Há duas semanas, um jantar com pompa e mesa posta na Casa Branca se tornou um dos maiores símbolos da relação das big techs com o governo americano – uma aproximação sem precedentes na história dos EUA. Enquanto anunciavam investimentos, CEOs como Tim Cook, Mark Zuckerberg e Sam Altman elogiavam a liderança de Donald Trump nas questões de inteligência artificial (IA) e, silenciosamente, desejavam que as palavras e os bilhões fossem suficientes para que Trump cessasse o tarifaço e questões regulatórias.
Na mesa, Trump e os populares executivos do Vale do Silício formaram uma espécie de Santa Ceia da tecnologia. O encontro teve alguns minutos registrados, em que o presidente agradeceu a presença dos empresários e confirmou os investimentos que cada empresa estava disposta a fazer nos EUA. Essa relação inédita dos CEOs com a presidência tem um motivo: afagar Trump para que as agendas de cada empresa possam ser levadas em consideração, afirma o professor Mark Lemley, da Faculdade de Direito de Stanford, nos EUA.
“Existe uma ética muito forte de pagar para jogar. Essas empresas também entendem que se beneficiam ao trabalhar com Trump”, explica Lemley, ao Estadão.
Ao todo, mais de US$ 1,5 trilhão em investimentos nos EUA foram prometidos à Trump pelas big techs – para o republicano, as cifras viram uma espécie de vitrine do sucesso de sua administração (mais informações no quadro acima).
O preço alto para sentar ao lado de Trump se justifica. Diante das discussões da União Europeia e de países, como o Brasil, sobre a regulação de IA, as big techs sentem que o escrutínio pode estar chegando ao seu quintal. Votar uma lei que coloque restrições na forma de desenvolver a tecnologia pode custar bilhões para empresas como a Meta e a OpenAI, que têm se destacado com seus chatbots no país.
Regulação
Outro temor é a regulação antitruste, que o Google já enfrentou nos EUA e na Europa. Decisões contra as empresas também rendem multas bilionárias, além de alterar sua estrutura de funcionamento – recentemente, o Google escapou de ter de vender seu navegador Chrome depois de ser condenado como um monopólio de buscas na internet.
Do lado de Donald Trump, as empresas são como peças valiosas em um tabuleiro de xadrez, com as quais ele pode enfrentar globalmente questões como a corrida pela IA e a barganha política com governos que ameacem as redes sociais americanas, por exemplo.
A competição com a China, porém, é o grande combustível para a insistência de Trump no investimento de big techs. O presidente dos EUA já afirmou publicamente, várias vezes, que não pode permitir que a China “vença” a corrida pelo desenvolvimento da IA.
É uma via de mão dupla. Ao mesmo tempo em que está nas mãos das big techs, Trump sabe que, se for preciso, uma ordem presidencial pode resultar em bilhões em multas ou processos para as companhias.