Notoriamente o braço direito do prefeito de Cuiabá, Emanuel Pinheiro (PMDB), a secretária de Gestão, Ozenira Felix Soares, nomeada para chefiar a pasta há dois meses, está presente desde a campanha de Emanuel à Prefeitura.
Ozenira comandou a Equipe de Transição de Emanuel, mas antes disso foi a cabeça responsável para elaborar o Plano de Governo na campanha do pemedebista. Com todo o conhecimento adquirido Na gestão de Cuiabá nesse processo, ela é enfática em dizer: “Tem uma quantidade muito grande de obras paradas em Cuiabá. Sabíamos que elas existiam, mas não tínhamos o conhecimento do volume. UPAs, Escolas… Muita coisa parada”.
Aos 51 anos, destes 29 dedicados ao funcionalismo público de Mato Grosso, a mulher-forte ao lado de Emanuel esbanja sorrisos, é bem-humorada e prega a humanização do serviço público. “A ideia da gestão é mudar esse conceito de que o cidadão não é um papel. Ele tem necessidade, pressa… O servidor é uma pessoa, e se ele fica doente, ele não é uma carta, é alguém que tenho que ajudar para trazer para gestão”, afirma a especialista em gestão de pessoas e em gestão pública com ênfase em carreiras.
O lado humanitário é fácil de entender quando se analisa o perfil da secretária: casada e mãe de três filhos, sendo um autista, travou uma das principais lutas da gestora politicamente: o combate ao preconceito a pessoas especiais, e garantia de direitos aos responsáveis.
Ela foi uma das pessoas a levantar a bandeira da Proposta de Emenda Constitucional em que servidores tem horário de trabalho reduzido para tratar de filho ou cônjuge especiais.
Em meio a tantas lutas políticas, a gestora garante: nada de se filiar a partido, está na pasta por dedicação ao prefeito Emanuel Pinheiro.
Confira os principais trechos da entrevista ao Circuito Mato Grosso:
Circuito Mato Grosso: Gostaria que a senhora nos contasse como começou a sua amizade com Emanuel Pinheiro.
Ozenira Feliz Souza: Eu conheci o Emanuel quando era secretária adjunta da SAD (extinta Secretaria de Administração), ainda no governo Silval Barbosa. À época, as carreiras faziam uma pressão muito grande e recorriam ao Emanuel (à época deputado), e o pessoal falava assim para ele: Não pode deixar passar nada por aquele mulher por que ela indefere. Nunca estive muito próxima dele.
E após isso, próxima a candidatura dele a prefeito de Cuiabá, nós nos encontramos na Sinfra – e eu tava trabalhando lá na época. E após isso, ele começou a me fazer perguntas sobre servidores, o que eu me lembrava, perfil, porque eu fui muitos anos da folha de pagamento do Estado… E após isso saiu a candidatura dele.
CMT: Então, como candidato ele te chamou para fazer parte da campanha?
O.F.S.: Eu assisti um analista político falando que a maior dificuldade da candidatura do Emanuel Pinheiro é porque ele não tinha um plano de governo. E ai, eu liguei para ele e me predispus a fazer a parte da pessoa com deficiência – porque tenho um filho autista. E ele aceitou.
Fiz a parte da pessoa com deficiência, passei para parte de gestão, e quando eu vi eu já estava participando das reuniões e ai produzi o plano de governo
CMT: Mas fez isso com alguma pretensão política?
O.F.S.: Tudo foi relacionado a pessoa dele. Eu não tenho filiação partidária, nunca tinha participado de uma campanha – exceto a do meu marido que já foi candidato uma vez (risos).
CMT: E como foi o convite para chefiar a Equipe de Transição?
O.F.S.: Quando ele ganhou a eleição, nós sentamos com ele, e eu falei: “Emanuel, agora é a hora de você montar sua equipe”. Eu imaginava que ele montaria uma equipe política, e por conta própria, peguei a legislação do Tribunal de Contas do Estado, montei um roteiro e dei para ele. “Oh, quem for chefiar está aqui o roteiro. Fique atento aos prazos..”.
E um dia estava em casa e fui chamada para ir à casa dele, e ele me convidou. Eu não esperava, achei que realmente faria uma equipe política.
Circuito: A senhora tem algum interesse em entrar na política diretamente se filiando a algum partido?
O.F.S.: Não, jamais. Não é meu perfil.
CMT: Antes, a Secretaria de Gestão era chefeada pelo Rafael Cotrim, que passou a ser da Educação. Como foi o convite para participar da Pasta?
O.F.S.: Quando chegou o momento de ele assumir definitivamente, ele me convidou para a secretaria. E eu respondi que não tinha participado da campanha por causa de cargo. Para mim, financeiramente, não compensa o cargo, porque como servidora de carreira recebo mais.
Ele insistiu, fez um segundo convite e eu neguei novamente. Na terceira vez, ele me convidou em público. E eu vi que estava complicado, e já foi me dando vontade de participar, de me envolver… Pedi um tempo para ele para avaliar o convite e aceitei. Eu gosto muito da área de gestão.
CMT: E como está esses quase dois meses a frente da Gestão da Capital?
O.F.S.: Tá sendo muito louco. A prefeitura, para quem já trabalhou pro Estado, tem um diferencial: no Estado tudo é macro. No Estado, eu tinha na folha de pagamento (à época que fazia) 97mil servidores, a prefeitura tem 18 mil. Lá, as pessoas estão distantes, aqui é pessoal. Até o problema da porta, o ponto que não fechou, a mesa que estragou.. E todo mundo quer conversar, e eu tenho uma característica de gostar de ouvir a todos, ai fica um pouco tumultuado.
O que observei nesse primeiro mês é que aqui é muito organizado, tem falhas, como em qualquer processo, mas existe já um modelo de organização. Os diretores e servidores são excelentes e tiveram uma recepção muito boa. E além disso, o tempo de resposta dele é muito bom.
CMT: O como a gestão está trabalhando para organizar esse “tumulto”?
O.F.S.: Eu estou tentando implantar um novo modelo de gestão da Secretaria. A gestão aqui é aquela que recebe a demanda, executa e devolve. Eu não quero isso. Eu quero me antever a demanda – quero que ela não ocorra. Fazer um serviço preventivo de organização de gestão para que você possa resolver antes de ter o problema.
Nós iremos trabalhar alguns modelos de controle de custo que é bastante alto, em cima da despesa com pessoal.
C.M.T.: Redução de gastos..?
O.F.S: Isso foi uma determinação do prefeito para que nós verifiquemos os gastos. Normalmente, quando a administração vai bem, a empresa – até nas privadas – se enche de custos, quando ele começa a ir mal, a primeira coisa que ele corta é o café e o copinho plástico. O serviço começa a cair de qualidade, e é onde ele perde cliente. Ao invés de mexer onde realmente precisa, ele mexe no superficial. Então, ele corta ao café, mas deixa todos os carros dele na rua gastando combustível.
O que nós vamos fazer? Nós vamos estudar os grandes custos da prefeitura e trabalhar os grandes custos.
C.M.T.: Já foi identificado algum desses grandes custos?
O.F.S.: Combustível, locação de veículos, telefonia… Nós já até estudamos uma solução para a telefonia, e estaremos reduzindo em torno de 40% do gasto. Foi um compromisso de campanha do Emanuel a questão do controle e transparência… E nós vamos fazer uma série de mudanças nesse sentido.
O outro grande foco nosso é a questão de desenvolvimento, qualidade de vida e saúde do trabalhador.
C.M.T.: Quando se fala em “humanização da gestão”, é sobre isso?
O.F.S.: Isso. É uma visão que eu tenho. Eu que construí os textos de humanização, que consiste em: não há como humanizar para fora, se não humanizar para dentro. Não tem como um servidor insatisfeito atender bem alguém.
Como a recepção, que será uma das coisas que iremos mudar. Colocar uma pessoa na recepção oito horas por dia em um atendimento pesado. Até o melhor ser humano do mundo no fim da tarde está com raiva de gente, na sexta-feira então, ele está odiando. E nós tentaremos reduzir a carga horária do pessoal que trabalha nessas áreas. Trabalharemos para que haja ginástica laboral, o desenvolvimento das relações interpessoais…
Isso é um trabalho para que o servidor se sinta bem, para atender os outros bem.
C.M.T.: Em coletiva recente sobre a coleta do lixo em Cuiabá, o prefeito Emanuel Pinheiro afirmou que teve uma “surpresa desagradável” no setor. Houve algum outro segmento que também trouxe surpresas desagradáveis?
O.F.S.: As obras. Tem uma quantidade muito grande de obras paradas. Sabíamos que elas existiam, mas não tínhamos o conhecimento do volume. UPAs, Escolas… Muita coisa parada. Há também muitos convênios, tivemos uma redução de convênios muito grande, houve perda de recursos e agora está em processo de organização as áreas de convenio. Que é muito complicado.
Convênio tem que ter um cuidado imenso porque senão perde o recurso, e o que observamos é que não tinha um processo de organização. O que percebemos é que não era prioridade, e quando é um recurso dado, tem que ser prioridade.
C.M.T.: Ainda falando sobre surpresas negativas, na questão do contrato da Parceria Público Privada (PPP) da iluminação houve alguma surpresa negativa? Como foi trabalhado isso dentro da Prefeitura?
O.F.S.: Eu trabalhei na questão, não pela secretaria, mas sim porque estava fora da gestão e li bastante. Nós não entramos no mérito na questão da iluminação em si. Nós fizemos uma análise do processo como um todo.
PPP é uma coisa muito nova no País, por mais que Minas Gerais já tenha feito, é um processo novo. É diferente de uma licitação comum. Ela tem um rito especial. O que a gente observou é que a Prefeitura não tinha conhecimento para fazer uma licitação como aquela.
C.M.T.: O que faltou?
O.F.S.: É um produto novo e é necessário uma equipe muito grande para estudar todo esse processo. Ela é bem diferente de uma concessão. Em uma concessão, eu pego aqui ali, licito e entrego para o particular: “Se vira, eu vou te fiscalizar”.
Em uma concessão eu não tenho risco. Em uma PPP há riscos para as duas partes – havendo perda os dois pagam. Então, tem que ser um processo em que as duas partes estão muito preparadas para ficar 30 anos, perdendo e as duas compensando. Para que nem a Prefeitura, nem a empresa percam.
C.MT: Então, a PPP foi proposta em um época errada?
O.F.S.: A PPP é uma saída, só que precisa maturidade administrativa da Prefeitura.
C.MT: O Governo do Estado tem essa maturidade?
O.F.S..: Hoje já tem. E eu vou puxar o meu saco. Eu e uma equipe montamos, embasados em uma lei, o início de toda a PPP no Estado. Nós visitamos Minas, Bahia, Espirito Santo, São Paulo… Estudamos muito. Foram anos de trabalho árduo para chega a essa PPP do Ganha Tempo. Nós começamos em 2014 o estudo, para em 2017 ela ainda não estar concluída. Conhecemos essa mesma PPP em Minas, trocamos figurinhas, e ela ainda não está pronta.
CMT: Há uma discussão no âmbito nacional e estadual sobre a reforma previdenciária. Como está essa questão no município?
O.F.S.: Nossa previdência é a mais organizada do Estado, sem sombra de dúvidas. O grande problema nosso é que a Prefeitura fez uma coisa chamada segmentação de massa. Então, a Cuiabá Prev é divida em duas previdências: servidores que entraram até o ano x, contribui e a Prefeitura paga a diferença. Servidor que entrou a partir do ano y – que são os mais novos – o dinheiro está sendo guardado. Hoje, nós temos a reserva, esse recurso está capitalizando.
Só que o primeiro pacote está aumentando, pois os servidores mais antigos estão aposentando. Então, o aporte de recurso aqui cada dia fica maior. Nós já estamos iniciando um trabalho de como podemos equacionar esse primeiro pacote – dentro do que temos hoje.
CMT: Como a Prefeitura está trabalhando para garantir a Revisão Geral Anual (RGA) aos servidores municipais, já que é uma promessa de campanha do Emanuel?
O.F.S.: Já está sendo feito uma série de medidas em cima das receitas, e esse trabalho que já disparamos em cima da despesa. Não adianta falar em grandes arrecadações, porque o momento econômico não permite. Não adianta eu aumenta receita, e não mexer na despesa. E não adianta eu diminuir despesa, se eu não tiver uma receita equilibrada.
CMT: As gestões anteriores, como a do prefeito Mauro Mendes (PSB), enfretou uma crise com os servidores da saúde. Como a gestão está dialogando com esses servidores para que uma possível greve não aconteça?
O.F.S.: A Eliseth, secretária de Saúde, criou uma mesa permanente de discussão com o servidores, lembrando que isso já é política do SUS. Essa mesa preconiza condições de trabalho, salários… Inclusive nós apoiamos ela no processo de negociação dentro da Secretaria de Saúde. Mas logicamente, já já o pessoal vai estar pedindo aumento.
CMT: E vocês estão trabalhando para que haja aumento das categorias?
O.F.S.: Nós estamos estudando os últimos cinco anos de todas as carreiras. Nós veremos no histórico para saber as perdas reais que cada grupo tem. Ali saberemos quem realmente está chorando porque está ruim mesmo, ou porque é natural. Eu também sou servidora e entendo eles. Com base nisso, no ano que vem, o prefeito Emanuel tomará algumas decisões. Por enquanto, o único compromisso é com a RGA.
CMT: Como mãe de um filho especial, como está a tratativa para implementar em Cuiabá a lei que assegura jornada menor para servidores que possuem cônjuges ou filhos deficientes, assim como há no Estado?
O.F.S.: Essa é uma Emenda Constitucional do Estado, na época eu estava lá (no governo Silval), e briguei para que fosse aceita. Mas, após a entrada do [Pedro] Taques, a Procuradoria Geral de Justiça disse que a Emenda era inconstitucional. Porque quem fez a emenda foi o deputado Azambuja, e eles disseram que apenas o executivo poderia ter tido a inciativa.
Agora, está no Tribunal de Justiça, mas por enquanto só quem tem o direito a redução de carga horária é quem conseguiu liminar.
CMT: E como está sendo trabalhado essa questão no município?
O.F.S.: Foi feita uma Lei no município fazendo a concessão. Eu estou solicitando uma pequena alteração nela, por uma questão de pericia médica. Na lei, as pericias médicas devem acontecer de seis em seis meses e dá a impressão que é doença, mas síndrome não é doença. Não vai sarar, não muda. A intenção é ampliar essa pericia para de dois em dois anos ou três em três anos, mas não para comprovação da síndrome.
CMT: Finalizamos por aqui. Gostaria de destacar alguma questão?
O.F.S.: A gente viveu muitos anos em uma gestão que chamamos de burocrática, em que você pega o papel, lê o papel, e devolve o papel. E ninguém avalia que atrás daquele papel tem uma pessoa, que de repente está doente, que tem problemas.
Se a pessoa falar que está com depressão, a administração pensa: “Quanto de dinheiro irei gastar com esse cara parado?”. O que queremos mudar é que não tem que pensar no dinheiro que eu vou estar gastando naquilo, e sim que eu vou trabalhar aquela pessoa para que ela não tenha a doença.
A ideia da gestão é mudar esse conceito de que o cidadão não é um papel. Ele tem necessidade, pressa… O servidor é uma pessoa, e se ele fica doente, ele não é uma carta, é alguém que tenho que ajudar para trazer para gestão. E é isso que consideramos que é processo de humanização. Que é não ver o papel, e sim as pessoas que estão atrás do papel.