Com o isolamento social e o avanço da Covid-19, muitos passaram a adiar consultas médicas e tal decisão pode afetar a descoberta e o tratamento de doenças no paciente, consequentemente afetando sua qualidade de vida.
Nesta celebração do Dia Internacional da Mulher (08), a ginecologista Mirian Abreu Macedo, membro da Comissão Nacional Especializada em Ginecologia Oncológica da Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia), concedeu uma entrevista ao Circuito Mato Grosso para explicar pontos significativos da saúde feminina.
Confira:
Circuito Mato Grosso: Qual é a importância de uma mulher ter cuidados frequentes com a própria saúde?
Dra. Mirian Abreu Macedo: Algumas lesões, como no colo do útero ou na mama, e mesmo algumas lesões não tão frequentes, podem ser prevenidas. Às vezes a paciente tem uma lesão, alguma alteração do endométrio, por exemplo, que ainda não é câncer ou é no estágio inicial, e se ela fizer um tratamento precoce, ele não vai evoluir para algo cujo tratamento é mais complicado e mais agressivo. Quando o diagnóstico é feito no início podemos fazer um tratamento mais simples ou menos agressivo para essa mulher. Temos mais garantia de qualidade de vida.
Circuito Mato Grosso: Qual é o maior tabu que a saúde feminina enfrenta?
Dra. Mirian Abreu Macedo: A gente vê muito mais tabu nas pessoas que tem mais de 50 anos, por exemplo. Às vezes uma senhora deixa de ir ao médico porquê tem vergonha de mostrar as partes íntimas, de mostrar as mamas. Quando ela chega ao médico, as vezes já está com uma lesão. Ela poderia ter um momento de cura e as vezes esse momento passou. Então quando a gente tem o habito de ir ao médico e fazer as consultas de rotina, uma vez por ano ou a cada dois anos, a depender da idade mulher e da saúde que mulher tem, temos tempo para o tratamento e conseguir a cura.
Circuito Mato Grosso: Como a pandemia afetou a saúde feminina?
Dra. Mirian Abreu Macedo: Muitas mulheres que já realizavam um acompanhamento ficaram com receio de sair de casa. Algumas tem meios próprios de locomoção, outras dependem dos meios de transporte público e isso trouxe medo das mulheres continuarem indo ao consultório.
Algumas tem medo de frequentar as clínicas, para fazer a mamografia, por exemplo, e elas adiam aquele exame, naquele momento. Muitas adiam para o outro ano ou dali alguns meses. Com isso, elas podem perder o momento de fazer o tratamento no tempo certo, então traz muito impacto na qualidade de vida, no momento de cura dessas mulheres. Infelizmente estamos vivendo isso.
Circuito Mato Grosso: Como está funcionando os atendimento às mulheres nessa pandemia?
Dra. Mirian Abreu Macedo: Nos consultórios particulares, os médicos, ainda que tenham aumentado o intervalo entre um paciente e outro, continuam mantendo o teleatendimento, podem tirar dúvidas, tem a telemedicina e a possibilidade de fazer o atendimento dessas pacientes. Infelizmente da rede pública isso é um pouco mais difícil. Mesmo os postos de saúde, as unidades básicas de saúde, estão muito voltadas para o atendimento dos pacientes da Covid-19. Ficou um pouco mais difícil das pacientes conseguirem, atendimento, realizarem o preventivo e o pré-natal, por exemplo. Então as pacientes estão sendo atendidas sim, mas existe essa concorrência, essa necessidade de atender pacientes com Covid-19 e gestantes.
Circuito Mato Grosso: Quais são as maiores dificuldades que uma mulher enfrenta quando o assunto é anticoncepção?
Dra. Mirian Abreu Macedo: Talvez a própria busca da mulher de ter mais esclarecimento a esse respeito, por outro lado, em alguns lugares, talvez seja um pouco difícil ela conseguir esses métodos contraceptivos. O governo, como um todo, procura fornecer alguns métodos contraceptivos de baixo custo, como o fornecimento de alguns anticoncepcionais ao custo de R$1 na Farmácia Popular, o DIU, que dura até 10 anos, acessível nos postos de saúde. Acredito que o mais difícil mesmo é a falta de esclarecimento que esses métodos existem, talvez esteja faltando divulgação.
Circuito Mato Grosso: Quais são as doenças que mais atingem as mulheres e as formas de prevenção e cuidado?
Dra. Mirian Abreu Macedo: Tem várias doenças que dependem, também, da idade da mulher. Entre as jovens, vamos dizer até os 25 anos, nos preocupamos muito com as doenças de transmissão sexual, porquê a troca de parceiros é mais frequente e aumenta a incidência de doenças como clamídia, gonococos (gonorreia), as doenças inflamatórias pélvicas, que trazem consequências pra a vida futura, como a infertilidade, como a aquisição do HPV e posteriormente até o surgimento de lesões pré-malignas no colo do útero.
As mulheres entre 40 e 50 anos a gente começa a se preocupar com o câncer de mama. Para mulheres acima dessa faixa etária, além do câncer de mama, a gente pode se preocupar com câncer de ovário e de endométrio. Mulheres dessa faixa etária também devem se preocupar com o câncer de intestino, por exemplo.
Tem doenças que não são próprias de mulheres, afetam a população em geral, mas precisamos pensar na mulher como um todo. Como uma pessoa que pode ter patologias além das ginecológicas.
Circuito Mato Grosso: Qual é a melhor idade para que a mulher/menina passe a ir em um ginecologista?
Dra. Mirian Abreu Macedo: Se a jovem não tem nenhuma patologia, ela pode fazer uma consulta para aprender alguma coisa sobre o seu corpo, assim que ela menstruar. Ela pode saber se está se desenvolvendo normalmente, se as mamas estão se desenvolvendo normalmente, se o fluxo menstrual está adequado, para poder entender como funciona o ciclo menstrual.
Se ela deseja começar a ter a vida sexual é bom ir antes ao médico, dizer que precisa de um método contraceptivo e que quer saber como se cuidar para não ter doenças sexualmente transmissíveis. Isso vai depender do momento em que ela decidir ter relações sexuais.
A partir desse momento ela pode começar a ir ao ginecologista, porque ela vai começar a precisar a fazer os exames preventivos.
Circuito Mato Grosso: Qual é a importância e o diferencial da ginecologia infanto puberal?
Dra. Mirian Abreu Macedo: Algumas meninas apresentam algumas peculiaridades, que pode ser uma patologia, alguma dificuldade de desenvolvimento, as vezes as mamas crescem de forma assimétrica, as vezes demora a desenvolver, demora para menstruar, mas não é necessariamente uma doença, mas precisa de uma atenção para ver se não desenvolve uma característica que precisa de mais cuidado.
Por outro lado, as meninas podem se sentir constrangidas, porquê são jovens, e para não ir em um ginecologista geral, como é o costume, podem se sentir mais acolhidas por um médico infanto puberal.