Jurídico

MPT aciona frigorífico de Mato Grosso contra ‘prêmios’ pagos a empregados

O Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso (MPT-MT) ajuizou uma ação civil pública em face da Marfrig Global Foods, unidade de Tangará da Serra, pedindo que a Justiça do Trabalho condene o frigorífico a reconhecer a natureza salarial da parcela paga a título de “prêmio de produção” aos empregados da planta, declarando-se a institucionalidade incidental do art. 457, § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

O MPT também pede que os efeitos da decisão, se favorável, alcancem todo o estado, tendo em vista a possibilidade das irregularidades estarem sendo repetidas em todos os estabelecimentos da multinacional em Mato Grosso.

De acordo com o procurador do MPT Bruno Choairy, o objetivo da ação é fazer com que a empresa passe a integrar o “prêmio de produção” — uma gratificação concedida pelo empregador com a finalidade de incentivar a produtividade —, às verbas de natureza salarial percebidas pelos trabalhadores, a fim de que o valor também tenha repercussão nas férias, gratificação natalina, FGTS, aviso prévio, horas extras e adicional noturno.

O procurador explica que essa repercussão potencializa os ganhos do trabalhador, pois leva em conta a totalidade do salário no pagamento de verbas trabalhistas, e garante segurança e previsibilidade no recebimento dessas verbas, que são calculadas considerando toda a massa salarial, e não apenas parte dela.

Durante a investigação promovida pelo MPT, constatou-se que o “prêmio de produção” é, na verdade, uma gratificação concedida de forma ampla e habitual aos empregados, a partir do cumprimento de metas rotineiramente exequíveis. Não se trata, portanto, de desempenho extraordinário, superior ao normalmente esperado, mas de um conjunto de tarefas cumpridas corriqueiramente.

Segundo o MPT, apesar do art. 457 da CLT permitir a não integração ao salário das importâncias recebidas a título de prêmios, a Constituição Federal não autoriza essa desvinculação, por promover o desmantelamento da proteção oferecida ao salário pela ordem jurídica, diminuindo os ganhos dos trabalhadores.

“Reduzir ganhos do trabalhador mediante o estabelecimento artificial de caráter não salarial a parcelas remuneratórias acarreta uma desvalorização do trabalho como bem a ser tutelado, em contrariedade à normativa constitucional. Daí por que recusar a natureza salarial de parcelas pronunciadamente contraprestativas viola o princípio constitucional da valorização do trabalho humano. Essa diminuição de ganhos é intensificada quando se constata que a aplicação sem ressalvas da lei permite o estabelecimento de uma importância fixa muito baixa como retribuição pelo trabalho, a ser inflada por parcelas supostamente não salariais (abono e prêmios), como forma de negar-lhes a repercussão trabalhista e previdenciária, em prejuízo do rendimento obreiro”.

O MPT defende que antes da Reforma Trabalhista nem se discutia a natureza salarial atribuída aos prêmios pagos pelo empregador, uma vez que era uníssona na doutrina e na jurisprudência sua característica de verba salarial. Além disso, a Constituição estabelece, de forma clara, que “os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e consequente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei”.

Também a Convenção 95 da OIT, incorporada à ordem jurídica brasileira (Decreto nº 41.721/1957), ao dispor sobre normas de proteção do salário, assevera que qualquer importância, ajustada ou fixada em lei, desde que devida por serviços prestados, possui natureza salarial, a despeito de sua denominação. Nesses termos, não há como recusar natureza salarial a parcelas com atributo contraprestativo — ou seja, com atributo de retribuir por um trabalho prestado —, a exemplo das gratificações ajustadas, percentagens, abonos e prêmios, sobretudo quando habituais.

Natureza salarial e condições para recebimento do prêmio

Se a Justiça do Trabalho não declarar o artigo inconstitucional, outro entendimento defendido pelo MPT na ação é de que não estão presentes os requisitos para considerar como prêmio os valores que têm sido concedidos aos trabalhadores da Marfrig, uma vez que somente o que for pago por desempenho superior ao ordinariamente esperado deve escapar da tributação e dos reflexos sobre verbas trabalhistas.

“No caso em análise, todos os empregados lotados no Setor de Desossa da Ré percebem importâncias a título de prêmio em razão do atingimento Kilograma/Hora/Homem (Kg/h/h), estabelecido de maneira proporcional à capacidade de produção da unidade no respectivo dia. Portanto, verifica-se que a meta é prevista pela empresa e não advém de um desempenho superior ao esperado pela Marfrig”, pontua o MPT na petição.

Isso significa dizer que o “prêmio de produtividade” é, na verdade, uma parcela que objetiva retribuir o trabalho dos empregados, a partir do cumprimento de metas que são corriqueiramente alcançadas — e não de metas que são superiores ao que é normalmente executado —, o que resulta em um pagamento habitual e contínuo de prêmios.

Por esse motivo, o MPT pede, sucessivamente, que a Justiça do Trabalho determine o não cumprimento do art. 457 da CLT, a fim de que a gratificação seja considerada parte da verba salarial, uma vez que ausente, no caso concreto, a condição para percepção do prêmio: o desempenho superior ao ordinariamente esperado.

“Ainda que, em argumentação sucessiva, se repute constitucional o art. 457, § 2º, da CLT, tem-se que ainda assim a conduta da empresa seria irregular. Não há nada de errado em estabelecer metas de produção, remunerando melhor seus empregados a partir do cumprimento dessas metas. Pelo contrário, trata-se, a princípio, de política lícita inserida no poder diretivo do empregador (art. 2º da CLT). Contudo, não é possível afastar a natureza salarial da parcela paga em razão do cumprimento das metas (prêmios de produção), na medida em que, como demonstrado, não há enquadramento na norma prevista art. 457, § 4º, da CLT, porque ausente, no caso concreto, como condição para sua percepção, o desempenho superior ao ordinariamente esperado no exercício de suas atividades”, concluiu o MPT.

Redação

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