O número de veículos que passaram por recall em 2014 cresceu 124% em relação a 2013. No ano passado, mais de 1,5 milhão foram convocados para o conserto de defeitos. Em 2013, foram 676 mil. Segundo os dados do Procon-SP, esse é o maior número desde que o órgão começou a contabilizá-lo, em 2002.
O número de campanhas de recall também foi o maior no período: 95. O aumento em relação a 2013 (73) foi de 30%.
Entre as montadoras, Chevrolet, Ford, Land Rover, BMW e Toyota foram as líderes no ranking de recalls em 2014.
A Chevrolet teve 17 campanhas de recall no ano passado. Em 2013, foram apenas seis. A Ford, que ficou em segundo lugar, convocou em 2014 o chamamento dos carros do modelo Novo Ka dias após seu lançamento nas concessionárias brasileiras.
Segundo Sonia Amaro, supervisora institucional do Proteste, de defesa ao consumidor, o aumento também deve-se a pressão dos órgãos de defesa pela transparência das empresas. "Antigamente, havia o que chamamos de 'recall branco': as empresas convocavam os consumidores para a troca de peças, mas isso não era divulgado oficialmente. Isso caracterizava o descumprimento ao Código de Defesa do Consumidor", explica.
Para William Maluf, professor de engenharia mecânica do Centro Universitário da FEI, o desenvolvimento acelerado de produtos também é um fator que contribui para as falhas. "As empresas se preocupam demais em lançar produtos com inovações tecnológicas, mas nem sempre dominam essa tecnologia. Os testes custam tempo e dinheiro, mas esse desenvolvimento acelerado pode ter um custo final muito maior com a reposição de peças, a logística do recall e o valor intangível que é arranhar a marca da empresa", afirma.
Das 95 campanhas de recall realizadas no Brasil ano passado, 16 foram convocadas por problemas no sistema de airbag, que afetaram 251.230 veículos. Em seguida, aparecem os problemas no sistema elétrico e no motor.
Até dezembro de 2014, o defeito na abertura de airbags fabricados pela empresa japonesa Takata, revelado em 2013, foi ligado a quatro mortes e pelo menos 139 feridos nos Estados Unidos, de acordo com relatórios do governo, processos judiciais e revelações das fabricantes de veículos.
A companhia fornece o item para grandes montadoras em todo o mundo, inclusive no Brasil. Honda, Nissan e Toyota convocaram unidades vendidas no País para recall. Pelo menos sete campanhas de recall referem-se ao problema no Brasil.
Segundo a Takata, o problema no sistema de airbag deve-se a possível ruptura da estrutura do inflador das bolsas em casos de acidentes, que pode projetar fragmentos de metal e plástico contra os passageiros. Em situações extremas, isso pode causar ferimentos graves ou fatais aos ocupantes.
Já em relação ao sistema elétrico, o principal problema fooi na GM, referente a posição do modelo da chava de ignição em alguns carros. Com o possível contato com o joelho do motorista, poderia ocorrer o giro da chave no sentido anti-horário, causando o desligamento do veículo e uma parada repentina.
"Montadoras precisam se comunicar com o consumidor", diz Proteste
Para Sonia, a indústria automobilística precisa adotar uma comunicação mais individualizada com o consumidor. "Ainda que haja a divulgação na imprensa, muitos consumidores não tomam conhecimento do recall. Essa indústria, que tem os dados dos compradores dos seus carros, pode adotar uma comunicação mais próxima e individual", explica.
Maluf também questiona a passividade do consumidor brasileiro. "Os consumidores aceitam com facilidade esse tipo de comportamento das montadoras. Às vezes, a montadora lança um carro com problema e, como se não bastasse, o cliente tem todo o trabalho de se deslocar até a concessionária e não encontra a peça para reposição. Mas ele não deixa de comprar um carro daquele modelo ou marca por isso", diz.
"Não basta só chamar os consumidores. Às vezes, a pessoa não consegue agendar para fazer o serviço. O consumidor usa diariamente o carro, as pessoas pegam estrada todos os dias e isso pode acentuar o risco", corrobora Sonia.
A supervisora também alerta que as empresas precisam convocar o recall logo que o fornecedor toma conhecimento da periculosidade do produto. "Caso não faça isso, a empresa pode respoder nas áreas civil e criminal", diz.
Em nota, o presidente da Anfavea, Luiz Moan, afirmou que "a realização do recall é positiva e reflete a atitude madura dos fabricantes de veículos, que sempre que necessário convocam seus consumidores para verificação de eventual não conformidade e respectiva solução, com o objetivo de preservar a segurança do motorista e dos passageiros". A indústria automobilística, diz o executivo, é pioneira na realização de campanhas de chamamento no mundo e no Brasil, e que isso é reflexo do compromisso permanente de respeito aos consumidores.
A Ford, também por meio de nota, informou acreditar que "o lançamento de uma campanha de recall é positivo, pois demonstra a preocupação com a segurança e integridade dos consumidores". A montadora afirmou também que tem como prática concentrar em um único CNPJ todos os procedimentos de recall, incluindo automóveis e caminhões, além de marcas que fazem parte do grupo.
Já a BMW, afirmou que, "por ser reconhecido pela qualidade e segurança de seus produtos, o BMW Group trata como prioridade a identificação de qualquer problema que possa comprometer a saúde e segurança de seus clientes" e que cumpre com todas as exigências legais dos países em que atua no que diz respeito à convocação pública de clientes em situações de recall, "ao mesmo tempo em que trabalha continuamente para minimizar esse tipo de ocorrência".
Fonte: iG