A Quaresma é o nome que damos ao período sacro litúrgico composto dos 40 dias, em que toda a cristandade celebra e faz memória a todo o sofrimento de Jesus Cristo nos dias que antecederam sua crucificação.
Dizemos que esse período é sacro, pois sua vivência possui ares de sagrado para os cristãos que, durante seu transcurso, evitam o excesso de vários prazeres da carne para entrarem em comunhão com a espiritualidade cristã através do sacrifício. Dizemos que é um período litúrgico exatamente porque suas datas e momentos são amplamente celebrados e refletidos através de celebrações litúrgicas e solenes realizadas nos vários templos cristãos do mundo inteiro.
O sacrifício e a mortificação da carne sempre foram formas práticas e resultantes para se entrar em contato com o espiritual. Na verdade, ao contrário do que pensam as pessoas, não é a dor em si que facilita ao homem se comunicar com o espiritual, mas sim a negação feita à carne através da dor que permite e permitiu aos grandes do passado constatarem que a matéria é ilusória, os luxos, passageiros, a vida física, finita. Dessa forma, não é de se estranhar quando lemos as vidas dos mártires do passado; pessoas que preferiram morrer sentindo dores lancinantes ao invés de negarem a sua fé. Nenhuma dor, tampouco nenhuma alegria, é maior que a certeza, a esperança e a fé daqueles que já puderam sentir a grandiosidade do imaterial. É sempre uma alegria e uma profunda aprendizagem estar perto de pessoas assim; pessoas que se negam, negam suas vidas, para atender às dos outros. Existiram muitos que ficaram superconhecidos, como Chico Xavier por exemplo, mas existem muitos tantos milhares que não são conhecidos pelas grandes massas. Eles estão nas escolas, nas igrejas, nas ruas, nos hospitais, e se doam dentro de suas limitações àqueles cujas limitações são bem mais restritas.
O maior mistério da Quaresma é fazer com que consigamos vivenciar o mistério crístico. O Cristo que figura nas cruzes de ouro que ostentamos em nossos peitos foi homem de verdade, sentiu dores de verdade, lidou com a fome, com a pobreza e com a seca. Embora seus mistérios tenham revolucionado gerações e pessoas, reinos e sociedades, sua realidade foi simples e dolorosa, mas feliz e profunda. Que nesses 40 dias da Quaresma possamos mergulhar no entendimento da Paixão de Cristo. Não é coincidência usarmos o termo paixão para tratarmos da morte de Cristo, pois, na verdade, ele se apaixonou por nós e se entregou por amor, para que sua prática efetiva nos favorecesse um entendimento melhor de sua pregação. Baita amor sem limites e fronteiras. Deixemo-nos apaixonar também…