A coleta dos dados sobre o acidente aéreo que matou o ex-candidato à Presidência da República Eduardo Campos em agosto do ano passado mostrou que os pilotos realizaram um trajeto diferente do oficialmente previsto para realizar o pouso, informaram durante apresentação realizada nesta segunda-feira (26), em Brasília, oficiais do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa).
Tanto na descida inicial para a pista da Base Aérea de Santos, quanto na arremetida (quando o avião sobe de volta no momento em que não consegue aterrissar na primeira vez), os radares captaram um percurso diferente do recomendado no mapa. Durante esse trajeto, a tripulação também não informou precisamente os locais por onde passava nos momentos em que isso é exigido.
Segundo o tenente-coronel Raul de Souza, o piloto fez trajeto "diferente" do previsto na carta. "A gente não pode concluir que ele tenha feito um atalho. Ele fez um procedimento diferente do que estava previsto", afirmou (veja na imagem acima).
A comparação entre o trajeto recomendado e o efetivamente realizado pela aeronave mostra que os pilotos “encurtaram” o pouso. Em vez de fazer um caminho dando uma volta no formato de um 8, eles tomaram uma rota manobrando à direita para descer o jato.
“O comum é seguir [a rota]. Está previsto em regulamento”, declarou o chefe da Cenipa, Dilton José Schuck.
Os responsáveis pela análise, porém, disseram que ainda não é possível concluir se esse fator contribuiu para o acidente nem se houve erro dos pilotos.
Essa avaliação ainda será feita pelos técnicos da Cenipa, que não têm como atribuição apontar causas do acidente, mas fazer recomendações para evitar novas ocorrências e situações de risco.
No último dia 16, o jornal "O Estado de S. Paulo" afirmou que o acidente teria sido motivado por uma sequência de erros do piloto. "A gente não pode afirmar que houve falha humana ainda", afirmou o tenente-coronel Raul de Souza.
"Ainda estamos entrando nessa fase de análise para chegarmos às conclusões. Nós ainda vamos interpretar esses dados para a gente chegar ao momento em que a gente diga: 'sim, isso contribuiu" ou 'não, isso não contribuiu'", afirmou o chefe do Cenipa, brigadeiro-do-ar Dilton José Shuck.
Habilitação
De acordo com os documentos da tripulação, tanto o piloto, Marcos Martins, quanto o copiloto, Geraldo Magela Barbosa, tinham habilitação para voar em modelos anteriores (Cessna C560 Encore ou C560 Encore+), e não no modelo utilizado (um Cessna C560XLS+), mais moderno.
Para chegar à habilitação do modelo utilizado, o piloto deveria passar por um novo treinamento e o copiloto, por um curso completo sobre a nova aeronave. A distinção entre as habilitações para as diferentes aeronaves, no entanto, foi definida pela Anac pouco mais de um mês antes do acidente, no dia 3 de julho.
Questionado se isso desqualificava os pilotos para operar o avião, o major Carlos Henrique Baldin disse que não.
“Para nós do Cenipa, o mais importante é saber se estavam em condições de treinamento e qualificação compatíveis com aquele equipamento e com as condições de meteorologia. A questão de estar habilitado formalmente ou não não é tão importante assim, é questão mais administrativa. Tem que perguntar à Anac [Agência Nacional de Aviação Civil] para saber, por que [a norma sobre habilitações] estava em transição. Habilitação é questão administrativa que a Anac tem que ver”, respondeu.
Anac
Em nota divulgada à imprensa após a apresentação da Cenipa, a Anac informou que piloto e copiloto tinham habitação válida para “operar todas as aeronaves desta família para as quais eles estivessem treinados”, o que inclui os três modelos do Cessna.
Segundo a assessoria de imprensa do órgão, somente no momento da renovação da habilitação, eles teriam que comprovar ter realizado um treinamento adicional para poderem continuar voando no modelo XLS+.
“O piloto e o copiloto estavam aptos e em situação regular para voar”, informou ao G1 a assessoria da Anac. Os registros do órgão mostram que, antes do acidente, o piloto Marcos Martins já havia realizado mais de 90 voos no modelo que caiu. A Anac ainda esclareceu que a norma que detalhou os tipos de habilitação para os modelos do Cessna foi feita para tornar o processo “ainda mais específico e completo”.
Condições técnicas
Durante a apresentação, o coordenador da investigação, tenente-coronel Raul de Souza, disse que as condições do avião e do clima eram suficientes para realizar um pouso seguro.
“Os motores funcionavam perfeitamente na hora do impacto e com potência”, afirmou. Além disso, não houve colisão com Vants (veículos aéreos não tripulados) nem com pássaros.
“Até agora a coleta de dados não identificou nenhuma falha técnica da aeronave. Com relação a falha humana, a gente não pode afirmar que houve falha humana ainda. Isso é a próxima fase da análise”, declarou o major Carlos Henrique Baldin, que também participa da investigação.
Familiares e partido
Após a exposição dos oficiais da Aeronáutica, o advogado da família de Eduardo Campos, José Henrique Wanderley Filho, divulgou nota na qual afirma que os parentes somente se pronunciarão após a conclusão das investigações.
O irmão do ex-governador, Antonio Campos, também divulgou nota com teor semelhante: "Após a divulgação oficial das conclusões dos inquéritos civil e criminal, que ainda não ocorreu, e, após acesso completo ao relatório e das investigações do Cenipa, divulgadas hoje, irei me pronunciar sobre as causas do acidente que vitimou meu irmão Eduardo Campos".
O PSB, partido de Campos, afirmou em nota que também aguarda o fim da investigação. "A Direção Nacional do PSB informa ainda que não fará qualquer pronunciamento sobre notícias que tenham sido ou venham a ser veiculadas trazendo supostas conclusões ou mesmo análises parciais dos fatos, aguardando a divulgação dos laudos oficiais pelas instituições encarregadas das apurações."
Nota da Anac
Leia abaixo íntegra da nota da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) sobre as investigações do acidente que matou Eduardo Campos.
Informações sobre investigação do PR-AFA
Brasília, 26 de janeiro de 2015 – A respeito das informações preliminares apresentadas pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) sobre a investigação do acidente com a aeronave de matrícula PR-AFA na tarde desta segunda-feira (26/01), a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) informa que continua acompanhando o andamento dos trabalhos realizados pelo órgão, inclusive como membro do grupo de investigação do acidente, e se coloca à disposição para auxiliar nas atividades em curso.
Pilotos
Sobre o piloto em comando e o copiloto, a ANAC informa que os profissionais estavam com licença e habilitação C560 válidas no momento do acidente, o que permitiria operar todas as aeronaves desta família para as quais eles estivessem treinados. O regulamento da ANAC prevê o treinamento de diferença específico para que seja permitido transitar entre os diferentes modelos de aeronaves, tais como a transição entre os modelos XLS e XLS+.
Segundo os registros de voo verificados pela ANAC por meio do Sistema Decolagem Certa, o comandante Marcos Martins havia realizado mais de 90 voos no modelo da aeronave C560XLS+.
Instrução Suplementar
A Instrução Suplementar IS 61-004, publicada pela ANAC em 03 em julho de 2014, definiu novos procedimentos sobre o tipo de registro a ser demonstrado pelo piloto em relação à habilitação necessária para operar cada modelo de aeronave, tornando o processo de habilitação de pilotos ainda mais específico e completo.
Segundo a IS, é necessário o registro de treinamento específico, junto à ANAC, para operação de cada modelo de avião. Essa adequação deve ser feita, para os casos de habilitações já emitidas, no momento de renovação da habilitação.
Recomendação do Cenipa
A ANAC também esclarece que aguarda o recebimento dos estudos técnicos que embasaram a recomendação emitida pelo Cenipa em 28/11/2014 e informa que segue zelando pelo fiel e correto cumprimento da Instrução Suplementar (IS) 61-004 que trata do registro a ser demonstrado pelo piloto em relação às habilitações necessárias para operação em cada modelo de avião, emitida em data anterior ao recebimento da recomendação.
Assessoria de Comunicação da ANAC
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Fonte: G1