Política

Seduc completa 13 anos marcados por escândalos de gestores

Com orçamento que ultrapassou a casa de R$ 1 bilhão, em 2010 e previsão de R$ 2,4 bilhões para 2016, a Secretaria Estadual de Educação (Seduc) contabiliza 13 anos de escândalos de corrução e incontáveis irregularidades gravíssimas nas contas de gestão. Nesse intervalo, a Seduc foi comandada por dois representantes do PT, em 8 anos do governo Blairo Maggi e quatro anos de Silval Barbosa, e um PSDB, do atual governo de Pedro Taques.  

Todos os que passaram pela pasta tiveram em comum apontamentos de falhas graves na administração – sobre preço em contrato, exclusão de licitação pública em valores milionários e até a suspeita de o gestor dividir a ocupação com a gerência de um cartel envolvendo servidores de médio escalão, empresários e empreiteiras 

A gestão da Secretaria Estadual de Educação (Seduc) foi marcada por escândalos durante o governo de Blairo Maggi. Nos oito anos de mandato do atual ministro de Agricultura, Abastecimento e Pecuária, de 2003 a 2010, a pasta foi administrada por maior tempo pelos petistas Ságuas Moraes e Rosa Neide Sandes, que se destacaram com casos esdrúxulos de desmando, até hoje sem explicação, e por ações de afronta às leis de serviços públicos.

Ságuas Moraes comandou a Seduc por três anos (2007-2009) após ser indicado por Maggi no começo de seu segundo mandato como governador. O empresário do agronegócio foi reeleito em 2006 e Moraes conseguiu o cargo de deputado estadual nas eleições do mesmo ano.  Em 2010, subiu para o cargo de deputado federal, mas não chegou a cumprir mandato por ter sido barrado pela Lei da Ficha Limpa. Então, voltou para a cadeira da Seduc, já dentro do governo de Silval Barbosa.

Em 2013, ele ganhou noticiário nacional após liberar R$ 7,7 milhões para contratação de bufês pelo período de um ano, e no cardápio havia pratos sofisticados, como salmon ao molho tártaro e salada de mariscos. O dinheiro estava destinado para a realização de 433.512 refeições entre cafés da manhã, almoços e jantares.  À mesma época, profissionais da rede estadual de educação estavam em movimentação para deflagração de greve, com exigência da montagem de um plano de carreira e salários.

Relatórios do Ministério Público de Contas de Mato Grosso (MPC-MT), em análise aos exercícios de 2007 a 2009, apontam uma série de irregularidades na pasta que vão de frágil controle das atividades internas à contratação de empresas sem trâmite de concorrência pública.

Ele assumiu a pasta em junho de 2007, após a saída de Luiz Antônio Pagot, mas, conforme o MPC, foram identificadas irregularidades durante todo o exercício. O órgão aponta a falta de apresentação de relatório de execução de obras sob a responsabilidade da Seduc e vícios em processo de licitação.

Falhas consideradas graves pelo MPC, como falta de controle nos gastos, saída de dinheiro sem comprovação documental de destino e ausência de um servidor designado à fiscalização de contratos foram apontadas novamente em 2009 e 2010, ano em que a gestão da Seduc foi dividida entre Ságuas e Rosa Neide.

A situação fica mais caótica nos exercícios posteriores. Segundo o MPC, em 2011, Ságuas Moraes autorizou a contratação da empresa Ábaco LTDA pelo valor de R$ 2.652.730 sem licitação. Para a mesma empresa houve a liberação de outras duas parcelas, no mesmo ano, de R$ 1.111.500 e R$ 1.254.890 em prorrogação de contratos sem a abertura de novas concorrências públicas.

Superfaturamento e software pirateado na gestão Rosa Neide

Outra conta que aparece com série de irregularidade em relatório do Ministério Público de Contas é da professora Rosa Neide Sandes, que esteve no comando da Seduc por mais de uma vez entre 2010 e 2014. O caso mais alarmante de gastos sem controle foi a compra de oito mil agendas desatualizadas, no final de 2014. Segundo parecer divulgado no ano passado pela Controladoria Geral do Estado (CGE), aquisição do material teria sobrepreço de 120%, e irregularidades foram identificadas no processo de licitação, do empenho à entrega.

A gráfica responsável pelo serviço é uma das investigadas pela Delegacia de Fazenda (Defaz) em esquema de fraude de licitação que teria desviado R$ 40 milhões em contrato de serviços para o governo, em certame de 2011.

Rosa Neide assumiu a direção da Seduc pela primeira vez em 2010, quando Ságuas foi eleito para o cargo de deputado federal. Em 2011, ele dividiu o comando da pasta juntamente com Ságuas, que teve o mandato no Congresso suspenso por força da Lei Ficha Limpa. As contas da Seduc do ano foram reprovadas pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) por acúmulo de erros, dentre eles, supostos superfaturamentos de obras.

Em 2012, ela exerceu o cargo de assessora especial na secretaria e voltou ao posto de chefe em 2013, quando Ságuas Moraes assumiu o cargo de deputado federal. Em julho do ano passado, a CGE abriu um processo para tentar recuperar R$ 5 milhões de contrato assinado em 2014, último ano de Rosa Neide na pasta, com empresa prestadora de serviços de informática.

À época, houve a denúncia de que o software utilizado pela empresa era pirateado, o que foi negado por Rosa Neide.

No ano passado, a Seduc divulgou um balanço com uma lista de 10.813 em escolas estaduais em Mato Grosso. Em 2014, foi identificada a participação de empresas prestadoras de serviços para Seduc, durante a gestão de Ságuas Moraes, no financiamento de campanha de reeleição do atual deputado.

Permínio é suspeito de chefiar ‘‘QG de fraudes’’

No comando da Seduc desde o começo do governo Pedro Taques, em 2015, o ex-secretário Permínio Pinto chegou a ser exibido por Taques como o gestor que iria recuperar a rede pública de Mato Grosso, que tinha sido “solapada durante os oito anos de mandato do PT”, segundo Taques.  Seu afastamento, no entanto, foi oficializado sob a pressão das investigações do GAECO, que o identificou como chefe de organização criminosa dentro da Seduc.  Permínio Pinto saiu do cargo um dia antes de ser preso em Cuiabá.

Conforme denúncia do Ministério Público Estadual (MPE), Permínio estava no topo de uma organização que desviou R$ 56 milhões da Seduc com fraudes em certames de licitação. O MPE aponta que as fraudes começaram a ser realizadas em outubro do ano passado e até o momento foram identificados problemas em obras de 23 escolas.

As concorrências estariam organizadas por meio de um cartel e os empresários componentes distribuíam os projetos entre si. O ex-secretário teria participação ativa nas rodadas de negociação em reuniões realizadas em um edifício em Cuiabá que servia de QG.

Além do ex-secretário, quatro pessoas tiveram prisão decretada por participação no esquema: os ex-servidores da Seduc, Fábio Frigeri, Moisés da Silva e Wander Luiz dos Reis; e o empresário Giovani Guizardi, dono da construtora Dínamo. Guizardi, segundo o MPE, seria o caixa do grupo com a função de arrecadar dinheiro pago pelas empreiteiras contratadas pelo governo estadual.

Os servidores presos estariam no primeiro núcleo de fraudes com o papel de interventores. De dentro da Seduc, eles assegurariam que as licitações destinadas ao cartel não fossem destinadas para que chegassem às mãos de outros concorrentes do certame público. Guizardi e mais dois empresários – Luiz Fernando da Costa Rondon, Leonardo Guimarães Rodrigues – estariam no trabalho intermediário, responsáveis por maquiar as fraudes e manter contatos entre envolvidos na Seduc e as empreiteiras, que seriam as maiores beneficiárias do esquema.

Impunidade favorece a corrupção, diz MCCE

Para o fundador do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) em Mato Grosso,  Antônio Cavalcanti Filho, a corrupção se infiltra em instituições públicas por meio de braços. A ligação entre gestores e empresas é a via mais larga. Ele cita como exemplo a repercussão da operação Lava Jato no País, que compromete os maiores partidos políticos.

“PT, PMDB e PSDB estão envolvidos nos esquemas de propinas para pagamento de campanhas dos candidatos. São partidos tradicionais no Brasil que, historicamente, são sustentados por grandes empresas, e a participação é recorrente das mesmas empresas. É uma estrutura montada para a qual entram e saem políticos e o partidos. Em Mato Grosso podemos citar o problema da Seduc, que foi gerida pelo PT e pelo PSDB, e em ambos houve corrupção”, diz.

A sensação de descontrole do crime surge da ideia de impunidade, que Calvanti diz ser o maior corredor de corrupção. “A impunidade é a máquina da corrupção. Se não se sente que pode ser punida pelos seus atos, ela não irá parar de desviar recursos do cofre público, por exemplo. Mas para a lei funcionar é preciso ter fiscal, que esteja de olho. E de novo aqui é necessária a participação da sociedade”.

Segundo ele, as ligações políticas podem ser identificadas em vários setores dos três diferentes níveis de governo no País. “No julgamento de contas pode ocorrer de os técnicos estudados, que fazem análise fria das contas, emitirem um parecer, mas quando as contas chegam para julgamento no TCE, mesmo com erros, elas são aprovadas, por causa de um julgamento político”.

Os relatórios do MPC, entre 2007 e 2014, analisados pela reportagem são concluídos na grande maioria com desaprovação do corpo técnico de auditores, com recomendações e ressalvas que vão de grave a gravíssima. No entanto, o Pleno do TCE considerava “exequível” a aprovação do exercício.

Rede pública padece com falta de investimentos

Pablo Miguel, 16 anos, estuda no Liceu Cuiabano, uma das escolas mais comentadas entre estudantes em Cuiabá. Quando pediu a sua mãe para matriculá-lo na instituição tinha em mente os comentários de terceiros sobre a qualidade do ensino.

“Mas lá não é grande coisa, não. Estudei em outras escolas públicas e não vi grande diferença no Liceu Cuiabano. E nas outras escolas, os professores ainda escrevem com giz, a quadra de futebol era péssima, e as aulas de informática eram chatas. A gente tinha que ficar disputando computador”.

Prestes a encerrar a graduação de ensino médio, não se sente entusiasmado com a perspectiva do vestibular. “Vou ter que fazer um cursinho, eu acho, para tentar entrar na universidade”.

Para o professor Henrique Lopes, essa situação poderia ser explicada pela falta de investimento na educação pública. A defasagem de equipamentos e a alta carga horária dos professores podem levar à incapacidade de atender a demanda dos alunos hoje.

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores do Ensino Público de Mato Grosso (Sintep-MT), diz que a falta de investimento é um dos principais problemas da rede pública de ensino Mato Grosso. O gasto com um estudante está hoje na faixa de R$ 3 mil, valor que corresponde á metade do considerado razoável para ensino de qualidade.

“A exemplo do Brasil, Mato Grosso tem problemas sérios com a falta de infraestrutura na rede pública. Estamos numa era moderna com escolas do século XVIII. O professor não consegue dar aula da forma que essa garota ligada à internet, ao mundo virtual, precisa, de forma que a faça se interessar por estudar. Não há estrutura para isso”, explica.

Além da precária infraestrutura, a alta carga de hora/aula dos professores dificulta o atendimento apropriado ao aluno e provoca o esgotamento psicofísico do profissional. “O professor começa a dar aula quando ainda está em casa, preparando o que vai dar em sala. Fica no mínimo um turno inteiro na escola e volta para casa com um monte de trabalhos e provas para corrigir. Até a família acaba se perdendo”, conclui.

Reinaldo Fernandes

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