A economia mato-grossense depende muito do apetite chinês, mas até que ponto essa relação pode se estreitar até que a China nos engula? O país asiático é o principal importador de soja de Mato Grosso, sendo responsável pela compra de mais de 50% da produção do estado e aos poucos vem aumentando seu controle na economia da região, adquirindo empresas no setor de soja e pressionando para a construção de obras de escoamento de produção.
A troca comercial entre os dois países vem de longa data e o Brasil se beneficia diretamente do crescimento e fortalecimento da economia chinesa, no entanto, este vínculo comercial tem que ser mantido de maneira saudável para que seja lucrativo para ambos os países. Em caso de dominação, dependência ou quebra desse relacionamento o maior prejudicado é o Brasil e por consequência, Mato Grosso.
Segundo o cientista político João Edson, “esta relação é boa até meia noite, nós precisamos tomar certo cuidado. Precisamos deles para abrir vias de transporte, para logística, para uma série de coisas, mas nós não precisamos deles para adquirir nossos meios de produção. Ou seja, precisamos ter a indústria para vender produtos in natura e manufaturados que cheguem até eles, mas nós não precisamos que eles mesmos venham montar as indústrias aqui, comprar nossa matéria prima, industrializar e exportar”.
Em abril deste ano um acordo entre a trading e processadora de grãos brasileira Fiagril e as companhias chinesas Hunan Dakang e sua controladora Pengxin marcou o avanço dos chineses no mercado de soja de Mato Grosso. Trata-se da maior aquisição de um empreendimento agrícola brasileiro por uma firma chinesa. A Fiagril optou por não divulgar valores e a fatia da empresa que foi adquirida, mas segundo a agência de notícias Reuters, as companhias chinesas compraram 57% das ações por cerca de R$ 1 bilhão de reais.
O economista Antônio Cesar Santos, especialista em agronegócio, faz coro com João Edson e explica que é uma pena a internacionalização dos setores de produção. “Ao transferir a propriedade dessas empresas você está desnacionalizando o setor. Como a gente já tem a presença dominante de capital estrangeiro nas indústrias, isso implica em uma futura transmissão de renda para fora, que poderia ficar no estado, no país, liberando mais emprego e renda”, explicou.
A compra da Fiagril é um sinal da entrada chinesa no mercado de soja brasileiro, que já vem acontecendo há algum tempo. Em 2014, a Cofco, maior empresa de alimentos da China, conseguiu acesso a ativos de soja no Brasil ao adquirir o controle da trading holandesa de grãos Nidera e da divisão agrícola da Noble Group.
Além do perigo do domínio chinês sobre o mercado mato-grossense, a dependência do gigante asiático também pode causar futuros prejuízos ao estado, já que segundo Antônio Cesar Santos, o Brasil é mais dependente da China do que ao contrário. “Eles podem desenvolver em outros lugares do mundo como África e a própria América Latina e deixar de comprar aqui e isso inviabiliza o estado de Mato Grosso. A soja que a China compra não tem outro comprador no mundo, então nós não vamos exportar pra outro, não é possível substituir o comprador”, declarou Antônio.
A relação econômica entre estes dois países é tão complicada, que ao mesmo tempo em que o estado não pode ser dominado pelas empresas chinesas e deve evitar a dependência exclusiva com a China, a quebra da relação econômica também traz prejuízos imensos.
A suspensão dessa troca econômica entre a China e Brasil prejudica direta e fortemente Mato Grosso. Antônio vê sinal dessa possível ruptura em um novo governo. “Eu tenho certa preocupação com o futuro de Mato Grosso, em função da conjuntura econômica e política que o País está vivendo. Mato Grosso é dependente do comércio com a China, cerca de 52% da produção de soja do estado é adquirida pelas empresas chinesas e, na medida em que a presença chinesa possa ser hostilizada em função da mudança política no País, pode ser que no futuro eles venham a transferir o local de aquisição dos produtos primários deles, principalmente soja”.
O economista vê a ascensão do vice-presidente Michel Temer (PMDB) como um possível rompimento com o BRICS, uma aliança política e econômica entre Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Logo, o rompimento do vínculo econômico entre Brasil e China. Para Antônio, “A queda do governo suscita essa possibilidade, porque está circulando na opinião pública internacional a associação que o Brasil sofre em função do BRICS, que seria uma das razões das insatisfações, das pressões que o governo federal tem sofrido. Logo um governo de oposição significaria não só a ruptura do BRICS como também do Mercosul, que tem uma vinculação importante com o agronegócio brasileiro.”
Como substituição aos acordos comercias entre o BRICS e o Mercosul há sinalização de maior proximidade à União Europeia e aos Estados Unidos. Antônio não vê expectativas positivas no estreitamento econômico com esses países já que, segundo ele, os Estados Unidos são o maior concorrente brasileiro no mercado da soja e a União Europeia já tem suas próprias políticas agrícolas, que beneficiam suas ex-colônias na América Central e África.