O ministro da Saúde, Ricardo Barros, revogou nesta quarta-feira (26) duas portarias que ele mesmo havia baixado nos últimos dias sobre o tema do atendimento à saúde indígena. A decisão é resultado de pressão de manifestantes em todo o país, que bloqueiam rodovias, realizam passeatas, ocupam núcleos estaduais de saúde e não descartam interditarem agências bancárias.
Os índios protestaram contra mudanças no sistema de gastos da Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena). Na semana passada, o ministro havia baixado uma portaria que, na prática, diminuía o poder de autorização de desembolsos dos 34 Dseis (Distritos Especiais de Saúde Indígena). Se a nova sistemática entrasse em vigor, inúmeros gastos teriam que ser autorizados previamente pelo comando do ministério, em Brasília.
Até então, os gastos mais elevados eram autorizados também por Brasília, mas pela direção da Sesai, e com ordens às vezes pelo telefone, dependendo da urgência do caso. A principal preocupação dos índios e servidores da Sesai era que o novo sistema burocrático deveria impedir ações mais urgentes como, por exemplo, um resgate aéreo a um índio enfermo em regiões mais distantes.
Os indígenas ocuparam nesta quarta-feira (26) prédios da Sesai em pelo menos sete Estados: Roraima, Pará, Mato Grosso, Rondônia, Amazonas, Ceará e Santa Catarina. Também interditaram o tráfego em rodovias, como a BR-163, em Mato Grosso, BR-101, entre João Pessoa (PB) e Natal (RN) e SC-283, em Chapecó (SC).
Cerca de 200 indígenas, de várias etnias, fizeram na tarde de hoje uma passeata no centro de Cuiabá. O número de participantes é dos organizadores do protesto. A concentração teve início às 14h em frente à Praça Alencastro e passeata começou por volta das 16h. O grupo percorreu cerca de dois quilômetros pela avenida Getúlio Vargas, até à sede do Ministério Público Federal (MPF), empunhando cartazes pedindo a revogação da portaria 1907.
A mudança oficializada no dia 17 deste mês vincula o orçamento da Sesai, hoje na casa de R$ 1,4 bilhão, à Secretaria Executiva do Ministério da Saúde. Por força de protesto, o ministro Barros havia publicada uma segunda portaria, na segunda-feira (24), de autorização de administração de R$ 500 mil pelos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (Dseis) que não foi bem recebido por líderes indígenas.
Nós estamos fazendo manifestações em quase todo o país com a participação de todos os povos indígenas, exceto tiveram recém-contato [ com a população urbana], que ainda é perigoso. Já pedimos para o ministro revogar a decisão, e houve um político de Mato Grosso, Valtenir Pereira que entrou em contato conosco e disse que a já conseguiu revogar a decisão, mas isso não aconteceu. Foi só política. Não descartamos ocupar a Transamazônica, a Usina Belo Monte e até mesmo as agências bancárias. Isso ministério não atender nosso pedido a consequência virá”, disse o líder indígena de Belém do Pará, Willian Kariri Xocó.
Revogação
Após uma reunião com indígenas no ministério, Barros assinou o ato que tornou sem efeito a portaria 1907 e também a portaria 2141. Com a revogação das duas portarias, volta a vigorar o sistema anterior, estabelecido por portarias de 2011 e 2013.
O ministro alegava, ao tentar mudar o sistema, uma necessidade de conter gastos. Em áudio gravado na terça-feira (25), ele disse a um grupo de índios que os recursos da Sesai eram mal utilizados. "Eu vou cuidar diretamente do assunto. Tem muita gente na saúde indígena, pouco resultado. A gente podia gastar muito melhor o dinheiro", disse o ministro.
A Sesai tem um orçamento total de R$ 1,43 bilhão para o ano de 2016 e uma previsão orçamentária de R$ 1,45 bilhão para o ano que vem. Boa parte desses recursos é destinada a três organizações não governamentais que são contratadas para ajudar a colocar em prática o sistema de atendimento à saúde, incluindo contratação e gestão de pessoal: Missão Caiuá, com R$ 497 milhões em 2016, IMIP (R$ 132 milhões) e SPDM (R$ 143 milhões). (Com Folha SP)