O Estado de Mato Grosso só começou a esboçar um projeto para a regulamentação da lei pelo governador Silval Barbosa (PMDB) após reunião em Brasília na segunda-feira 20/01, convocada pela CGU e Conselho Nacional de Controle Interno (Conaci).
Cristiane Laura de Souza, secretária-adjunta da Corregedoria Geral do Estado, participou da reunião em Brasília e confirmou que estão elaborando o projeto a partir da reunião com a CGU, alinhando-se com os demais estados da Federação. A secretária-adjunta prevê prazo de 30 dias para finalizar o projeto e entregar ao governador para que ele regulamente a lei em Mato Grosso.
Existem duas estratégias da lei de combate à corrupção empresarial: uma de repressão e outra de investigação. No front repressivo, aplicam-se multas pesadas às companhias que oferecem ou pagam propina a servidores e fraudam licitações e as obrigam a publicar a sentença em veículos de comunicação. No front investigativo, são oferecidos benefícios para empresas que admitem os ilícitos e colaboram com delações ou provas – por meio dos acordos de leniência, que reduzem a multa em até dois terços. A punição é administrativa, aplicada diretamente pelos governos, sem passar pelo congestionado Poder Judiciário.
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Essa normatização levará empresas a se preocuparem em criar novas estruturas de políticas de controle, uma vez que a existência de "compliance" (controle ético e de obediência às leis) poderá servir como atenuante e assim terem suas multas reduzidas.
Outros estados estão se preparando para regulamentar a lei
Das 27 entidades federativas, três devem regulamentar a lei nos próximos dias e apenas um – Tocantins – já a regulamentou. Outros 18 ainda elaboram projetos ou discutem sua elaboração, inclusive o Estado de Mato Grosso.
Amapá, Paraná e Rio Grande do Sul devem regulamentar a lei nas próximas semanas. Espírito Santo, Distrito Federal, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Pará, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo discutem projetos nesse sentido. Os outros estados não têm projeto ou ele ainda está em elaboração.
Para que surta efeito significativo no Brasil todo, é importante a regulamentação da lei em todos os estados, segundo o secretário-executivo da CGU, Carlos Higino. Em entrevista ao UOL, ele diz que o governo federal não pode obrigá-los a regulamentar o dispositivo, mas quem não fizer isso afugentará investidores. "As empresas têm que ter clareza do que vai acontecer em casos de corrupção", diz.
Muito embora a nova lei anticorrupção ainda tenha suas deficiências, sua entrada em vigor será uma iniciativa importante para que o país passe a ocupar uma melhor posição no cenário mundial, especialmente considerando que, de acordo com o índice de percepção da corrupção (Corruption Perception Index), o Brasil ainda ocupa a 72ª posição, atrás de países como Namíbia, Gana e Kuwait.
A busca de formas para combater o problema da corrupção interessa ao cidadão comum e à sociedade como um todo que, infelizmente, não tem na classe política um bom exemplo.

João Edison de Souza, analista político, é enfático ao dizer: “O governador não tem interesse nenhum em regulamentar a lei, principalmente em final de mandato e com tantas demandas que ainda tem o estado”.
Souza lembra que muitos casos acontecidos no governo de Silval Barbosa poderiam ter sido enquadrados na nova lei, caso houvesse lisura nas contratações das empresas e na elaboração dos editais.
O analista acredita que o governo sempre encontrará ‘brechas’ para auferir alguma vantagem e beneficiar ‘empresas-amigas’ e alerta sobre uma possível ‘cultura de presentes’, mimos que poderão ser entregues a agentes públicos saindo de contas pessoais de empresários, o que não seria caracterizado como corrupção.
“O corruptor é tão hediondo quanto o corruptível”, sintetiza o professor-doutor Alfredo da Mota Menezes, sobre a lei que pune também o setor empresarial. Menezes relata que os agentes e servidores públicos (corruptíveis) eram os que sofriam sanções quando descoberta a falcatrua e, com a nova lei, o empresariado (corruptor) agora também terá severa punição.
O professor adverte que um governo corrupto pode apresentar um processo licitatório feito dentro da normalidade e “usarem os aditivos para eventuais pagamentos de propina”.
Licitação do VLT poderia ser enquadrada na nova lei
À época, Rowles Magalhães Pereira da Silva, assessor especial do vice-governador Chico Daltro, adiantou que o consórcio VLT Cuiabá venceria a licitação e que integrantes do governo estadual receberam uma propina da ordem de R$ 80 milhões para viabilizar o negócio. O caso ganhou repercussão nacional e Rowles foi demitido.
Caso a Lei Anticorrupção estivesse em vigor, o consórcio poderia ter sido punido com multas estratosféricas (calculadas sobre o faturamento bruto de cada empresa) e a punição teria sido publicada em mídias de repercussão nacional. Os integrantes do governo deveriam ser submetidos às sanções segundo o Código Penal e da Lei do Funcionalismo Público.
Outro exemplo que poderia ser enquadrado na nova lei seria a gravação-denúncia do vereador e ex-presidente da Câmara de Cuiabá João Emanuel (PSD). No vídeo, o vereador propõe um detalhe no processo licitatório (uma máquina de impressão) para que a empresa vencesse o certame e garantisse a propina.
Se a empresa houvesse sido declarada vencedora da licitação, estaria enquadrada na nova Lei Anticorrupção e sofreria multas e teria o nome incluso no Cadastro Nacional de Empresas Punidas (CNEP). João Emanuel foi destituído do cargo e aguarda posicionamento da Justiça e da Comissão de Ética da Câmara Municipal de Cuiabá.