A advogada Emmanuelle Alves Ferreira da Silva, que arrastou filhos de desembargadores para o centro de um escândalo de corrupção no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, foi presa em 2018, acusada de usar documentos falsos para tentar aplicar um golpe em um aposentado para receber indevidamente R$ 5,5 milhões. Mas ela acabou beneficiada por uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que anulou sua condenação ao cravar que não existe o crime de “estelionato judiciário”.
Até a publicação deste texto, a reportagem do Estadão buscou contato com a defesa, mas sem sucesso.
O STJ atravessa uma etapa de forte turbulência com a citação aos nomes de alguns de seus ministros a partir da análise de mensagens e dados no celular do advogado Roberto Zampieri, o “lobista dos tribunais”, executado com 12 tiros em Cuiabá em dezembro de 2023.
Emmanuelle teria usado documentos falsificados, como notas promissórias e até um termo de confissão de dívida, para dar entrada em um processo alegando que um suposto cliente não tinha recebido o dinheiro da venda de uma fazenda ao aposentado.
A advogada respondeu a um processo por estelionato, associação criminosa, falsificação de selo público, falsificação de documento público, falsidade ideológica e uso de documento falso. Ela foi condenada a três anos e seis meses de prisão, mas não chegou a cumprir a pena. No Superior Tribunal de Justiça, foi beneficiada por um habeas corpus que anulou a sentença, à revelia do Ministério Público.
Por unanimidade, a Sexta Turma do STJ confirmou, em julgamento realizado em abril, uma decisão do ministro Francisco Falcão que derrubou a condenação com a justificativa de que o Código Penal não prevê o crime de “estelionato judiciário”.
“Inexistente como figura penal típica a conduta de induzir em erro o Poder Judiciário a fim de obter vantagem ilícita, não havendo falar em absorção de uma conduta típica (falso) por outra que sequer é prevista legalmente (estelionato judiciário)”, argumentou o ministro.
Transferências bancárias feitas pela advogada no valor de R$ 380 mil colocaram a Polícia Federal no rastro dos advogados Rodrigo Gonçalves Pimentel, filho do desembargador Sideni Soncini Pimentel, e Fabio Castro Leandro, filho do desembargador Paschoal Carmello Leandro. Os advogados são investigados na Operação Ultima Ratio por suspeita de intermediarem a venda de decisões no Tribunal de Mato Grosso do Sul.
As suspeitas, que atingiram primeiro a corte estadual, alcançam agora o próprio STJ, que beneficiou a advogada. Os autos do inquérito da Operação Ultima Ratio foram remetidos ao Supremo Tribunal Federal (STF), após citações aos gabinetes dos ministros Paulo Moura Ribeiro, Og Fernandes, Nancy Andrighi e Isabel Gallotti. Eles negam ligação com práticas ilícitas.
A Polícia Federal quer aprofundar a investigação para identificar se servidores dos gabinetes dos quatro ministros do STJ teriam negociado decisões e se os magistrados tinham conhecimento de negociatas.