O Noroeste de Mato Grosso é considerado o último grande bloco de floresta amazônica nativa em um estado que sempre figura entre os primeiros no ranking de desmatamento do Ministério do Meio Ambiente (MMA). Não é por acaso, as estradas e a dificuldade de acesso são um indicativo da falta de políticas públicas para essa região, considerada por muitos ambientalistas como estratégica para a conservação, pois compõe o chamado arco-do-desmatamento.
Mesmo diante das dificuldades, um grupo de mulheres se uniu através do associativismo e tem modificado a realidade local. A Associação de Mulheres Cantinho da Amazônia (AMCA) foi criada em 2009, e desde então tem deixado lições importantes para as pessoas viverem na Amazônia de forma sustentável. “Construímos esse grupo a partir dos sonhos dessas mulheres que tinham o desejo de se qualificar e participar mais ativamente da vida em sociedade. O sonho cresceu, e em 2012 nós conseguimos o patrocínio da Petrobras, através do Programa Petrobras Socioambiental”, conta Lucinéia Machado, coordenadora do CultivAção, nome do projeto que é gerido pelas associadas da AMCA e que tem ajudado centenas de famílias do campo a se qualificar e a gerar renda.
A castanha, matéria-prima principal dos produtos da AMCA, é extraída da floresta através de coletores do próprio assentamento vale do Amanhecer e parcerias com associações indígenas. Quando chegam na AMCA, as amêndoas são beneficiadas, viram biscoito e macarrão. Elas ganham embalagens e são comercializadas em todo Brasil. Todo esse trabalho, além de remunerar toda a cadeia produtiva, é um exemplo de sustentabilidade em uma região tão desacostumada a aproveitar as riquezas locais. “A gente nota que dá pra sair dessa lógica de boi e pasto. A gente vive numa região tão rica, tem que aproveitar”, diz Leonilda Grassi Buss, a Dona Nida, presidente da AMCA.
Essa Tecnologia Social, chamada de “Mulheres da Amazônia”, foi premiada pela Fundação Banco do Brasil em 2011. O sucesso dessa iniciativa ajudou a estabelecer diversas parcerias, como a Conab, que através do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) passou a comprar os produtos das associações e distribuí-los para escolas e terras indígenas da região. Desde então a AMCA triplicou a produção e de 2011 a 2015 passou de 1.500kg para 4.500kg/mês a produção de castanha do Brasil e derivados, gerando mais de 30 novas oportunidades de trabalho na fábrica.
Como se não bastasse todo o sucesso na geração de renda, as Mulheres da Amazônia também investem bastante em cursos de capacitação e inclusão digital. “O Projeto CultivAção certificou mais de 1.300 mulheres rurais e indígenas no cantinho da Amazônia. Foram cursos de gestão de negócios, cultivo agroecológico de hortifruti, corte e costura, bonecas e tapetes artesanais, além dos cursos de inclusão digital”, diz Lucinéia. Boa parte das capacitações foi oferecida por meio de parcerias com o SENAI, SEBRAE E SENAR.
Aos poucos as mulheres tem conquistado mais autonomia e com isso tem se libertado até mesmo da violência. “A gente vive em uma região distante, com muita dificuldade de comunicação. O machismo aqui é forte, com bastante discriminação de gênero, o que ocasiona em muitas delas a depressão. Além disso, a violência contra mulher rural quase sempre fica no silêncio. Nosso projeto tem ajudado a quebrar essa lógica, trazendo melhoria de vida e mais autonomia para as mulheres desses assentamentos”, conta Lucinéia Machado.
O simples acesso à informação tem ajudado a mudar o quadro de violência contra a mulher. “É interessante perceber que aqui, no cantinho da Amazônia, tem pessoas preocupadas com políticas públicas, com a emancipação da mulher, autonomia econômica, coisas que muitas vezes a gente não vê nos grandes centros”, diz Lucineide dos Santos Pereira, téologa e consultora do projeto que ministrou uma palestra sobre protagonismo feminino durante o 1º Encontro de Mulheres indígenas e rurais de Juruena.
Todo esse trabalho tem inspirado novas associações na região. Outras duas comunidades de Juruena também constituíram associações de mulheres e com a ajuda do CultivAção vão acessar o mercado de aquisição de Alimentos da Conab. “Nosso projeto dá apoio a essas organizações, pois nossa intenção é de que essas iniciativas cresçam cada vez mais aqui no Noroeste”, diz Lucinéia.
Atualmente são mais de 1.300 mulheres que mudaram de vida e tem uma renda que vai de R$800 a R$1.200. A última grande conquista foi a inauguração de uma fábrica de pepinos e conservas. “Nós investimos na produção de canteiros agroecológicos nas casas das associadas e agora, com essa fábrica, vamos poder comercializar esses produtos no Brasil todo. Esta é mais uma conquista nossa. Uma prova de que a união faz a força”, alegrasse Dona Nida.
*Da assessoria