Política

O governo não quer diálogo e é pouco transparente, diz Fórum Sindical

Foto Ahmad Jarrah

O maior desgaste político do governador Pedro Taques (PSDB) em 2016 ocorreu na disputa com servidores estaduais sobre a aplicação da Revisão Geral Anual (RGA) dos salários – medida que garante a reposição dos ganhos com base na inflação do ano anterior. Em maio, Taques se viu diante de uma greve geral de servidores ferrenhos na cobrança de melhores condições de trabalho.

A paralisação de serviços durou mais de um mês, intervalo em que houve acampamento de manifestantes no Centro Político Administrativo (CPA), bloqueio de prédios públicos, com impedimento de servidores que não aderiram ao movimento de trabalhar, e uma extensão da crise para Assembleia Legislativa, onde deputados representantes do Executivo trocaram palavras duras com sindicalistas com baixaria de palavrões.

Na última semana de maio, a Assembleia aprovou um projeto do governo com pagamento pela metade da RGA e os servidores foram judicialmente obrigados a retomar os trabalhos. O Circuito Mato Grosso conversou com o presidente do Fórum Sindical, entidade que reúne 31 categorias, Oscarlino Alves, que reclamou da falta de transparência do governo e pouca vontade para dialogar. 

CMT: O ano de 2016 foi marcado pelo primeiro embate dos servidores com o governador Pedro Taques devido à Revisão Geral Anual (RGA). Como foi a decisão de deflagração de greve geral?

Oscarlino: É importante dizer que o ano de 2015 foi o ano marcado pelas tentativas de diálogo por parte dos sindicatos e associações que representam os servidores públicos do Poder Executivo na apresentação de diagnósticos das condições de trabalho com sucateamento, precarização e necessidade de novos concursos, onde algumas categorias chegaram a assinar acordos coletivos para a construção conjunta de soluções a exemplo do Sisma (Sindicato dos Servidores Públicos de Saúde e Meio Ambiente). No tocante, à RGA o governador Pedro Taques, em 2015, parcelou em duas vezes (maio e novembro) sem negociação com as categorias anunciando em 15 de maio, a alegação que não tinha condições naquele momento de pagar em maio a RGA e junto aos reajustes previstos em leis específicas. Apesar de muito descontentamento por parte dos servidores superamos essa fase.
 
CMT: Havia promessa de Taques em atender os pedidos dos servidores?

Oscarlino: No dia 23  de dezembro de 2015, o governo divulgou através da imprensa sua vontade de retornar o dia do pagamento até o dia 10 de cada mês (pagos no último dia útil) e retornar o pagamento do 13º salário para duas parcelas anuais, uma em julho e outra em dezembro (pagos na data do aniversário do servidor). O Fórum Sindical reagiu e provocou diálogo com o governo para se inteirar do porquê e aproveitando para incluir na pauta de discussão a RGA/2016 que já possuía previsão orçamentária na LDO 2016 com índice previsto de 7,36% a ser aplicado em maio de 2016, isto porque houve erro por parte do governo na estimativa do índice que fechou 2015 com 11,28% (INPC). Foram quatro reuniões com o governador de janeiro a abril de 2016, onde o governo passou a se escorar no limite de gastos de pessoal com o Poder Executivo (49%) previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). A celeuma foi criada em 6 de maio de 2016 quando em reunião junto ao governador, este anunciou que não pagaria a RGA em 2016 devido à LRF e para manter o pagamento dos salários em dias e encerrou intempestivamente a reunião sem demonstrar nem por parte dos secretários vontade de manter o diálogo. Interrompido o canal de comunicação fizemos assembleia geral unificada na praça das Bandeiras dia 10 de maio de 2016 com encaminhamento de parada por 24 horas no dia 17 de maio. Nesse dia, encaminhamos pela parada de 48 horas nos dias 24 e 25, dando vazão para uma convocação por parte do governo. E encaminhamos no dia 25 o início da greve geral para o dia 31 de maio como assim aconteceu. A partir deste momento o governo apresentou duas propostas de parcelamento menores que a previsão orçamentária de 7,36% (5% em duas parcelas e 6% em 3 parcelas sem retroatividade e sem a diferença dos 11,28%). Não havendo avanços enviou a mensagem contendo o Projeto de Lei para a Assembleia Legislativa, que culminou na manutenção das manifestações e protestos durante dias nas ruas e dentro da AL. Após todo o desgaste os Deputados após várias tentativas frustradas de tentar intermediar o conflito, partiram para a aprovação no “goela abaixo” com sessões sem quórum e sem sessão com votação que chegou a ser anulada. O desfecho foi feito no dia 30 julho de 2016 com a Lei 10.410/2016 com previsão de parcelamento para 2016-2017.

CMT: Como está a situação hoje?

Oscarlino: Sem diálogo por parte do governo, todas as demandas dos sindicatos vêm sendo judicializadas. No entendimento da junta de advogados dos sindicatos, a lei 10.410/2016 com previsão de parcelamento sem retroatividade é inconstitucional. Então, como as associações e sindicatos não têm legitimidade para entrar diretamente com uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar e garantir o pagamento integral e retroatividade a maio/2016, fizemos parceria com o Partido Democrático Trabalhista (PDT) Nacional e entramos com a ADI 5560 que tem a ministra Rosa Weber como relatora. O governo do Estado chegou a perder o prazo para se manifestar após ser notificado pelo STF. Ainda na tentativa de não pagar a RGA o governo de Mato Grosso  articulou junto ao Ministério Público Federal (MPF) o questionamento quanto à constitucionalidade da lei 8278/2004 (regulamentadora da RGA em Mato Grosso) através da ADI 5584 com pedido de liminar. A liminar foi negada, onde já houve 
manifestação da Advocacia Geral da União (AGU) com parecer nos autos favorável a lei 8278/2004, dizendo que a mesma obedece os preceitos constitucionais.

CMT: O ano termina para os servidores com o retorno do debate sobre a RGA, como está o diálogo com o governo?

Oscarlino: A necessidade e a vontade em dialogar com o governo sempre foram as primeiras alternativas adotadas pelas entidades representativas, onde já encaminhamos diversos ofícios solicitando reuniões. Mesmo com o encerramento da greve o governo manteve sua postura em não dialogar e passou a ignorar as entidades representativas das categorias.

CMT: Como você vê as afirmações do governo de não haver dinheiro para cobrir a RGA?

Oscarlino: O governo não mostrou com a transparência prometida em reuniões os dados referentes ao gasto com pessoal e da receita. As apresentações do próprio governo feitas nas audiências públicas, na Assembleia Legislativa, de prestação de contas dos quadrimestres e da Lei de Diretrizes Orçamentárias 2017 e Lei Orçamentária Anual 2017 se contradizem, a alegação de colapso que justificaria a inclusão de Mato Grosso em condições financeiras semelhantes aos estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. A receita tributária é crescente  em 2015 e 2016 no patamar de 17% e projetada para 2017 em 19,5%. E mesmo com impacto insignificante nas transferências em função da crise nacional, estas se demonstram crescentes em 2015-2016 no patamar de 19%. A renúncia fiscal aumenta a passos largos e com repasse de duodécimos acima da necessidade o que acarreta sobra significativa no caixa dos poderes (TJ, AL, MPE e TCE) na ordem de 1 bilhão a cada quadrimestre. A dívida do Estado é controlada e equivalente a 3
5% da Receita Corrente Líquida Anual. O que precisa ser feito é proporcionar equilíbrio na partilha da Receita Fiscal e envolver todos os entes públicos para participarem dos cortes de gastos.

CMT: Na comparação com o governo de Silval Barbosa, a situação hoje está melhor ou pior?

Oscarlino: Com certeza, vem piorando a cada dia que passa. O sucateamento e a precarização aumenta em escala crescente sem condições de trabalho para prestar serviços dignos à população mato-grossense. Os servidores públicos estão adoecendo e doenças ocupacionais tem aumentado o percentual de absenteísmo. Salários atrasados e sem pagamento da RGA. O governo não demonstra vontade em dialogar. Se levar em consideração o fator temporal onde as condições de trabalho pioram com o crescente sucateamento e a precarização, salários atrasados, sem pagamento da RGA, sem diálogo com os servidores,  constantes ameaças de perdas de direitos funcionais previstos nas leis de carreira (progressões) e aumento da alíquota de contribuição previdenciária, poderíamos até considerar que piorou.

CMT: Havia diálogo na gestão anterior?

Oscarlino: Sim. O diálogo era aberto com o governo e a Assembleia Legislativa.

CMT: O governo diz que mais 50% do orçamento é para quitação de folha de pagamento, isso pode travar a RGA em 2017?

Oscarlino: Se levar em consideração que os números referentes a despesa com pessoal não estão às claras e que recentemente foi apontado nova possibilidade de adequação do percentual de gastos pela Lei de Responsabilidade Fiscal, onde o Tribunal de Contas do Estado emitiu parecer em relação ao Imposto de 

Renda Retido na Fonte dos servidores públicos ao qual não podem entrar no rol das despesas de pessoal já que ficam no cofre do Estado mesmo como saldo contábil, acreditamos que o Estado possui sim condições em arcar justamente pela conjuntura econômica do favorável do Estado.

CMT: O  Fórum Sindical cobra a garantia da RGA na Lei Orçamentária do próximo ano, como está a situação?

Oscarlino:Na realidade, a obrigação em fazer previsão orçamentária para o pagamento desse direito constitucional dos servidores públicos é de responsabilidade do governo. Na LDO 2017 há descrição em seu Artigo 44 da RGA e segundo informações dos técnicos da Seplan/MT o parcelamento de 2016 (Lei 10.410/2016) está contemplado na previsão das Despesas de Caráter Obrigatório e Continuado, restando apresentar a memória de cálculo para constatarmos se a RGA 2017 (estimada em 7%) também estaria prevista.  A LDO deve dar as diretrizes para a LOA 2017, onde acreditamos que será possível a previsão correta da RGA parcelada em 2016 e da RGA 2017, já que o governo alega que traça as peças orçamentárias próximas da realidade, e o que a conjuntura demonstra é outra coisa, pois assistimos durante o exercício fiscal suplementações orçamentárias por excesso de arrecadação, produção crescente e esses novos números da economia sem serem discutidos com os servidores públicos e a população.

CMT: É provável greve já no início do ano?

Oscarlino: A greve é um instrumento institucional de luta e reivindicação das classes. Utilizado para manifestar a necessidade de negociação e só encaminhado em Assembleia Geral das categorias, justamente quando o direito é tolhido e a outra parte não se apresenta ao diálogo. Portanto, como o governo não quer dialogar, a greve não está descartada.

CMT: Há outros itens de reivindicação travados por necessidade de diálogo com o governo?

Oscarlino: Além de melhorias das condições de trabalho e novos concursos públicos, há a necessidade urgente do governo apresentar o teor das reformas na administração, que cogitam nos bastidores e que pela ameaça muda a vida funcional do serviço público como um todo.

CMT: Qual é a avaliação do governo Taques, considerando a relação com servidores/sindicatos?

Oscarlino: Como já foi descrito em 2015 houve um esforço de ambas as partes em se construir um diálogo, situação está interrompida pelo governo em 2016. Onde as categorias sofrem ameaças constantes de perdas de direitos e omissão dos governantes em relação ao sucateamento e as relações de representação de classes considero ruim.

Reinaldo Fernandes

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