Um painel de Di Cavalcanti (1897-1976) tombado como patrimônio histórico da cidade de São Paulo foi pichado na noite do último sábado, durante a Virada Cultural. O painel ornamenta a fachada de um prédio comercial de 1955 projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer, a 200 metros da sede da Secretaria da Segurança Pública, no centro de São Paulo.
Os dois pichadores fugiram e a pichação será retirada com solvente, como já ocorreu outras vezes, segundo o zelador do edifício. Flagrado por câmeras de segurança, o caso ainda não foi denunciado à polícia.
Feito com pastilhas de vidro, o painel retrata operários com suas ferramentas e fica no Edifício Triângulo, um dos cinco paulistanos projetados por Niemeyer (os demais são Copan, Califórnia, Montreal e Eiffel). O prédio tem 18 andares e fica na Rua José Bonifácio, que forma um triângulo com as Ruas Direita e Quintino Bocaiuva. O prédio tem 72 escritórios e um único morador: o zelador Everaldo Batista dos Santos, de 54 anos, que trabalha e mora lá há 27 anos.
“No dia em que vim fazer a entrevista de emprego, cheguei preocupado e nem olhei para a fachada do prédio. Ao sair, vi o painel e fiquei tão curioso que voltei e perguntei se era autêntico. Achei que fosse uma cópia, mas descobri que era uma obra do Di Cavalcanti mesmo”, relembra o zelador. “Já naquela época estava em más condições, então perguntei o que havia acontecido e me contaram que, anos antes, moradores de rua tinham feito uma fogueira, que acabou queimando parte do painel. As pastilhas de vidro atingidas foram trocadas por pastilhas de cerâmica, por isso uma parte do painel é diferente da outra”, diz. Embora deteriorado, o painel foi tombado em 2004 pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo.
Ao longo dos 27 anos no prédio, o painel foi pichado dez vezes, contabiliza Santos. Desta vez a pichação ocorreu pouco antes das 22h45 do sábado. O vídeo mostra dois rapazes se revezando para pichar a obra com uma lata de tinta spray.
DEVERIAM TER ORGULHO
“Essa é a quarta vez que picham durante a Virada Cultural (na 20ª edição em 2025). Já na segunda edição (2006) picharam”, relembra. Em nenhuma das ocasiões foi contratada uma empresa para limpar o painel.
“Cheguei a procurar uma empresa, mas vi que os funcionários usavam o mesmo produto que eu, então não compensava. O faxineiro tira, devagar. Claro que sempre ficam algumas marcas, mas é um problema de consciência: as pessoas deveriam ter orgulho do painel e jamais vandalizá-lo.”
Segundo o zelador, em duas ocasiões as pichações foram relatadas à polícia, que não identificou nenhum autor. “Desta vez eu pensei em fazer boletim de ocorrência, mas o síndico disse que fará”, diz. Santos revela um sonho: ver o painel restaurado, com pastilhas idênticas às usadas na versão original. “Ainda vou ver isso.”