhões em madeira teriam sido roubados dessa terra indígena apenas em 2014 ─ são ipês, jatobás e angelins-vermelhos, cujo mercado principal costuma ser as indústrias no Sul e Sudeste do país.
O ISA acredita que o aumento da extração estaria atendendo também a uma crescente demanda em Altamira, cidade cuja população saltou 50% após Belo Monte, para 150 mil pessoas.
Desde 2011, a organização monitora a degradação da área, combinando análises de imagens de satélite, trabalho de campo e sobrevoos de fiscalização.
A estimativa é de que a área explorada ilegalmente por madeireiros dentro da Cachoeira Seca mais do que dobrou, passando de 4.700 hectares em 2013 para 13.390 hectares em 2014 ─ equivalente a 1.080 estádios Maracanã, no Rio de Janeiro.
O território total da Cachoeira Seca é de 733,7 mil hectares e equivale a quase cinco vezes a cidade de São Paulo.
Apenas no ano passado, o ISA calcula que mais de 700 km de estrada foram abertos na terra indígena, de modo que os madeireiros estão hoje a apenas 30 km da aldeia Iriri, base dos Arara.
"Atualmente, a situação está descontrolada. Já tem cinco anos que estou na região. Antigamente, os caminhões de madeira só andavam à noite. Agora é dia e noite", afirma Juan Doblas Prieto, analista de geoprocessamento do ISA.
Cachoeira Seca é considerada uma região de conflito interétnico ─ apesar de a Funai ter declarado a área como terra indígena, centenas de não indígenas (pequenos produtores rurais, fazendeiros e ribeirinhos) ainda vivem ali. A retirada desses grupos deveria ter sido realizada até 2011 e é uma das exigências legais para que Belo Monte possa começar a operar. Até hoje, porém, o governo pouco avançou no processo.
Risco conhecido
A Funai já alertava para o risco de aumento da degradação das terras indígenas na região antes do início das obras.
Em outubro de 2009, a instituição emitiu um parecer favorável ao empreendimento, mas ressaltou que ele seria viável apenas se fossem cumpridas as condicionantes detalhadas no documento ─ medidas para reduzir os impactos socioambientais de Belo Monte.
No caso de Cachoeira Seca, o parecer projetava impacto de "maior gravidade" para a extração de madeira ilegal na região.
Com objetivo de evitar que os efeitos negativos esperados se concretizassem, o governo federal deveria retirar os não indígenas e homologar a terra dos Arara antes do início das obras, em 2011.
Já a Norte Energia deveria ter construído um sistema de proteção com 21 postos e bases de vigilância em 11 terras indígenas afetadas, além de contratar 112 funcionários para os mesmos.
Até hoje, nenhuma dessas condicionantes foi cumprida. Mesmo assim, o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente) concedeu a licença de instalação para início das obras em 2011.
Fonte: BBC BRASIL