Política

Tangará vive uma década de instabilidade política

 
É o caso, por exemplo, do município de Tangará da Serra. Lá, desde o inicio do século XXI tornaram-se corriqueiros os afastamentos, cassações e as eleições indiretas para prefeitos. Há mais de uma década, a instabilidade política tornou-se uma “maldição” em Tangará e ela ocorre, principalmente, pela prática de improbidade administrativa e desvio de recursos públicos.
 
A saga começou quando Jaime Muraro era prefeito da cidade pelo extinto PFL, hoje Democratas. Ele foi eleito em 1996 e reeleito em 2000. No segundo mandato foi afastado pelo menos quatro vezes do cargo e cassado, em sessão bastante tumultuada, pela Câmara Municipal e, em seguida, pela Justiça. Mas conseguiu voltar ao poder, embora contra ele existissem sérias denúncias.
 
Em 2002, por exemplo, o Ministério Público Estadual ingressou com uma Ação Civil Pública por improbidade administrativa contra Muraro e 28 pessoas. Eles foram investigados durante oito meses e processados em uma ação de 9 mil laudas, que apontavam irregularidades em licitação e desvio de dinheiro público. 
 
Segundo o MP, na época, os danos causados aos cofres públicos chegariam a R$ 1,85 milhão. A ação pedia a perda das funções públicas e dos direitos políticos dos acusados. Muraro foi o único acusado em todas as 13 irregularidades encontradas nas investigações. “Tangará da Serra estava sendo palco de atos de verdadeiro vandalismo que atentam à ética, à moralidade administrativa e ao patrimônio público” denunciava o Ministério Público. 
 
Ex-prefeito Jaime MuraroDois anos antes dessa ação, a prestação de contas do primeiro mandato de Muraro foi reprovada pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) e pela Câmara Municipal. Por conta disso, o MP entrou com uma ação que resultou na recente cassação dos direitos políticos de Muraro e seu vice-prefeito na época, Fábio Junqueira, hoje filiado ao PMDB. Eles ainda foram condenados pela 4ª Câmara do Tribunal de Justiça a ressarcirem o erário em cerca de R$ 31 mil.
 
Muraro ainda foi condenado na esfera criminal de Tangará, em 2010. O juiz Jacob Sauer condenou o ex-prefeito por crime de responsabilidade. O democrata utilizou recursos públicos para contratar um escritório de advocacia para fazer sua defesa em uma ação de indenização por danos morais movida por 50 policiais militares. Na época, a prefeitura já contava com assessoria jurídica. O valor da ação foi de R$ 65 mil.
 
Em meio a tantos processos e reviravoltas, o ex-prefeito acabou sendo preso. Isso ocorreu porque Muraro teria intimidado testemunhas de processos contra ele. Apesar de tudo isso, o ex-prefeito só desistiu da vida pública em 2008, quando o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) impugnou sua candidatura. Além de prefeito, ele foi vereador e deputado estadual. A reportagem tentou entrar em contato com Muraro para comentar todos esses casos, mas sem êxito.
 
 
Poucos sobrevivem à maldição da cadeira em Tangará
 
Júlio César LadeiaCidade do médio-norte de Mato Grosso com quase 100 mil habitantes, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2013, Tangará da Serra já viveu altos e baixos no cenário político recente. A instabilidade iniciada na gestão de Jaime Muraro (DEM) contagiou a administração de seus sucessores. De lá para cá, poucos foram os prefeitos que conseguiram "sobreviver" ao cargo.
 
Reeleito em 2008, o radialista Júlio Cesar Ladeia (PR), por exemplo, foi afastado pela Câmara Municipal, por nove votos contra um. O republicano enfrentava altos índices de rejeição em 2011, por conta dos problemas administrativos e de ações judiciais do Ministério Público Estadual, que o acusava de improbidade administrativa. Entre as denúncias estava o desvio de quase R$ 700 mil do Fundo de Reequipamento do Corpo de Bombeiros, por exemplo. 
 
Durante o período em que Ladeia esteve afastado, a cidade foi comandada pelo vice-prefeito José Jaconias da Silva (PT). Ocorre porém que, meses depois do afastamento, outra reviravolta aconteceria na cidade: o prefeito afastado, seu vice e mais quatro vereadores foram cassados pela Câmara. 
 
Os políticos foram acusados de envolvimento no desvio de recursos promovidos pela Oscip Idheas, responsável na época por diversos setores da saúde municipal. A entidade teria causado prejuízos de R$ 5,4 milhões aos cofres públicos, além de ter sido acusada de tráfico de influência, nepotismo e supervalorização salarial. Ladeia, Jaconias e os quatro vereadores foram cassados por contratação sem licitação, continuidade nos contratos, não ter agido para coibir os crimes, recebimento ilícito de recursos, entre outros itens. 
 
Após isso, o presidente da Câmara, Miguel Romanhuk (DEM), já falecido, assumiu de forma interina a Prefeitura. Mas retornou ao Legislativo para conduzir a eleição indireta para prefeito, na qual saiu vitorioso Saturnino Masson (PSDB). Tangará da Serra foi o primeiro município brasileiro a realizar eleição indireta após a ditadura militar, que durou 21 anos. 
 
 
Destituído por improbidade, ex-prefeito se diz perseguido
 
Fábio JunqueiraO caso mais recente na cidade de Tangará foi a extinção do mandato de Fábio Junqueira, em maio, pela Câmara Municipal. Junqueira foi condenado em dezembro do ano passado, por improbidade administrativa, pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso. 
 
Surpreso com a extinção do mandato, ele reagiu dizendo que não sairia do cargo de prefeito. E apontou perseguição política no ato da Câmara. Já destituído do cargo, Junqueira interpôs um agravo de instrumento para reverter a decisão judicial que declarou seus direitos políticos suspensos e obrigou a ter que pagar multa e devolver dinheiro aos cofres públicos. A tentativa não teve êxito. Ao Circuito Mato Grosso, o ex-prefeito reafirmou que se sente perseguido político, mas não quis comentar o assunto. “Sinto que há perseguição, por isso não vou me manifestar”, disse.
 
Junqueira foi condenado na mesma ação que Jaime Muraro. Segundo o Ministério Público Estadual (MPE), ambos contraíram despesas pela municipalidade referentes a pagamentos efetuados à Associação Mato-grossense dos Municípios (AMM), sem comprovação, bem como despesas bancárias indevidas e ausência de processo licitatório, de prévio exame e aprovação da assessoria jurídica e numeração e folhas nos certames, e ainda atraso na prestação de contas. Na época, Junqueira era vice-prefeito de Muraro.
 
 
População demonstra descontentamento com políticos
 
Imersa em tantas reviravoltas políticas, a população de Tangará da Serra vem desacreditando na classe de representantes e fica perdida às vésperas das eleições. A contadora Marina Rodrigues de Souza, por exemplo, critica a instabilidade política. Para ela, o problema vem prejudicando a cidade nos últimos anos: “Isso impede o crescimento e o desenvolvimento da cidade, porque os políticos ficam o tempo todo focados apenas na questão política, por conta da instabilidade”. 
 
Ela ainda diz que percebe o descontentamento nas conversas com amigos e conhecidos de sua rede de contatos. “Até quando? A gente vê que não tem seriedade por parte dos políticos. Eu não me sinto representada. Somos usados!”, desabafa. 
 
A opinião da contadora é reforçada pelo construtor Aécio Andrade, que há mais de 30 anos mora em Tangará. “Todo prefeito que entra, nenhum serviu nos últimos anos. A saúde e a segurança estão muito ruins. E as eleições estão chegando e a gente não sabe nem em quem votar para nos representar na região. Então a gente fica chateado e descontente com tudo isso”.
 

Redação

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Reportagens realizada pelos colaboradores, em conjunto, ou com assessorias de imprensa.

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