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Questionamento que se faz é de onde virá a desinflação necessária, diz Campos Neto

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, reforçou nesta terça-feira, 19, em evento da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), que o grande questionamento atual no mundo é qual será o vetor desinflacionário à frente. Ele lembrou que a desaceleração recente na alta dos preços globais foi muito puxada pelos bens industriais, mas que neste segmento a inflação parou de cair e, como a inflação de serviços segue estabilizada em nível alto, há dificuldade para garantir a convergência às metas.

“Se temos inflação de serviços mais ou menos estabilizada entre 4,5% e 5%, precisaríamos que os bens continuassem caindo”, frisou Campos Neto, ao lado do presidente da ACSP, Roberto Ordine, e do deputado federal Danilo Forte (União-CE), que também estavam no evento.

Campos Neto pontuou novamente que a inflação segue bastante pressionada ao redor do mundo, o que não é diferente nos países emergentes, como o Brasil.

Questão fiscal

Durante sua fala, o presidente do BC voltou a chamar a atenção para a questão fiscal, apontando para o crescimento da dívida da maioria dos países no mundo, que remonta ao contexto dos gastos com a pandemia de covid-19.

Ele também destacou que, diferentemente do contexto de antes da pandemia, o cenário agora é de juros mais altos no mundo todo, o que também encarece o custo da dívida. “Saímos de juro médio de 0% para 3,2%, 3,3%”, disse.

EUA e Trump

O presidente do Banco Central afirmou ainda que a concretização de medidas de deportação de imigrantes nos Estados Unidos, aventadas pelo presidente eleito do país, Donald Trump, tem o potencial de fazer “explodir” a inflação norte-americana.

Citando estudos do Banco Central, Campos Neto mencionou que a estimativa é de um acréscimo de 3 pontos porcentuais na inflação dos Estados Unidos caso ocorra a deportação de cerca de 7,5 milhões de imigrantes nos EUA. “Isso é o adicional de inflação, depois essa pressão ‘volta'”, contemporizou.

Em relação ao cenário fiscal norte-americano, o presidente do BC pontuou que, com Trump, a tendência é que a dívida do país, que já cresceu muito, deva continuar aumentando.

Crescimento do PIB como efeito da expansão fiscal

O presidente do Banco Central disse também que discorda da avaliação de que o forte crescimento da economia brasileira nos últimos anos é resultado apenas do impulso fiscal.

“Acho que tem um componente que é fiscal, mas tem um componente que foi o efeito das reformas cumulativas que nós fizemos nos últimos anos”, comentou o banqueiro central, citando que houve avanços na desburocratização da economia e aumento da liberdade na economia, por conta de medidas como a aprovação do marco do saneamento básico. “Tem um pedaço que é mais estrutural, e muita gente está revisando o crescimento estrutural brasileiro para cima”, complementou.

Novamente a inflação

Em relação ao comportamento da inflação no País, Campos Neto lembrou que os preços vinham desacelerando, com a inflação se aproximando das metas, mas que esse movimento parou de acontecer. “A gente tinha alguns indicadores antecedentes que mostravam que teríamos um desafio grande, principalmente na inflação de serviços”, detalhou.

Nesse sentido, Campos Neto frisou que essa percepção de piora na inflação não é uma avaliação apenas dos “malvados da Faria Lima”, mas que também acontece entre economistas e agentes da “economia real”. “É interessante que o mundo real é até mais pessimista na percepção”, disse.

6×1

Ao comentar sobre o mercado de trabalho, Campos Neto voltou a se posicionar contra o fim da escala 6 x 1, que, segundo ele, vai contra os avanços alcançados com a reforma trabalhista e demais mudanças que garantiram mais liberdade econômica.

“Países que têm relação de trabalho mais flexíveis tendem a ter desemprego mais baixo, então eu acho que você voltar atrás nisso, não vai ser bom para o empregado”, afirmou o presidente do BC.

Prêmio de risco alto

O presidente do Banco Central explicou ainda que o prêmio de risco alto que se coloca sobre o Brasil hoje decorre da desconfiança da capacidade do País de equilibrar sua dívida pública. “A gente hoje vive uma elevação do prêmio de risco que está muito ligada a uma desconfiança dos agentes de que o governo não vai conseguir, no longo prazo, equilibrar o resultado fiscal do País”, disse.

Ele citou ainda que, diferentemente de outras nações, que passam pelo mesmo problema de não conseguir gerar superávits primários, o “ponto de partida” da dívida brasileira já era maior. Isso, aliado ao fato de o Brasil ter uma carga tributária elevada, contribui para a questão do prêmio de risco elevado.

Ao comentar sobre a dinâmica e os efeitos da política fiscal, Campos Neto detalhou que, às vezes, um fiscal expansionista, com intuito de estimular a economia pode, na verdade, ter um efeito contrário, justamente pela questão do prêmio de risco.

“Se o mercado tiver um entendimento de que o fiscal está desequilibrado, você pode ter o efeito reverso, ou seja, eu faço um pacote fiscal tentando fazer a economia crescer e o efeito é uma contração econômica. Porque o elemento prêmio de risco que atua sobre a disposição das pessoas de gastar e investir acaba sendo maior do que o dinheiro que está sendo colocado em circulação no curto prazo”, explicou.

Campos Neto avaliou ainda que, caso ocorra um cenário de forte desaceleração da economia global, em um contexto como o atual, em que as dívidas já estão crescentes, a margem de manobra dos BCs ao redor do mundo tende a ficar limitada. Isso porque, segundo ele, os governos provavelmente apostariam na expansão fiscal para estimular a economia. Assim, os BCs elevariam juros, mas em um momento em que a dívida pública está crescente, e o próprio custo da dívida aumentaria ainda mais.

Estadão Conteudo

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