Ao pedir autorização do Superior Tribunal e Justiça (STJ) para fazer buscas contra o governador do Acre, Gladson Cameli (PP), na Operação Ptolomeu, a Polícia Federal levantou suspeitas sobre o uso de agentes das Forças de Segurança para movimentar valores em espécie com origem supostamente irregular. A investigação, aberta em julho, identificou duas ocasiões em que policiais militares foram encarregados do transporte de dinheiro vivo, o que para a PF é indicativo de um modus operandi.
"Causa extrema inquietação que o chefe do Poder Executivo estadual esteja instrumentalizando agentes armados do Estado para fins pessoais", afirma a Polícia Federal. "Ao contrário da maioria da população comum que evita circular com quaisquer valores em espécie, face aos riscos de tornar-se vítima de crimes patrimoniais; aparentemente, o governador Gladson Cameli utiliza recursos humanos e materiais do próprio Estado para esta finalidade", diz outro trecho do documento.
O primeiro episódio, que acendeu o alerta nos investigadores, aconteceu em fevereiro de 2020, no segundo ano de mandato do governador. De acordo com o documento, um policial militar esteve em uma agência bancária com R$ 160 mil em espécie para pagar boletos do cartão de crédito de Cameli. A própria instituição financeira comunicou o fato às autoridades.
No segundo caso, em fevereiro de 2021, outro PM esteve em uma concessionária para recolher R$ 70 mil em dinheiro vivo que, segundo a PF, teriam "sobrado" de uma negociação "aparentemente fraudulenta". A compra de veículos de luxo subfaturados é apontada na investigação como uma das estratégias possivelmente usadas pelo governador para lavar dinheiro. Em 2018, quando concorreu ao cargo, Cameli declarou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) R$ 202 mil em automóveis. O patrimônio aumentou mais de 800% desde então, chegando a mais de R$ 1,6 milhão, mostram os cálculos da Polícia Federal.
O governador é investigado desde julho pela Polícia Federal, que vê indícios de um suposto esquema de propinas em troca do direcionamento de licitações, contratações superfaturadas e a confirmação de recebimento de mercadorias não entregues e de serviços não prestados na área da Saúde e em obras públicas.
Um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), que deu o pontapé na investigação, apontou vinte comunicações de movimentações financeiras suspeitas envolvendo o governador, no valor de mais de R$ 828 milhões. O documento mostra ainda, entre janeiro e agosto de 2019, o pai dele, Eládio Cameli, movimentou R$ 420,4 milhões em uma conta bancária.
Defesa
A reportagem procurou os advogados Ticiano Figueiredo e Pedro Ivo Velloso, que defendem o governador, que se manifestaram sobre o assunto.
"A investigação é um emaranhado de assuntos desconexos. De um lado, tentam, em vão, criar um vínculo espúrio entre o governador e contratações lícitas realizadas pelo Estado. De outro lado, esmeram-se em levantar suspeitas sobre as finanças do governador. Apenas suspeitas são lançadas, nenhuma imputação de crime é realizada. São apenas ilações desconexas que, com o devido respeito, não poderiam justificar a realização de medidas invasivas como a busca e apreensão e o bloqueio de bens.
Todas as suas movimentações financeiras são lícitas e o seu patrimônio tem origem conhecida, seja no âmbito privado, seja na renda auferida em razão das funções públicas ocupadas.
Em razão disso, a defesa do Governador Gladson Cameli irá apresentar o recurso cabível e confia que a decisão será objeto de revisão. Apesar de discordar veementemente do que consta na investigação, a defesa vem expressar que confia plenamente no Poder Judiciário e nas instituições republicanas."