As aulas começam pontualmente às 7h. Nenhum dos alunos se atrasa ou deixa de fazer os deveres de casa. Todos são operários da construção civil e duas vezes por semana deixam de lado as pás e pegam seus cadernos nas aulas de português e matemática que são ministradas em uma sala montada no canteiro de uma obra em Taubaté, interior de São Paulo.
Eles têm entre 27 a 55 anos e, em comum, histórias de infância difícil e a vontade de aprender a ler e escrever. A maioria nunca esteve em uma sala de aula e para o mais velho da turma, Luiz Rodrigues, nem mesmo a dificuldade de visão foi impedimento para voltar a estudar.
“Não tive chance de ir à escola, levava minha irmã de cavalo, mas tinha que ajudar a família no sustento desde os 7 anos. Agora com a ajuda dos colegas, mesmo com esse meu problema, estou insistindo”, conta.
As aulas são nos primeiros anos do ensino fundamental, do 1º ao 4º ano. O espaço com lousa, mesas e carteiras, foi improvisado no canteiro de obra de um prédio residencial. A obra está em fase inicial, no bairro Vila São José. Todas as quintas e sexta-feiras, o início do expediente desses operários é adiado, e das 7h às 8h30 eles fazem novas descobertas relacionadas às letras e aos números.
“Depois de um dia de trabalho intenso, muitos ficam desmotivados a estudar e fazer um supletivo à noite. Alguns têm até medo de dizer que não sabem ler, mas buscamos tranquilizá-los e motivá-los para que eles cresçam profissionalmente. Para alcançarem cargos de oficiais pedreiros e até encarregados de obras, é essencial saber ler”, disse o engenheiro responsável pela obra, Guilherme Corrá.
A professora Maria de Lourdes dos Anjos recorda que no início das aulas os alunos estavam tímidos. Mas depois de duas semanas, já começam a se empolgar com cada passo novo. Segundo ela, em meio às dificuldades, o incentivo é mútuo.
“Promovemos atividades diversificadas para cada um, pois eles têm níveis de escolaridade e ritmos de aprendizagem diferentes. Nosso maior objetivo é que eles levem este conhecimento para o cotidiano, trazendo a eles mais autonomia para poder, por exemplo, pagar uma conta”, explica a professora.
Entre os alunos mais entusiasmados está o operário João Batista Santos, que acaba de aprender a escrever seu nome. Ele confessa que a maior motivação não é a possibilidade de crescer profissionalmente, mas a chance de estudar para ajudar e participar das atividades dos quatro filhos na escola.
“Não aprende quem não quer agora, nunca é tarde. Agora vou aprender e passar para minha família que está na Paraíba. Meus filhos que estudam estão gostando, agora eu vou ajudá-los e e eles a mim”, disse.
A iniciativa foi viabilizada na cidade por meio de uma parceria de uma construtora com o Projeto de Alfabetização e Inclusão (PAI), ligado ao Instituto Brasileiro de Estudos e Apoio Comunitário. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), divulgada no ano passado, o índice de analfabetismo registrado em 2013 foi de 8,5% da população brasileira. No Vale do Paraíba, os dados do Censo 2010 indicam que cerca de 73.480 pessoas com 10 anos ou mais não são alfabetizadas.
Após cursarem os módulos de alfabetização, os alunos poderão prestar uma prova pelo sistema público de educação para ingressar na 5ª série do ensino fundamental, em escolas públicas.
Fonte: G1