Quando se pesquisa “como começar a trabalhar com tecnologia?” no Google, uma enxurrada de cursos e dicas pulam na tela. Grande parte desse conteúdo é voltado para a formação em TI (tecnologia da informação), mas – quase – nenhum considera que profissionais de tecnologia podem atuar em outras áreas, como designers, gerentes de produtos, especialistas em ética e linguistas, por exemplo.
Entrar nesse mercado, portanto, não está mais exclusivamente relacionado só com o aprender uma linguagem de programação. Basta olhar para os aplicativos no celular: o usuário não aceita um produto apenas funcional, ele tem que conversar com humanos, ser ético e bonitinho.
“Não existe um programa de computador sem uma interface, então você tem que trabalhar com designers, com o user experience (UX)”, diz Ricardo Yogui, professor da ESPM e especialista em tecnologia
Mas o que é preciso estudar para ocupar essas vagas? Alguém dedicado à interfaces gráficas – responsável pelo visual e interatividade de apps, sites e softwares -, por exemplo, precisa dominar fundamentos de design, que são teoria das cores, tipografia, composição e layout, e percepção visual de elementos gráficos.
“Existem cursos de design voltados para aplicações de interface e experiência do usuário”, afirma Yogui. “Isso ajudam os profissionais a trabalhar na interação homem-máquina, tornando o produto mais acessível e funcional”.
No fim do dia, o profissional de UX garante um produto bonito e funcional ou, em termos técnicos, que seja responsivo, de design fluido, com elementos reativos e testado em diferentes telas. “Uma interface gráfica bem projetada deve ser tão intuitiva que o usuário não precise de um manual para saber onde estão as funcionalidades”, diz Yogui.
Outra função em destaque são os linguistas. Eles atuam no desenvolvimento de tecnologias que envolvem linguagem humana. Exemplos de ferramentas com muito trabalho de linguagem envolvido não faltam: Google Translate, ChatGPT, Alexa e Siri. Ou seja, para se aventurar nessa área, vai ter de estudar sobre morfologia e sintaxe, semântica e pragmática, fonética e sociolinguística.
E quem coordena tudo isso é o product manager (PM) (gerente de produto, em tradução livre) que, além de ter esse nome pomposo, é reflexo de um fenômeno que atingiu o setor da tecnologia e fez os profissionais da área mudarem de perfil. “Ele precisa saber negociar, articular e trabalhar em equipe e combinar o que chamamos de power skills, que é juntar as hard skills (habilidades técnicas) com as soft skills (habilidades de comportamento)”, diz Yougi.
Em suma, o gerente de produto lidera o ciclo de vida dos produtos e alinha a estratégias da empresa. É justamente esse profissional que liga as equipes de tecnologia, design, marketing e negócios. O primeiro passo é estudar noções de gestão de produto.
Para todos esses casos, sai na frente quem dominar algumas metodologias focadas no aumento do valor do produto. Exemplos: Scrum e Kanaban, o primeiro organiza o trabalho em ciclos curtos e estruturados, enquanto segundo foca na gestão visual e flexível do fluxo de tarefas.
Salários e outras habilidades
E quanto aos salários? O setor paga bem? O Guia de Salários 2025 da consultoria Michael Page mapeou cargos como UX e product manager. Segundo o levantamento, essas posições recebem entre R$ 13 mil e R$ 20 mil em grandes empresas.
Fatores que impulsionam ou abaixam rendimentos estão diretamente ligados à natureza imprevisível da tecnologia.
Luana Castro, gerente-executiva da Michael Page, explica que a valorização desses profissionais aconteceu porque a tecnologia passou a ter importância central nas empresas. “Antes, a tecnologia era uma área de backoffice, que dava suporte ao negócio. Nos últimos anos, com a força da transformação digital, a tecnologia veio para o centro de negócio”, diz.
Mas um ponto importante para quem vai entrar na área, segundo Luana, é desenvolver habilidades para não ficar estagnado em apenas uma função. Isso porque o setor é cíclico, o que implica em escalada de vagas e salários enquanto funções antes essenciais deixam de existir a cada nova invenção.
“Tecnologia vem com um boom e as pessoas correm para se qualificar, quando houve o boom de desenvolvedores, por exemplo, faltou muita gente qualificada e os salários dispararam. Agora já não é bem assim”, afirma. “Hoje, estamos vendo isso com inteligência artificial e segurança da informação. Há muitas vagas, mas faltam profissionais capacitados”.
Não à toa que posições em cloud, inteligência artificial (IA) e análistas de dados aumentaram. De acordo com o Guia Salarial 2025, ao menos quatro dos nove cargos mais relevantes do momento estão ligados à essas áreas. “Hoje, a inteligência artificial e cloud estão no topo da lista de áreas em alta. A análise e interpretação de grandes volumes de dados, junto com IA generativa, são as demandas mais urgentes”, diz Luana.
O setor também se beneficia com a expansão do mercado, principalmente em São Paulo, onde além das gigantes globais da tecnologia, o número de companhias ligadas à área cresceu 60%, segundo dados da Secretaria Municipal da Fazenda de São Paulo.
O fenômeno é dividido e exige profissionais diferentes. Em companhias tradicionais que almejam passar por uma transformação digital, pessoas de perfil que concilie inovação com a capacidade de trabalhar em estruturas maiores. Startups já buscam quem trabalha em várias frentes. Grandes empresas, mesmo as que buscam inovação, têm processos mais bem definidos, o que exige profissionais que consigam navegar nesse tipo de estrutura.
“Hoje, muitas empresas tradicionais têm núcleos internos que operam como startups de tecnologia, exigindo adaptabilidade, pensamento criativo e habilidades de transformação digital similares às que as startups demandam”, afirma Luana.