Bolachas, cigarros, lâminas de barbear, produtos de limpeza, óleo de cozinha e isqueiros são alguns dos itens que a população carcerária de Mato Grosso não precisa pedir para seus familiares levarem durante as visitas às unidades penitenciárias: os artigos estão disponíveis no interior das próprias prisões, em mercadinhos que funcionam sem regulamentação.
Segundo relatos, os presos são até proibidos de portar esses itens sem que sejam comprados nesses mercados, que praticam preços superiores aos convencionais.
Procurada, a Secretaria estadual de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh), que gere o sistema penitenciário em Mato Grosso, admitiu a existência dos mercadinhos em seis unidades prisionais. Uma delas é a maior do estado, a Penitenciária Central do Estado (PCE), em Cuiabá.
A situação aparece em imagens obtidas dentro da Penitenciária Major Eldo Sá Correa (conhecida como Mata Grande), a segunda maior unidade prisional de Mato Grosso, localizada em Rondonópolis (município a 212 km de Cuiabá). Em dia de visita, parentes de presos são impedidos de levar determinados itens alimentícios devido à obrigatoriedade de comprá-los no mercadinho dentro da prisão.
No caso, sabe-se que o mercadinho é administrado por uma associação de servidores do sistema penitenciário e são servidores que trabalham nesse comércio, por designação da direção da unidade.
Um agente penitenciário membro desta associação afirma que é desconhecido o uso do dinheiro arrecadado com as vendas. Estima-se que a renda diária do mercadinho seja da ordem de R$ 120 mil. De acordo com o agente, que preferiu manter-se no anonimato, o lucro é geralmente rateado com a direção do presídio.
Embora a legislação de execuções penais permita o funcionamento de cantinas em presídios, os casos observados chamam atenção por serem de estabelecimentos comerciais que não chegaram a vencer concorrências públicas para operarem dentro das unidades penitenciárias.
Também falta controle sobre os itens vendidos – pois vários podem ser considerados perigosos para utilização dentro das unidades – e clareza sobre o destino do dinheiro arrecadado. O mercadinho que funciona dentro do Centro de Ressocialização de Cuiabá (CRC), na capital, por exemplo, não deixa de conter indícios de ilegalidades mesmo sendo considerado um modelo no estado pela Sejudh. Lá, são vendidos itens perigosos como lâminas de barbear e isqueiros.
A direção do CRC, também conhecido como Presídio do Carumbé, afirmou que poderá retirar os itens à venda depois que a reportagem questionou sobre os riscos envolvidos. Já de acordo com o sindicato dos agentes penitenciários, a desregulamentação e brechas na lei permitem que o comércio ocorra dentro das unidades sem qualquer controle.
'Irregular e perigosa'
Após analisar as imagens que mostram o funcionamento dos mercadinhos, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Mato Grosso classificou a situação como irregular e perigosa. Itens à venda como óleo de cozinha e isqueiros, por exemplo, podem causar ou ser utilizados em momentos de turbulência, alertou o presidente Maurício Aude.
Por sua vez, o juiz da Vara de Execuções Penais reconhece a necessidade de regulamentar o funcionamento dos mercadinhos. Ele defende o comércio interno dos presídios, mas desde que o dinheiro arrecadado seja utilizado com transparência (com prestação de contas por parte da Sejudh) para melhorias no próprio sistema carcerário.
Por último, o governo do estado se manifestou afirmando que montou uma comissão com objetivo de finalmente regularizar a situação dos mercadinhos nas penitenciárias. O governo assegura que vai sanar as ilegalidades que ainda ocorrem dentro desses mercados nas cadeias.
Fonte: G1