O ex-governador Silval Barbosa (PMDB) confessou ter ordenado o pagamento de desapropriação de área de 721 hectares na região do Manso, no valor de R$ 7 milhões, no final de seu mandato, em 2014. De acordo com o político, a intenção era desviar cerca de R$ 1,5 milhão para pagar dívidas.
Silval, no entanto, disse que o ex-secretário-chefe da Casa Civil, Pedro Nadaf, foi quem comandou todo o esquema de desapropriação e desvio de dinheiro. “Pedro Nadaf que conduziu todo esse processo".
A declaração foi dada durante audiência referente a ação penal derivada da 1ª fase da Operação Seven, do Gaeco, que investiga a fraude na compra da área, que, supostamente, já pertencia ao Poder público. O valor pago na compra foi liberado por meio o Instituto de Terras de Mato Grosso (Intermat).
O ex-governador já havia sido interrogado na ação em outubro do ano passado. No entanto, a juíza Selma Arruda, da Vara Contra o Crime Organizado da Capital, determinou novo interrogatório, após Silval adotar uma nova postura defensiva: a de confessar sua participação nos crimes investigados.
Silval, após ser preso preventivamente em setembro de 2015, começou a cumprir prisão domiciliar em junho deste ano.
De acordo com as investigações, no ano de 2002 o empresário Filinto Correa da Costa teria negociado com o Governo do Estado uma área de aproximadamente 3.240 hectares pelo valor de R$ 1,8 milhão.
No entanto, segundo o Gaeco, no ano de 2014, 721 hectares dessa mesma área foram novamente vendidos ao Governo, dessa vez pelo valor de R$ 7 milhões.
Os promotores explicam que, para dar legitimidade à transação, o ex-governador, contrariando dispositivos legais expressos, transformou a unidade de conservação do tipo “Parque Estadual” em unidade de conservação do tipo “Estação Ecológica”. Nesses casos a legislação federal não exige a realização de estudos técnicos ou audiências públicas.
O esquema teria contado com a participação do ex-secretário da Casa Civil, Pedro Nadaf, e do ex-presidente do Intermat, Afonso Dalberto.
De acordo com o Gaeco, não existia orçamento e nem previsão orçamentária para o pagamento do terreno por parte do Intermat. Mas o ex-governador, por meio de decreto em seu último dia de mandato, realizou a suplementação de R$ 7 milhões como se o dinheiro fosse ser utilizado para regularização fundiária. Fato que jamais existiu.
Além de Silval, são réus: o ex-secretário-chefe da Casa Civil, Pedro Nadaf; o ex-secretário adjunto de Administração, José de Jesus Nunes Cordeiro; o ex-presidente do Intermat, Afonso Dalberto; o ex-procurador do Estado, Francisco Lima, o "Chico Lima"; o ex-secretário adjunto de Mudanças Climáticas, Wilson Pinheiro Taques; o ex-secretário de Planejamento, Arnaldo Alves de Souza Neto; o médico Filinto Corrêa da Costa; e os servidores da Secretaria Estadual de Meio Ambiente, Francisval Akerley da Costa e Cláudio Takayuki Shida.
R$ 1,5 milhão
De acordo com Silval, em 2014, ele ainda tinha compromissos financeiros que envolviam dívidas não só de campanhas.
“Quem trouxe esse assunto [área no Manso] até a minha mesa, foi o então secretário, Pedro Nadaf. Nós tínhamos um problema para se resolver. Compromissos financeiros com várias pessoas. Das mais diversas. Pedro já tinha o compromisso de levantar [o dinheiro] onde fosse possível, para resolvermos essa situação”, disse à juíza.
“Quando tomamos a decisão de fazer essa desapropriação, do dr. Filinto [Correa da Costa], Nadaf me relatou: ‘governador, eu tenho na minha mesa a questão da desapropriação de uma área do senhor Filinto. Quem trouxe esse assunto foi o cunhado dele, o procurador Chico Lima’”, completou.
O ex-governador disse que após isso, se reuniu com Nadaf e Chico Lima. Nadaf apresentou como estava a tramitação, até então legal, do processo de desapropriação da área no Executivo estadual.
“Conversando só com o Pedro [Nadaf], ele me disse que dando certo essa desapropriação, iriamos ter o retorno, que o senhor Filinto daria o retorno e que daria para nós cumprimos esses compromissos. O compromisso da época era [de um retorno] de R$ 1,5 milhão.
Pagamento pelo Intermat
Segundo o ex-governador, a intensão inicial era de que o processo de desapropriação fosse feito pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente.
“A principio, quando foi para se fazer a desapropriação, a minha intenção era para ser feito por meio da Sema. No entanto, naquele momento, não deu para fazer. Foi para o Intermat, onde o Afonso [Dalberto, ex-presidente] tocava sem problema algum. A única questão era a orçamentária”, disse.
O peemedebista declarou que se reuniu com Afonso e garantiu que ele daria um jeito para resolver a questão orçamentária do Intermat, o que iria possibilitar o pagamento pela desapropriação.
“Foi marcada uma reunião na Casa Civil. Onde eu me reuni com Pedro [Nadaf], Chico Lima e o Afonso. Falei para o Afonso que isso seria pago por lá [Intermat] e que era para ele ficar tranquilo que eu arrumaria orçamento”, relatou.
“Disse que iria determinar que o secretário de Planejamento providenciasse e remanejasse dentro do excesso [de arrecadação] e faça essa programação”, completou.
Nessa reunião, de acordo com Silval, não foi tratado sobre a distribuição de dinheiro para os membros do esquema, pois Nadaf já teria garantido que trataria sobre este assunto com Afonso.
“Nadaf já havia dito que tinha resolvido com Chico [Lima] a relação do retorno com o proprietário da área. O valor da desapropriação era de R$ 7 milhões. Até então, eu só tinha conhecimento do retorno de R$ 1,5 milhão”, declarou.
Silval disse ainda que se reuniu com o então secretário de Planejamento, Arnaldo Alves, e passou a determinação que fizesse o remanejamento necessário.
“Eu chamei o Arnaldo e disse que o Intermat estava precisando de R$ 7 milhões e pedi que ele providenciasse. O Pedro já havia me passado que [o pagamento] seriam em duas vezes, novembro e dezembro. Ele organizou o orçamento e eu determinei ao Marcel [DE Cursi, ex-Sefaz] que fizesse o planejamento para pagar essas duas parcelas de R$ 3,5 milhões. Foram pagas”, declarou.
“O Pedro Nadaf, depois de providenciar toda essa parte legal, me passou tudo o que tinha resolvido com o Filinto. O Filinto tinha resolvido o problema da nossa conta [dívida]”, completou.
Distribuição do desvio
De acordo com Silval, ele só tomou conhecimento do real valor desviado no esquema, após a deflagração da operação. No Centro de Custódia, o ex-governador se encontrou com Nadaf e conversaram.
“O Pedro afirmava que o doutor Filinto devolveu R$ 3,5 milhões, ele pagou R$1,5 da dívida. E eu acredito que pagou, mesmo, porque as pessoas que ele devia não reclamaram. R$500 mil ficaram com o Pedro, e eu acredito, porque ele falou para mim que iria tirar. E R$500 mil para o Afonso”, disse Silval.
O ex-governador, no entanto, não sabe detalhar com quem ficou com as partes dos R$ 7 milhões do valor da compra do terreno. “O Pedro fala que havia combinado com o Chico era R$3,5 milhões. O doutor Filinto afirma que devolveu R$2,5 milhões, em duas parcelas. Eu vejo que esta muito próximo, se for isso. Se pagou uma conta nossa de R$1,5 milhão, o Pedro mais o Afonso mais R$ 1 milhão, e mais R$ 150 mil [dados a Alan Malouf]. Isso da R$ 2,650 milhões, para chegar R$ 3,5 milhões [falta pouco]”, calculou o ex-governador.
Silval então afirma que o ex-secretário Pedro Nadaf foi quem comandou todo o esquema de desapropriação e desvio de dinheiro. “Pedro Nadaf que conduziu todo esse processo. E o Chico Lima entra ai porque o Pedro era parente dele”, afirmou.
Ele ainda nega que tenha tratado com outras pessoas sobre o processo. “Eu não tratei com mais ninguém, além de Pedro Nadaf, Chico Lima, e o Afonso que eu garanti o orçamento. Atendi, além dessas três pessoas, o filho do doutor Filinto, que é o doutor Celestino”.
À juíza, o ex-governador nega também que o secretário de Planejamento de sua gestão, Arnaldo Alves, e o ex-secretário de fazenda, Marcel de Cursi tenha participação do esquema. “A não ser a determinação que eu dei para ele fazer o esquema, mas ele não sabia que era essa a finalidade”, disse o governador sobre Arnaldo.
R$ 150 mil a Alan Maluf
Em seu depoimento, ele diz que só depois tomou conhecimento que o ex-secretários Pedro Nadaf repassou R$150 mil para o empresário Alan Malouf, por uma dívida nos serviços prestados pelo buffet Leila Maluf em sua posse, em 2011.
“A conta [da festa de posse em 2011] deu em torno de R$1 milhão à época, e ele [Pedro Nadaf] afirma que tinha pago R$ 150 mil. Eu havia determinado a Pedro que ele arrumasse formas e meio de pagar também Alan Malouf esses R$ 150 mil”, disse Silval.
Detalhes do processo de desapropriação e compra
O ex-governador explica que um estudo nas nascentes do Rio Cuiabá, denominado Águas das Nascentes do Rio Cuiabá, foi elaborado ainda no Governo Dante de Oliveira, em 1998, e que a desapropriação seria embasada neste laudo.
“Na época, um estudo foi feito um estudo de toda cabeceira do Rio Cuiabá, não só da área que tinha a pretensão dentro da desapropriação. O estudo foi de uma área de 400 mil hectares. E ficou pronto o estudo de 98 a 2002. E em 2002 saiu o decreto de desapropriação, de 10.600 hectares”, conta.
Pedro Nadaf e Chico Lima teriam ido até o gabinete do governador e explicado que “sobrou” um terreno remanescente após a desapropriação, que seria a área de 721 hectares investigada.
“E eu perguntei a eles: por que desapropriar e transforma em Estação Ecologica? E eles me argumentavam que dentro do parque havia uma série estudos universitários, e a estação é permitido por lei e nós poderíamos fazer. E eles apontavam que estava tudo legal para fazer a desapropriação dessa forma”, esclareceu.
Assim, em 2014 Silval Barbosa emitiu decreta 2595 que criou essa reserva. “Eu fiz em cima das informações que vinham até meu gabinete e eu tinha que confiar”.
O ex-governador negou que havia comprado a área por duas vezes. “Não é a mesma área. É aquela discussão de matrícula 1063 e 1062, que se não me engano já esta definida e pacificada”.
Sobre o valor de R$ 7milhões, pago pela área, Silval garante que foi informado que era o “preço da região”. “Houve um superfaturamento, mas não foi eu que determinei”, declarou.
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