Até 2016, municípios devem matricular todas as crianças de 4 e 5 anos na pré-escola; hoje 18% das crianças estão fora da rede.
Para atender a meta de matricular todas as crianças de 4 e 5 anos na pré-escola até 2016, redes municipais estão transformando vagas de turno integral em cadeiras de turno parcial. Foz do Iguaçu (PR) é uma delas, desde o início deste ano a prefeitura deixou de oferecer matrícula em período integral para crianças nessa idade.
O objetivo é criar rapidamente vagas para suprir a obrigatoriedade até 2016. Em 2013, 71,8% das crianças nessa faixa etária eram atendidas em unidades escolares no município, segundo dados da Pnad. Com a redução dos turnos, a rede passou de 3.200 para 4.888 matrículas na pré-escola – além das cadeiras que serão disponibilizadas em seis novos Centros Municipais de Educação Infantil.
“Conseguimos assim criar vagas para toda a demanda na espera que tínhamos”, conta Fabiana Vilela, diretora de educação infantil da secretaria municipal. A prefeitura está fazendo campanha para que os pais de crianças nessa idade coloquem já seus filhos na escola. “Estimamos que haja ainda uma demanda de cerca de mil alunos, que vão se dividir entre escolas públicas e privadas.”
A manobra não foi bem recebida por pais que trabalham e antes podiam deixar seus filhos sob os cuidados da escola durante todo o período de trabalho, por seis horas ou mais. Segundo o Conselhor Tutelar do município, cerca de 50 reclamações foram feitas neste ano. “Como isso não é ilegal, não podemos fazer nada”, afirma Raphael Pereira, conselheiro de Foz do Iguaçu.
A mudança de turno também deve ser adotada por Blumenau (SC) para atingir sua meta. Em 2014, todas as crianças de 4 e 5 anos matriculadas em escolas do município estudavam em turno integral. A partir do próximo ano, 15% das crianças de 5 anos passarão para o turno parcial.
A medida também visa a criação de vagas sem grande aumento no investimento público. De acordo com a secretaria municipal, desde agosto há 1.200 crianças em idade pré-escolar na fila de espera. A cidade tinha, em 2013, 21,7% de suas crianças entre 4 e 5 anos fora da escola.
1 milhão de vagas precisam ser criadas
As prefeituras correm contra o tempo para cumprir o primeiro prazo do Plano Nacional de Educação, aprovado neste ano. A primeira meta estipula que a partir de 2016 todas as crianças de 4 e 5 anos estejam matriculadas na pré-escola.
Para isso, as redes precisam criar mais de 1 milhão de vagas nessa etapa de ensino. Em 2013, 81,4% das crianças nessa idade frequentavam a escola, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad).
“Essa é uma saída para chegar à meta”, afirma Cleuza Repulho, presidente da União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação. “As prefeituras estão usando uma prerrogativa da lei porque nossa obrigatoriedade é de atendimento e não de atendimento integral”, completa.
Para Alejandra Meraz Velasco, coordenadora do movimento Todos pela Educação, o uso de vagas de turno parcial na educação infantil não é problema, desde que a mudança seja articulada com outras políticas de assistência social.
“É importante ser entendido que na educação tratamos com pessoas. Se a criança já está na escola, na educação integral, mudar para essa criança é complicado. O que é importante é ver se essa é a única possibilidade. A rede tem que tentar articular com outras secretarias, como a de esportes ou assistência social. É importante cuidar da transição dessa criança de um sistema para outro.”
Imediatismo contra meta futura
A solução de reduzir os turnos na educação integral levanta duas questões: uma possível redução da qualidade do ensino e a redução no atendimento em ensino integral, outra meta do Plano Nacional de Educação.
No Rio Grande do Sul, Estado em que 36,2% das crianças nessa faixa etária estavam fora da escola em 2013, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) vem acompanhando a ampliação do ensino infantil de perto.
“Alguns municípios estão muito longe de universalizar a pré-escola, principalmente as médias e grandes cidades. E o que temos visto é que essas cidades não estão se utilizando do Proinfância [programa federal de apoio para construção de unidades] suficientemente para criar as vagas necessárias”, aponta Hilário Royer, auditor público do TCE.
A partir deste ano, seu grupo passará a acompanhar quantas são as vagas de turno integral e turno parcial para que os municípios “não dividam uma vaga para duas crianças”.
“Estamos preocupados que reduza a qualidade da educação. Se você olhar sob a ótica das famílias, quatro horas de turno significa que a criança terá um turno descoberto para os pais que trabalham, que vão acabar deixando essa criança com um vizinho, um irmão”, afirma.
Além disso, o grupo teme que de olho no prazo imediato de universalização das vagas em educação infantil em 2016, os municípios deixem de lado a meta 6 do PNE, que exige que 25% das matrículas da educação básica sejam em turno integral até 2020, aponta Débora Brondani, auditora externa do TCE.
Atraso na construção de unidades escolares atrapalha municípios
Secretária Municipal de Educação de São Bernardo do Campo (na Grande São Paulo), Repulho diz que não usará dessa estratégia em sua cidade, mas sofre com o atraso de obras das unidades escolares do Proinfância, programa federal de apoio a construção de centros de educação infantil. Segundo ela, o município tem oito unidades que começam ou retomam a construção neste mês e, sem atrasos, ficarão prontas em dezembro do próximo ano.
Os números do Programa Nacional de Reestruturação e Aquisição de Equipamentos para a Rede Escolar Pública de Educação Infantil (Proinfância) mostra que, em média, a construção de unidades pelo Proinfância tem demorado 824 dias.
Além de problemas com atraso na obra, 28% das secretarias municipais que partipam do programa relataram ao Tribunal de Contas da União (TCU) que inadequações do projeto dos centros de educação infantil ao local em que são instalados dificultam o início das atividades.
Procurado pela reportagem, o Ministério da Educação não se pronunciou sobre a substituição de vagas integrais por vagas parciais na educação infantil.
Fonte: iG