Após a Operação Ícaro, que levou à prisão o auditor fiscal de rendas Artur Gomes da Silva Neto, suspeito de ter arrecadado R$ 1 bilhão em propinas de gigantes do varejo como a Ultrafarma e a Fast Shop, o governador Tarcísio de Freitas e o secretário da Fazenda e Planejamento Samuel Kinoshita decidiram revogar a norma que disciplina procedimentos de complemento e ressarcimento do ICMS retido por Substituição Tributária (ICMS-ST).
As novas regras, previstas no Decreto 69.808, publicado nesta terça, 19, buscam endurecer o modelo que abriu caminho para “apropriações aceleradas”, favorecendo empresários em troca de propinas. Conforme o decreto, devem ser adotados: processamento automatizado para checagem das informações e cruzamento com outras bases de dados; ampliação da rastreabilidade para “assegurar o acompanhamento transparente de todas as etapas do processo”; conta corrente digital do e-Ressarcimento, para “dar maior controle e visibilidade sobre os créditos”; integrações futuras com novas plataformas de controle, “fortalecendo a governança e a capacidade de monitoramento”.
“Essas ações têm como objetivo não apenas apurar eventuais irregularidades já identificadas pela Operação Ícaro, mas também eliminar riscos e evitar práticas indevidas ainda não detectadas”, disse Kinoshita. O secretário destacou que “o compromisso da Fazenda é entregar um sistema mais seguro, moderno e transparente, baseado em malhas de fiscalização, recursos tecnológicos avançados e regras de integridade reforçadas”.
A Operação Ícaro foi deflagrada no dia 12 por uma força-tarefa de promotores do Gedec – braço do Ministério Público estadual que combate delitos econômicos – e da Corregedoria Tributária da Fazenda. Foram presos Sidney Oliveira, dono da Ultrafarma, e o diretor estatutário da Fast Shop, Mário Otávio Gomes.
Na sexta-feira, a Justiça pôs Sidney e Mário em regime de prisão domiciliar com tornozeleira. E impôs a cada um fiança de R$ 25 milhões.
Apontado como o cabeça do esquema instalado na Fazenda, o fiscal Artur Gomes teria usado a própria mãe, de 73 anos, como “laranja”. Pela conta de um escritório de consultoria tributária – registrado em nome da idosa -, transitou a fortuna supostamente amealhada pelo filho. Outros dois fiscais são citados: Marcelo de Almeida Gouveia, lotado na Delegacia Regional Tributária de Osasco, Grande São Paulo, e Alberto Toshio Murakami, aposentado em janeiro deste ano. As defesas foram procuradas, mas não se manifestaram.
Artur e Marcelo foram afastados dos cargos por ordem judicial. A Secretaria da Fazenda informou que abriu um procedimento administrativo para “apurar, com rigor” a conduta dos servidores. Eles teriam oferecido uma consultoria clandestina para empresas varejistas conseguirem restituições milionárias de créditos de ICMS. As empresas que pagavam propina recebiam tratamento privilegiado e furavam a fila de restituições. Os procedimentos de ressarcimento de ICMS envolvem cálculos complexos e tendem a ser lentos, mas para empresários que contemplavam os fiscais a burocracia dava lugar a uma tramitação relâmpago.
Com a revogação do Decreto 67.853/2023, que previa o procedimento de “apropriação acelerada”, a partir de agora todo processo seguirá obrigatoriamente o rito de auditoria fiscal até a conclusão da revisão completa dos protocolos. Todo esse mecanismo será reavaliado dentro de uma nova regulamentação, atualmente em estudo por um grupo de trabalho específico.