Magro, com um papelão dobrado e sujo junto ao peito, Joaquim dos Santos Teixeira Filho está parado e calado no Largo do Machado, na Zona Sul do Rio. Diante da tradicional galeria Condor, que abriga uma das iguarias mais famosas da cidade uma esfirra que frequentemente estampa guias gastronômicos ,o ex-chef de cozinha ganha seu sustento. Mas ele não trabalha ali. Pede esmolas desde que teve a aposentadoria por invalidez negada na Justiça. Irregular, o cartaz improvisado torna a leitura difícil, onde quase todos estão de passagem, com pressa. "Tenho Aids. Benefícios recusados pelo INSS. Preciso de ajuda! Obrigado!", diz o texto do homem de 55 anos.
Joaquim viveu intensamente a década de 1970 nova-iorquina, nos Estados Unidos, onde os ideais hippies floresceram. Lá, ele se graduou na área de culinária, antes de trabalhar em restaurantes italianos. Aos 25 anos foi a uma consulta médica, fez um exame de sangue e foi diagnosticado com HIV após uma noite de sexo sem preservativo, desconfia. Deu início ao tratamento e seguiu com a vida. Tinha quase 30 anos de Estados Unidos e 49 de idade quando recebeu uma ligação de casa. Foi quando voltou ao Brasil para se dedicar aos cuidados do pai, que "estava quase morrendo", com um problema no coração. "Foi meu pai que me inspirou a ser chef, ele trabalhava com isso também, mas sempre no Brasil".
Anos depois perdeu seu inspirador. Após a morte do pai, a mãe também adoeceu. Morando sozinho em um apartamento no Flamengo, deu entrada com um pedido de aposentadoria por invalidez em junho deste ano. O benefício, segundo o INSS, foi indeferido justamente por Joaquim não ser "segurado da Previdência Social". Afinal, morando fora, ele não contribuía.
Neste caso, o próprio Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) recomenda que a pessoa peça o Benefício de Prestação Continuada, "cuja operacionalização também é feita pelo INSS", segundo o próprio Instituto. Joaquim pediu, mas a assistência foi negada por decisão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), em agosto. De acordo com o texto, faltam documentos como "comprovante de residência" e "comprovante de requerimento administrativo" do benefício.
Apesar dos desgostos com certos serviços públicos, Joaquim diz que o tratamento gratuito que recebe na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) é "bom". Nos EUA, diz, "era maravilhoso". Aos 55 anos, ele queria voltar a trabalhar, mas não consegue. Mesmo desempregado, precisa se sustentar horas de pé como seria numa cozinha caso trabalhasse. "Não tenho fonte de renda. Fico pedindo dinheiro na rua. Queria receber um salário mínimo, mas não estou conseguindo. Peço comida no Corpo de Bombeiros à noite. De dia, peço dinheiro na galeria Condor [no Largo do Machado]".
O queixo, a boca e as mãos de Joaquim tremem como se compensassem a urgência de desabafar em uma voz que sai quase sempre baixa, monossilábica. O tremor, porém, é apenas uma das reações do coquetel de medicamentos que precisa tomar. "Já tentei procurar emprego, mas não consigo por causa dos efeitos colaterais do remédio: diarréia, neuropatia…".
G1