No Rio de Janeiro, pelo menos dois PMs morreram por mês, em serviço, no período entre janeiro e setembro de 2015, segundo dados do ISP (Instituto de Segurança Pública). Somados dois homicídios que ocorreram em outubro, são pelo menos 20 até agora. Ou seja, dos últimos três anos, este é o que terminará com maior número de mortes de policiais militares em serviço: foram 18 no ano passado, e 16 em 2013.
Insatisfeitos com o aumento da violência contra PMs, membros da corporação, familiares e apoiadores participam nesta quarta-feira (28), às 10h, de um protesto em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. Mais de 1.000 pessoas confirmaram presença por meio de redes sociais. Os manifestantes devem fazer uma caminhada pela Via Light.
Os dois últimos homicídios contra PMs foram resultantes de tentativas de assalto. Em 2 de outubro, um policial morreu e outro ficou ferido após abordagem de criminosos em Sulacap, na zona oeste do Rio. As vítimas seguiam de moto para um treinamento do Bope (Batalhão de Operações Especiais) em Ramos, na zona norte, quando foram surpreendidos por dois assaltantes, também em uma motocicleta. Os policiais reagiram, e houve troca de tiros.
Na última sexta-feira (23), o sargento Fernando Monteiro foi morto a tiros em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. A vítima ainda tentou fugir a pé, mas foi atingida por vários disparos depois que os criminosos encontraram a farda do policial militar no interior do veículo. De acordo com o 15º BPM (Duque de Caxias), Monteiro estava a caminho do trabalho.
O UOL solicitou entrevista com o chefe do Estado-Maior da Polícia Militar, coronel Robson Rodrigues, mas não houve autorização. A assessoria recomendou que a reportagem procurasse, por telefone, o coronel Oderlei Santos, relações-públicas da PM. O celular do oficial, porém, estava desligado. Não houve pronunciamento da corporação por meio de nota.
PMs mortos durante folga
As estatísticas seriam ainda piores se o Instituto de Segurança Pública incluísse, no dado, policiais mortos durante folga, como no caso do soldado Neandro Santos de Oliveira, do 31º BPM (Recreio dos Bandeirantes). O militar foi capturado em uma falsa blitz de traficantes e queimado vivo por criminosos da favela Final Feliz, em Costa Barros, zona norte da capital fluminense, em 12 de outubro. O corpo da vítima foi identificado uma semana depois.
No fim do ano passado, levantamento feito pelo UOL mostrou que, de janeiro a novembro de 2014, 44 militares morreram quando estavam de folga, o triplo em relação aos PMs mortos em confronto, no mesmo período. Procurada pela reportagem, a Polícia Militar informou que não divulgaria o número referente a 2015.
Fracasso das UPPs
Para Paulo Storani, antropólogo e ex-integrante do Bope (Batalhão de Operações Especiais), "ser policial militar no Rio, hoje, parece ser uma sentença de morte". "O soldado americano que está no Afeganistão ou na Síria, com certeza, está em uma profissão arriscada. Mas esse risco ainda é muito menor do que ser policial militar no Rio de Janeiro."
O especialista afirmou acreditar que o aumento do número de PMs assassinados está relacionado, entre outros fatores, com o fracasso da política das UPPs. "Há uma tentativa por parte de criminosos de reocupar as comunidades com a mesma liberdade que eles tinham antes. Sabemos que o tráfico permanece nesses locais, mas o enfraquecimento do projeto das UPPs fez com que esses criminosos ficassem mais audaciosos e violentos", disse.
Storani declarou ainda ter tido, durante 30 anos de atividades como policial militar, "a infelicidade de enterrar vários colegas". "Inclusive, vários alunos que foram meus alunos na academia. No Bope, eu vivenciei dois casos", completou. Segundo ele, há uma sensação coletiva de que "a guerra está sendo perdida". "A sensação é que você está perdendo a guerra. Toda vez que um combatente tomba em combate, a sensação é essa. Você é tomado por um desencanto em relação à missão."
Status criminoso
Na avaliação do presidente da Aspra (Associação de Praças da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro), Vanderlei Ribeiro, o planejamento do Estado para a área de segurança pública é falho. Isso cria, segundo ele, "situação de total vulnerabilidade" para os policiais.
"O enfrentamento contra a criminalidade requer um planejamento mais adequado. O que está acontecendo hoje é uma situação de total vulnerabilidade do policial militar. Em determinadas áreas, o PM vive uma realidade extremamente delicada, inclusive nas UPPs. Ele se vê cercado", disse.
Ribeiro afirmou também que os criminosos responsáveis por matar policiais ganham "status". "Para ele, é uma glória. Até no morro, ele passa a ser uma liderança, alguém que contribui para o crime. Mas são coisas que, na verdade, parecem deboche em relação ao Estado. Nós carecemos de um melhor planejamento e de ações mais enérgicas. O confronto existe porque o Estado está ausente."
Fonte: UOL