Deputados estaduais se articulam para travar o projeto de reforma tributária proposto pelo Executivo devido ao pouco tempo de discussão. Nesta terça-feira (22) iniciou-se a contagem de trinta dias para a Assembleia Legislativa aprovar o texto a tempo de entrar em vigor em 2017. No entanto, as ponderações de entidades representantes do comércio e da Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso (OAB-MT) sobre vários itens, alguns considerados inconstitucionais, encerrou a fase de debate do governo mais com desacordos do que com consenso sobre a mudança.
“Os deputados articulam para pedir revisão da minuta da reforma e uma nova rodada de discussões, e considerando que o projeto precisa passar por cinco sessões na Assembleia, ele não passará neste ano para entrar em vigor em 2017. Isso também se deve ao pouco tempo que o governo deixou para a discussão do projeto com as várias entidades da sociedade”, disse fonte consultada pelo Circuito Mato Grosso.
Segundo a fonte, em paralelo com o travamento do projeto, os deputados também preparam medida para impedir que o decreto 380 passe a vigorar a partir de 1º de janeiro. A intenção é segurar a aplicação de qualquer mudança no âmbito tributário até que se conclua a análise do projeto de reforma.
“Os deputados já sabem que está no gatilho pelo governo a aplicação do famigerado decreto 380 [a aprovação da reforma invalida a normativa], que é contestado por quase todas as entidades comerciais em Mato Grosso, por isso também trabalham para impedir que ele entre em vigor já no próximo ano”.
Para entrar em vigor em 2017, com prazo até o fim do primeiro semestre, o trâmite da reforma tributária precisa obedecer aos princípios constitucionais de anterioridade e anuidade, que se complementam. Na prática isso quer dizer que as mudanças legislativas do porte do projeto devem ser avaliados e aprovados no ano anterior à data de entrada em vigor. Se não passar pelo Legislativo até o dia 22 de dezembro, a reforma só poderá entrar em vigor em 2018.
Caso esse cenário se consolide, o nível de arrecadação do Estado não deve ser alterado no próximo ano. Os R$ 10 milhões previstos para arrecadação pelo novo modelo são uma transferência de valor estimado para a estrutura atual de tributos.
No entanto, a Secretaria de Estado de Fazenda (Sefaz) afirma que o emaranhado de leis, considerado institucional há ao menos cinco anos, não se sustenta por mais um ano por causa das contradições provocadas pelos choques de medidas administrativas, o que gera impacto no recolhimento de impostos. Hoje, há cerca de 200 mil processos de contestação por empresários.
Para o economista tributarista, Kaike Rachid, o governo deve reduzir o tamanho da folha de pagamento para conseguir assegurar o equilíbrio de caixa. A urgência de aprovação de reforma, como solução imediata para o problema de fluxo financeiro pode ser prejudicial.
“Há vários órgãos e gabinetes em vigor no Executivo, criados na gestão do Pedro Taques, que desconhecem suas funções. O governo precisa fazer um enxugamento da máquina pública para conseguir equilibrar as contas. Se o governo quer que a sociedade colabore, também precisa mostrar que está trabalhando para diminuir os gastos. Mas isso não significa que reforma seja ruim. Ela é boa, só não está sendo bem discutida”, comenta.
Brecha para decretos e alta de alíquota são contestadas
A OAB-MT apresentou um parecer sobre a proposta de reforma tributária com 54 itens considerados inconstitucionais ou mal elaborados pelo governo. O principal deixa brecha para que as normas previstas no projeto sejam modificadas por meio de decreto do Executivo, o que é uma contradição que fere a intenção de tornar o sistema tributário isonômico e neutro.
Conforme o advogado Carlos Montenegro, o dispositivo consta do parágrafo 4º do 2º artigo do projeto 3.3 que o governo tem apresentado a entidades. O texto diz que “poderá ser exigido o pagamento antecipado do imposto, conforme disposto no regulamento, relativamente a operações, prestações de atividades, ou categorias de contribuintes, na forma estabelecida pelo Poder Executivo”.
A distorção volta a aparecer no artigo 53 da minuta, no qual está determinado que o texto do “regulamento estabelecerá o local, a forma e os prazos para o recolhimento do imposto, admitida distinção em função de categorias, grupos ou setores de atividades econômicas”.
“Esses dispositivos anulam todos os meses de discussão que tivemos, com participação da FGV (Fundação Getúlio Vargas, responsável pela elaboração do texto de reforma), sobre a mudança tributária. O governo mudou do projeto 4.0 que previa simplificação, isonomia, neutralidade, transparência e arrecadador (da sigla SINTA) para um novo modelo, para adequar à realidade atual, mas não aplicou os princípios que devem servir para qualquer mudança”, disse Montenegro.
A União dos Shopping Centers de Mato Grosso (Unishop) e a Associação de Empresas de Informática e Telecomunicações de Mato Grosso (Asseite-MT) questionam o aumento da carga tributários para seus segmentos.
O empresário Junior Macagnan, presidente da Unishop, diz que modelo traz insegurança jurídica devido à variação da alíquota do ICMS, que poderá ficar entre 12% e 18%, para os produtos básicos.
“As contas estão entre as variáveis de 12% a 18% para o varejo, mas por essas duas alíquotas nós teremos aumento de impostos para os empresários. Para os optantes do Super Simples, provavelmente haverá uma carga tributária em torno de 60%, ou seja, o empresário que paga hoje R$ 100 passará a pagar R$ 160. E se para o varejo a alíquota for de 12% acreditamos que subirá 20% do valor pago no imposto hoje”, disse.
Na avaliação da Asseite-MT, a variação mínima será de 60% e pode chegar a 100%, o que é considerado “desproposital” por empresários do segmento. Hoje a alíquota de ICMS no Estado é de 7%, e com a reforma ocorreriam altas para os patamares base de 12% com variação até 15%. Segundo a associação, o segmento já tem a maior carga tributária do País em Mato Grosso.
Deputados dizem não acreditar em aprovação
O deputado estadual Carlos Avalone (PSDB) afirmou ser improvável que a reforma tributária seja aprovada ainda neste ano. “Não só eu, mas meus colegas parlamentarem também não tem essa convicção, não só pelos trâmites dos trabalhos da Casa, mas também pela complexidade do assunto”.
Na noite de terça-feira (22), entidades representantes do comércio (Fecomércio-MT, FCDL e Facmat) tiveram uma reunião com deputados para debater a proposta do governo, montada pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Entre os principais prejuízos dessa proposta, segundo apontamentos feitos pela equipe jurídica da Fecomércio-MT, é o aumento da carga tributária especialmente para as empresas que fazem parte do Simples Nacional e recebem tratamento diferenciado por serem micro e pequenas empresas.
O deputado da base do governo, Dilmar Dal Bosco (DEM), disse não haver motivos para preocupação com o decreto 380, visto que a Assembleia avalia sustar a validade. “Temos o entendimento de, caso a reforma não seja aprovada este ano, de sustar os efeitos do 380”.
O deputado Oscar Bezerra (PSB), coordenador da Frente Parlamentar em Defesa do Comércio, disse que “não é a intenção bater de frente com o governo”. “Nós estamos na expectativa do próprio governo revogar esse Decreto, para que não seja necessário que, em caso de votação, seja vencido com o nosso voto, pela sustação de seus efeitos”, finalizou Oscar, que ainda ressaltou que se a reforma for aprovada este ano, vai pedir ao governo o prazo de seis meses para que as novas regras passem a valer.