Um despacho de quarenta páginas, que narra minuciosamente sete casos oriundos do estado de Mato Grosso, envolvendo fases distintas da Operação Ararath e outros inquéritos investigatórios define que seis deles voltem à instância inferior em função dos investigados não possuírem mais a prerrogativa de foro. Três dos quais investigam o ex-senador Blairo Maggi.
O primeiro deles investiga a suspeita de que Maggi no período compreendido entre os anos de 2014 e 2017, com ajuda e participação de terceiros teria praticado diferentes fatos visando à obstrução da investigação criminal desenvolvida no âmbito da Operação Ararath, a fim de que não fossem produzidas provas em seu desfavor no que se refere aos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. A investigação destes fatos baseiam-se nas delações de Gércio Mendonça Junior, Genir Martelli e Silval Barbosa homologados com o Ministério Público Federal em 2013, depois que foram cumpridos mandatos de busca e apreensão ainda na 1a fase da Operação Ararath cujos documentos e títulos implicariam Maggi no sentido de tentar unificar as linhas de defesa e ainda solicitar ao colaborador Gércio Mendonça Junior que “não mencionasse nada a respeito da pessoa de Blairo Maggi em seus depoimentos, com o objetivo claro de blindá-lo de quaisquer acusações” , diz trecho do documento.
Blairo teria ainda tentado “comprar” a retratação de Eder Moraes perante o Ministério Público Estadual em 2014 pelo valor de R$ 6 milhões. Por fim, também se investiga neste mesmo caso, a suposta oferta de vantagens indevidas de Maggi a Silval Barbosa, quando da prisão deste no Centro de Custódia da Capital – que através do então senador em exercício, Cidinho, pediu que ele se abstivesse de dar declarações às autoridades que implicassem a ele próprio e a Blairo Maggi. Este episódio foi narrado pelo próprio Silval em sua delação.
O segundo caso envolvendo o ex-senador também baseia-se nos depoimentos de Gércio Mendonça Júnior e Silval Barbosa e trata da suposta compra da vaga no Tribunal de Contas de Mato Grosso para o então deputado estadual Sergio Ricardo em 2009 – cuja negociação e levantamento de valores acordados teriam sido definidos com anuência do então governador Blairo Maggi – tanto para o feito quanto para os posteriores pagamentos necessários.
O terceiro caso de Maggi remetido a Mato Grosso trata da investigação de prática dos crimes de organização criminosa, lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta de instituição financeira e crimes contra a ordem tributária envolvendo e ex-senador, Silval Barbosa e José Bezerra de Menezes – o Binho – então presidente do Bic Banco. Narra o documento baseado em narrativa do Ministério Público Federal que no período de 2005 e 2014 foram realizados “vários empréstimos perante a instituição financeira Bic Banco com finalidade diversa da contratualmente estipulada, os recursos provenientes dos empréstimos foram utilizados para pagamento de dívidas politicas e eleitorais dos investigados e posteriormente quitadas, de forma dissimulada, com utilização de pessoas jurídicas diversas, ligadas ao grupo politico de Blairo Maggi e Silval Barbosa”.
Ainda segundo o MPF, “foram juntados elementos probatórios que indicam, de forma consistente que, ao menos entre 2009 e 2013, no Estado de Mato Grosso, o grupo político liderado por Blairo Maggi utilizou instituição financeira clandestina operada para efetuar transações fora do alcance dos órgãos de controle e da politica administrativa, tendo por objetivo (i) obtenção de empréstimos vultuosos em condições flexíveis de pagamento; e (ii) interposição de pessoas para ocultar a origem, destino ou natureza dos recursos.”
O documento diz ainda que Blairo Maggi – em seu segundo mandato de governo necessitava cobrir um desfalque financeiro da ordem de R$ 130 milhões deixado em seu primeiro mandato na Secretaria de Infraestrutura e para tanto, seriam realizados empréstimos junto ao Bic Banco – e que em busca e apreensão realizada na residência de Eder Moraes foi encontrada uma Carta de Fiança assinada por Blairo Maggi e dirigida ao Bic Banco da ordem de R$ 5 milhões – como garantia dos supostos empréstimos fraudulentos solicitados pelo referido grupo político.
Os três casos acima mencionados, junto com outros três também relacionados à Operação Ararath foram remetidos na mesma decisão pelo ministro do STF, Luiz Fux, à 1a Instância da Justiça Federal de Mato Grosso.
Sobre o novo entendimento do STF quanto à prerrogativa de função
Conforme decisão do Supremo Tribunal Federal que “modificou o entendimento historicamente adotado por esta Corte Superior quanto a amplitude da competência especial por prerrogativa de função – verificou-se que há investigados nos desdobramentos da Operação Ararath no Supremo Tribunal Federal, que há luz do novo entendimento, não mais gozam da prerrogativa que justificaria o reconhecimento da aludida competência especial, cumpre em atenção à compreensão majoritária adotada nesta Corte Superior quanto às regras de conexão e continência, que se proceda ao devido saneamento e cisão da investigação, sem qualquer prejuízo à validade das decisões já proferidas”, diz trecho do despacho do ministro Luiz Fux.
A nova resolução foi proposta pelo ministro Roberto Barroso e concluída em 03/03/2018 com o seguinte texto:
- “O foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos no exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas…”
- Após o final da instrução processual, com a publicação do despacho de intimação para apresentação de alegações finais, a competência para processar e julgar ações penais não será mais afetada em razão de o agente público vir a ocupar outro cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo.”