A disputa pelo cargo titular no pleno do TCE (Tribunal de Contas do Estado) ilustra a briga pelo poder. A sessão da CCJR (Comissão de Constituição, Justiça e Redação), na semana passada, de análise da documentação de indicados, reuniu vários políticos e a vez pela fala sobrou em declarações grosseiras dos postulantes. Ao menos sete deputados ouvintes usaram o microfone para protestar a favor ou contra o parecer da relatoria sob o deputado Wilson Santos (PSDB). A reunião no Colégio de Líderes também teve temperatura elevada e o nome do indicado foi definido por diferença de um voto.
A luta ferrenha ganha explicação se for levado em conta os números do TCE. O orçamento deste ano do tribunal está na casa de R$ 352 milhões, o quarto mais polpudo se for excluído o Poder Executivo da Lista, abaixo apenas do Judiciário (R$ 1,4 bilhão), Ministério Público (R$ 475,8 milhões), e o Legislativo (R$ 457 milhões).
O pleno composto por sete cadeiras tem validade vitalícia, com benefícios que vão de auxílio moradia e verba semestral para a compra de livros técnicos. A soma deixa disponíveis R$ 69, 1 mil ao mês para os titulares. São R$ 33,7 mil de salário bruto mais R$ 35,6 mil em valores indenizáveis.
Os cargos de direção dentro do TCE – presidente, vice, corregedor, ouvidor e presidentes das Câmaras – têm gratificação de R$ 3,8 mil ao mês. O auxílio alimentação está hoje em R$ 1,150 mil. Além disso, os conselheiros tem acesso à verba indenizatória de R$ 23,8 mil para cobrir gastos relacionados ao trabalho de fiscalização. São para despesas com viagens, veículo, combustíveis, passagens, e suprimentos de fundo.
“Imagina você ocupar uma sala num tribunal com apenas sete conselheiros, pedindo cafezinho. Ninguém sabe o que você faz e nem informações são publicas sobre a administração do tribunal. É você estar no paraíso”, diz o cientista político João Edisom.
A analogia feita também ilustra a disputa em torno do cargo e coloca a classe política como guardiã das indicações ao TCE. “Poucas pessoas têm condições, o preparo exigido para ocupar uma cadeira no TCE. ‘A porta é estreita’ e somente eles entrarem no paraíso”.
O peso das contas e reflexo social
Mas, o cientista político diz que o começo do problema está na separação dos poderes no País. O Tribunal de Contas, pontua ele, tem hoje um estrutura gigante cujos benefícios para a sociedade são irrisórios. Sua defesa é pela restruturação com mudanças que passariam tanto pelo tamanho quanto pela qualidade dos órgãos fiscalizadores.
“A polêmica sobre TCE não ocorre só lá, tem no Judiciário, tem no Legislativo, não é um problema só moral. É preciso questionar a estrutura da separação dos Poderes. O TCE é um órgão consultivo, auxiliar, e faz sua análise e envia para os legislativos, onde as coisas são decididas. Precisa ser deste tamanho?”, questiona.
João Edisom compara o salário de um conselheiro de Contas ao de secretário do Executivo. Em Mato Grosso, o ganho nos primeiros corresponde a quase duas vezes ao que um secretário recebe no mês.
“Uma secretária de educação em Mato Grosso, por exemplo, precisa lidar com centenas de escolas, milhares de alunos e questões administrativas internas de sua gestão, e para isso recebe R$ 18 mil. As decisões que a secretária de educação toma tem mais impacto na vida das pessoas do que as do conselheiro de Contas”.
A Corte de Contas é o órgão máximo de controle das contas de praticamente toda a estrutura estatal. Julga e dá pareceres aos gastos de 141 prefeituras. Também cuida do dinheiro empregado por outros poderes, como a Assembleia Legislativa, autarquias, fundações e o próprio governo do Estado. Das suas próprias contas, entretanto, ninguém cuida ou controla, a não ser o próprio TCE.
Nesse quesito, há números nem um pouco desprezíveis. Em duodécimos (relativos ao custeios do mês de janeiro) foram mais de R$ 31 milhões. Desse montante, mais da metade, ou R$ 15.936.175,55, é consumida com o pagamento dos salários dos 698 funcionários ativos do órgão. O duodécimo para custeio e investimentos é de R$ 14.179.197,09. Ao todo o orçamento do TCE em 2018, foi reduzido em 20%, mas ainda assim é superior aos gastos estaduais com saúde, que não chegam a dois bilhões de reais.
Uma pesquisa do Instituto Bradel, ligado a Fundação Armando Álvares Pentenado (FAAP), revelou que o TCE-MT está entre os sete mais caros do Brasil, perdendo apensa em volume de gastos para estados como Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. A Corte de Contas mato-grossense chega a custar R$ 100 milhões a mais do que a de Mato Grosso do Sul, estado com habitantes e dimensões semelhantes.
Um dos pontos que pesam nessa conta são os gastos com os servidores comissionados. O TCE-MT possui 410 cargos de servidores efetivos, 218 cargos exclusivamente de comissionados e 70 cargos comissionados para efetivos. . Os salários deles variam de R$ 2.766,09 (a menor remuneração) até R$ 14.277,61, a maior, excluindo-se, como já citado, os próprios conselheiros.