Foto: TJ-MT
Presidente do Tribunal de Justiça (TJ-MT), o desembargador Rui Ramos teme que a denúncia de suposta ilegalidade na quebra de sigilo telefônico em Mato Grosso possa trazer grande insegurança jurídica ao Estado.
Na avaliação do desembargador, caso a denúncia de que pessoas sem qualquer envolvimento com crimes tenham tido seus telefones grampeados, por decisão judicial, outros processos envolvendo casos similares poderão ser anulados. A declaração de Rui Ramos é referente a denúncia investigada na Procuradoria-Geral da República (PGR), em que policiais militares, por interferência de membros do Poder Executivo estadual, teriam inserido contatos de políticos, médicos, advogados, jornalista e outros, no pedido de quebra de sigilo em investigação envolvendo o crime de tráfico de drogas na região de Cáceres. A técnica é conhecida como "barriga de aluguel".
A análise do desembargador parte do pressuposto pela Constituição Federal, na qual não se admite a utilização de provas ilícitas ou imorais para indiciar um crime, causando uma insegurança jurídica à sociedade.
“Podemos encontrar ilicitude, estamos falando de possibilidade e não probabilidade, mas quando se sai da licitude, corre o risco de macular processos que já estão transitado em julgado. Nada mais trágico para efeito de Justiça, uma ação mal feita que pode contaminar o todo”, declarou, durante coletiva à imprensa, na manhã desta quarta-feira (17).
Rui Ramos afirmou que não se pode admitir processos contaminados e, por isso, talvez seja necessário mudar a decisão das ações transitadas em julgado ou proferir uma sentença absolutória. “Parece coisa simples, mas não é”, afirma.
“Se encontrado uma prova ilegal, é uma prova que não é prova [pois não pode ser considerada]. Portanto o que restou, pode não restar nada [para um indiciamento], se isso acontecer absolve”, explicou.
Esclarecimento às vítimas
Para o presidente do TJ, o esclarecimento sobre o caso é fundamental e garantiu que, se confirmado interceptações ilegais, irá contatar todas as vítimas para explicar às pessoas que foram alvo de uma espionagem clandestina, para que possam se sentir resguardadas.
“Não posso deixar esquecer da importância de que as vítimas, ou possíveis vítimas, sejam efetivamente esclarecidas. Quem foi ouvido indevidamente tem que ser esclarecido. É uma responsabilidade do Judiciário e do Estado [informar a vítima]. A vítima vai ter o direito de saber”, disse Rui Ramos.
Além da deputada estadual Janaina Riva (PMDB), do jornalista José Marcos dos Santos, o “Muvuca”, e do advogado José do Patrocínio, a lista de números telefônicos supostamente grampeados também traz contatos de servidores da Assembleia Legislativa, ex-secretário adjunto da Capital, assessores parlamentares e até de um ex-desembargador do Tribunal de Justiça (TJ-MT).
Prejuízo ao Estado
Sem nenhum fato concreto a respeito das escutas telefônicas, se são ou não ilegais, o desembargador afirma que caso seja apurado a ilegalidade das interceptações e o Judiciário realizasse a revisão criminal, o Estado ganharia mais despesas por conta de indenizações. Isso porque os grampos partiram da investigação de determinadas pessoas envolvidas em crimes e no meio dos nomes inserem contatos de não investigados
“Com certeza, [a revisão criminal] pode gerar prejuízo ao Estado. A vítima tem que saber, porque se houver, de algum modo, a negligência do Estado, penalização contra o Estado. O Estado não é superior a nós ele é uma criação nossa, quem é real somos nós, o Estado não é real é nada mais aquele que deverá garantir o que ‘combinamos’”, frisou Rui Ramos.
O magistrado disse ainda que o Judiciário não deve proteger nenhum outro Poder, seja Executivo ou Legislativo. “É dever do Judiciário a justiça. Não é dever de o Judiciário proteger o Estado, o governador, presidente da Assembleia Legislativa, prefeito. O Judiciário não protege ninguém, tem que defender o que é peculiar”, diz Ramos.
O resultado sobre a análise dos pedidos judiciais de interceptação telefônica, a partir do ano de 2014, deve sair nesta sexta-feira (19), conforme a determinação da corregedora-Geral da Justiça, desembargadora Maria Aparecido Ribeiro.
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