Cidades

Recurso tem sido ”tábua de salvação” para empresário

As organizações e empresas têm papel social importante. Por meio de suas metodologias profissionais, homens e mulheres de interesses distintos, todos importantes dentro do contexto dos meios de produção, podem se especializar em diferentes tarefas que de alguma maneira contribuem com a sociedade, provendo também o sustento e a qualidade de vida de milhões de famílias. Dada essa onipotência, é natural que existam recursos para evitar suas falências, algo que pode ajudar a salvar algumas empresas tradicionais de Mato Grosso.

Para o advogado e representante legal da Construtora Tocantins, organização que entrou com pedido de recuperação judicial em outubro de 2014, Clóvis Sguarezi, o recurso pode ser a cartada final de empresas com muitas pendências trabalhistas, contábeis e com fornecedores. Segundo ele, um dos motes mais importantes da Lei 11.101/2005, que disciplinou a questão, é a “blindagem” de 180 dias oferecida a esses empreendimentos, de modo a ajudar na melhoria de sua saúde financeira.

“O mais importante é o prazo de 180 dias de blindagem, um fôlego para as empresas manterem sua unidade produtiva, os focos de renda e os postos de trabalho. A lei possibilita isso para afastar quaisquer ações que possam prejudicar as organizações, até que elas apresentem um plano”, diz ele.

De acordo com Clóvis, a lei permite que dentro desse prazo de 180 dias a empresa focalize as energias para, ao final dele, apresentar um plano para fugir da falência – quando há disponibilização dos ativos empresariais apenas para saldar dívidas com os credores, sejam de ordem trabalhista ou de fornecimento de bens. Nesse período, nos primeiros 60 dias, o empresário deve apresentar o esboço de um plano de recuperação, que ainda será submetido aos credores.

Após essa apresentação, todos que têm direito de receber por algum serviço prestado à empresa dispõe de 30 dias para avaliação do mesmo. Caso haja discordância em alguns pontos, eles podem ser sanados na assembleia de credores, onde pode ser apresentada uma “contraproposta” ao projeto inicial, ou até mesmo a decretação de falência da companhia, na hipótese de não haver consenso entre as partes.

Para Clóvis, no entanto, esse não é o intuito da recuperação judicial, uma vez que muitas empresas dependem indiretamente dessa organização que está momentaneamente passando por dificuldades: “A recuperação judicial deve ser encarada como uma tentativa de evitar o prejuízo social que advém da falência, que é um processo moroso. É parte do interesse dos credores chegar a um consenso, pois muitos deles dependem dessa organização”.

Recuperação da Tocantins é homologado

O juiz Flávio Miraglia, da primeira Vara Cível Especializada em Falência Recuperação Judicial e Cartas Precatórias, homologou a recuperação judicial proposta pela Construtora Tocantins. Dos R$ 21 milhões que ela tinha de passivo, ou seja, suas dívidas, a organização conseguiu baixar para R$ 8 milhões a serem pagos no prazo de 16 anos.

A Construtora Tocantins, que iniciou suas atividades em 1989 em Cuiabá, especializou-se em contratos com órgãos públicos – sobretudo projetos de habitação, com destaque para o Minha Casa, Minha Vida, em anos recentes.

Contudo, o ramo de atuação dos negócios em que a incorporadora obteve destaque também representou uma ameaça que quase culminou com sua falência. Parceira da Caixa Econômica Federal nos empreendimentos do Minha Casa, Minha Vida, a Tocantins enxergou uma boa oportunidade de negócios quando o Banco do Brasil ofereceu um contrato de exclusividade para financiamento desses imóveis.

A história, que parecia ser boa para ambos os lados, terminou com uma empresa tendo que recorrer a recuperação judicial. Sguarezi, advogado e representante legal da Tocantins, afirma que após o Banco do Brasil realizar uma oferta tentadora a sua cliente, 10 meses se passaram até que a instituição financeira apresentasse o contrato que, segundo ele, “estava bem diferente do acordado no início das negociações”.

“O Banco do Brasil chegou oferecendo condições muito mais atrativas que a Caixa Econômica. A Tocantins acreditou no banco, mas quando veio o contrato, 10 meses depois, ele estava bem diferente do que havia sido acordado. Como a empresa dependia desse negócio, acabou aceitando assim mesmo”, diz ele.

Clóvis diz ainda que boa parte dos clientes que iam até a construtora e tentavam conseguir o financiamento pelo Banco do Brasil para participar do Minha Casa, Minha Vida tinha o perfil negado pela instituição financeira, impedindo a liberação de recursos. Ele afirma que isso foi crucial para o aumento das dívidas da Tocantins e denuncia ainda a intransigência do banco nas negociações: “Em nenhum momento eles aceitaram sentar conosco para negociar. Na oportunidade em que conseguimos trazê-los para conversar, eles propuseram pagamento à vista da dívida. Isso não existe em recuperação judicial”.

Empresas tradicionais também usam recurso

Outros grupos aqui em Mato Grosso também recorreram a recuperação judicial para fugir da falência.

Entre os casos mais recentes, a recuperação judicial do Grupo Modelo – rede de supermercados que em seu auge tinha unidades em Cuiabá, Várzea Grande, Rondonópolis, Tangará da Serra e Primavera do Leste – não teve final feliz. No final de julho de 2014 a empresa encerrou trajetória de 30 anos, com dívidas superiores a R$ 180 milhões. A crise do grupo começou em 2008.

Outro caso recente de recuperação judicial e que ganhou destaque na imprensa foi a do Grupo Trescinco. Em crise desde 2007, a empresa responsável pela distribuição de veículos e caminhões Volkswagen em Mato Grosso possui passivo estimado em R$ 58,8 milhões.

A recuperação da companhia foi autorizada pela justiça em fevereiro de 2015. A empresa culpa a crise econômica mundial pelo arrefecimento dos negócios.

A Alcopan, usina de álcool de grande porte localizada em Poconé (100 km da capital), também entrou com pedido de recuperação judicial, sendo aprovado pela justiça em 2009. A empresa tinha dívidas de R$ 60 milhões, mas o grupo Zulli, que controlava a indústria, tinha dívidas de R$ 150 milhões.

A Alcopan não conseguiu se recuperar, tendo sua falência decretada pela justiça em 2012 a pedido do Ministério Público do Trabalho, que a denunciou por prática de trabalho escravo.

Confira detalhes da reportagem no jornal Circuito Mato Grosso

Diego Fredericci

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