Por Josiane Dalmagro e Ulisses Lálio
Nas últimas semanas a polêmica acerca das novas regras que deverão nortear as empresas de internet fixa têm gerado preocupação e inconformismo por parte dos usuários e clientes dos serviços de banda larga fixa. Isso porque a empresa Vivo (que se uniu à GVT) anunciou, em fevereiro, que passaria a limitar o tráfego de dados fornecidos aos novos contratados. Atualmente o usuário paga pela velocidade contratada e não pela franquia – como é o caso da internet móvel nos celulares.
A medida chegou com um efeito bomba nos usuários da rede – e várias organizações e ações começaram a ser tomadas no sentido de tentar barrar a proposta da Vivo. A pressão chegou ao Palácio do Planalto e fez com que o governo federal se posicionasse. No dia 19 desse mês a União prometeu que exigiria das operadoras de internet de banda larga, a venda do serviço sem limitação de consumo. Para tanto, seria preciso elaborar um termo de compromisso que será apresentado às empresas.
Entre as medidas pedidas pelo Governo está a exigência da venda de pacotes ilimitados; a garantia de que contratos com usuários não serão modificados –a operadora não pode quebrar os contratos existentes, apenas novas adesões podem ter a limitação–; e o desenvolvimento de uma ferramenta que mostre ao usuário o seu perfil de consumo, o volume de dados consumidos durante o mês e a proximidade com o esgotamento do plano.
Todavia esses compromissos poderiam não impedir que as empresas vendam pacotes no modelo de franquias, como acontece com os telefones móveis. O termo estava previsto para ficar pronto na quarta-feira (20), com exigências às empresas e recomendações à Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), órgão que regula o setor.
Com a pressão de vários setores, ativistas digitais, entidades de classe e até mesmo setores do governo e a presidenta Dilma Rousseff – que se mostrou contrária à medida – a Anatel decidiu, na sexta-feira (22), proibir a adoção dessa prática pelas operadoras de internet banda larga por tempo indeterminado, ao contrário da decisão anterior, de que a proibia às operadoras de realizar a cobrança pelo prazo de 90 dias.
Quando a bomba da cobrança explodiu, o ministro das Comunicações, André Figueiredo, afirmou que o governo entrou na briga para que a internet ilimitada continuasse e afirmou que exigiria que as empresas assinassem um termo de compromisso. "Conversamos com a operadora [Vivo] e ela aceitou o pedido para continuar vendendo o plano ilimitado”, disse ele, afirmando que também haveria orientação à Anatel na questão, que deveria acolher as recomendações, como o foi feito.
Ameaça iminente
O despacho da Superintendência de Relações com os Consumidores da Anatel, publicado na edição do dia 18 de abril, do "Diário Oficial da União", determinou que as empresas de telefonia não podem reduzir a velocidade, suspender o serviço ou fazer cobrança de tráfego excedente após o esgotamento da franquia – mesmo se isso estiver previsto em contrato – até que cumpram as condições estabelecidas pela agência reguladora.
Ante de voltar atrás e proibir por tempo indeterminado a limitação da internet fixa no Brasil, a Anatel havia dado definições de quais condições seriam adotadas para o controle do tráfego de dados.
Entre as condições definidas pela Anatel estava a comprovação, por parte da operadora, de que disponibilizou aos clientes ferramentas que permitam o acompanhamento do consumo do serviço, o histórico da utilização e a notificação quanto à proximidade do esgotamento da franquia, além da possibilidade de comparar preços.
Também seria necessário, segundo a Anatel, que a operadora deixasse explícito em sua oferta e nas publicidades a existência e o volume de eventual franquia nos mesmos termos e com mesmo destaque dado aos demais elementos essenciais da oferta, como a velocidade de conexão e o preço.
As operadoras deveriam comprovar à Anatel que aderiram as medidas. Em seguida, a Agência deveria publicar um ato reconhecendo o cumprimento das condições. Só depois de 90 dias desse ato é que as empresas poderiam restringir o serviço de internet fixa (suspender ou reduzir o sinal), nos casos de contratos por franquia.
“Adeus Netflix e Youtube”
As mudanças funcionariam da seguinte forma: com a franquia menor, o pacote de internet poderia terminar depois que usuário assistisse a cerca de 10 vídeos no Youtube ou 10 episódios de alguma série em um serviço de streaming, como o Netflix. Depois que o consumidor atinge o limite da franquia, a internet é cortada ou diminui drasticamente sua velocidade até o mês seguinte.
Assistir a um filme ou série no Netflix gasta cerca de 1 Gbyte de dados por hora, com definição de vídeo padrão, ou até 3 Gbytes por hora em alta definição. Enquanto que os planos de franquias vão variar entre 10 a 130 Gbyte.
Respostas dos usuários
O anúncio da Vivo teve efeitos imediatos no mercado: associações de defesa do consumidor manifestaram-se contra a prática, que gerou reações também de organizações da sociedade civil, além de campanhas nas redes sociais. Uma petição online no site da Avaaz contra o limite na franquia de dados da banda larga fixa ganhou milhares de assinaturas e a página do Movimento Internet Sem Limites já alcançou mais de 470 mil seguidores em sua página do Facebook.
Por nota, o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) disse que o novo modelo de pacote de dados tem sido adotado principalmente pela Vivo, mas o temor é que ela seja seguida por outras operadoras. "As principais empresas do setor de telecomunicações e banda larga passaram a criar novos pacotes, novos planos para os seus usuários, com franquias de dados muito menores, especialmente a Vivo", aponta Rafael Zanatta, pesquisador em telecomunicações do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec).
A Proteste (Associação de Consumidores) também lançou uma petição online contra o limite de uso de dados de internet dos serviços de banda larga fixa. Também no Facebook, o grupo “Cancelaço – Internet Fixa” está ganhando cada vez mais adeptos, com o objetivo de realizar um grande boicote às operadoras, caso permaneçam com a medida.
“Caso as operadoras de telefonia fixa não voltem atrás na imposição do limite de tráfego para banda larga, iremos todos cancelar os serviços contratados”, diz a descrição de um evento no grupo, que já conta com mais de 71 mil interessados e 64 mil confirmados. “Sem clientes, como vocês poderão nos extorquir?”
Quem pode ser afetado?
A Vivo afirmou que os usuários ADSL (antigo Speedy) que compraram o pacote até o dia 4 de fevereiro deste ano terão seus contratos mantidos e aqueles que adquiriram o plano a partir do dia 5 do mesmo mês estão sujeitos ao novo contrato. Já para os usuários GVT e Vivo fibra, os contratos serão mantidos para quem aderiu até o dia 1° de fevereiro deste ano.
Isso se as empresas não cumprirem as ordens da Anatel e mantiverem a limitação a qual foi anunciada.
Nesse caso, a empresa garantirá ao cliente ferramentas para medir seu consumo mensal e assim encontrar o plano mais adequado ao seu perfil de consumo. Por fim, afirma que os consumidores vão continuar podendo optar pelos planos ilimitados.
Para quem está sujeito ao novo contrato a empresa disse prometer a manutenção do serviço de internet sem bloqueio, mesmo após o término da franquia de dados contratada em condição promocional até o dia até 31 de dezembro.
"À medida que isto vier a ocorrer no futuro, a empresa fará um trabalho prévio educativo, por meio de ferramentas adequadas, para que o cliente possa aferir o seu consumo", diz a nota.
“Este é o início do fim da internet sem limites”, diz presidente da Anatel (poe a foto perto desse pedaço ok)
A controvérsia ganhou força na segunda-feira (18), após João Rezende, presidente da Anatel, afirmar que a era da internet ilimitada havia acabado. Antes, no mesmo dia, a Anatel publicou uma medida cautelar exigindo das companhias que pretendem vender os planos com franquias um plano de comunicação para que os usuários sejam alertados das mudanças e das ferramentas disponíveis para o acompanhamento do consumo.
Apenas 90 dias após a aprovação do plano pela Anatel é que as empresas poderiam aplicar a suspensão do serviço ou a redução da velocidade de conexão quando o pacote de dados acabar. A medida foi entendida por entidades de defesa do consumidor como a criação de uma brecha para que as empresas pudessem migrar para o modelo de franquias.
Na ocasião João Rezende afirmou que a demanda por serviço de internet fixa cresceu muito no Brasil e, por isso, "é evidente que em algum momento iria surgir esse modelo de negócios", em que operadoras passam a impor limite ao acesso dos clientes à internet, "aconteceria."
O fato é que, a pressão popular foi intensa e não teve como a Agência Reguladora manter esse posicionamento, voltando atrás na decisão, por tempo indeterminado.
No discurso anterior, o presidente da Anatel disse que o movimento para o controle estava ocorrendo por conta da limitação da infraestrutura e seria parecido com o que já ocorreu com os serviços de voz e internet para celulares, cujos planos já trazem limites para o uso. "Eu acho que temos um crescimento fortíssimo na internet. A gente percebe que o avanço é progressivamente alto. É evidente que em algum momento esse modelo de negócio, assim como aconteceu com serviço ilimitado em voz, aconteceria. Isso é uma questão importante. Agora, nós também vamos respeitar o modelo de negócio. Se alguma operadora quiser oferecer internet ilimitada, depois evidentemente não corta o usuário. Se quiser falar 'eu vou oferecer pacote ilimitado', aí ele vai ver até onde ele vai suportar esse modelo de negócio. O que estamos dizendo é: em toda mudança o usuário tem que ter o ferramental para acompanhar o consumo."
Dito pelo não dito, na guerra contra o limite de tráfego de dados o consumidor venceu essa batalha, mostrando a força popular.
Procons como grande aliado
Por nota, a Associação Brasileira de Procons – Procons Brasil, solicitou à Anatel que antes da tomada de decisão final pela Agência, os órgãos de proteção ao consumidor sejam consultados.
Além disso, disseram que é fundamental a realização de discussão pública acerca da revisão das portarias e as resoluções – coisa que até então não ocorreu. Reafirmaram que a Agência não poderia dar guarida às pretensões comercias abusivas por parte das operadoras de telefonia e que qualquer autorização e permissão da Anatel – em desacordo com a legislação – seriam consideradas nulas e inaplicáveis pelo Sistema Nacional de Defesa do Consumidor;
Por fim, reiterou que mais de 800 Procons de todo o Brasil se colocaram ao lado dos consumidores brasileiros, pelo fiel cumprimento da legislação federal vigente, sendo, portanto, contrários a qualquer limitação de uso da internet banda larga fixa, mesmo que autorizadas por resoluções e portarias infra legais.