A decisão proferida no dia 17 de março pela juíza Célia Regina Vidotti que permite que a Assembleia Legislativa de Mato Grosso (AL-MT) faça a livre indicação de conselheiros para o Tribunal de Contas do Estado (TCE-MT), sem a necessidade de normatização, provocou reação do Ministério Público Estadual (MPE). Nesta sexta-feira (31), a 10ª Promotoria do Patrimônio informou que ingressou com Recurso de Apelação na tentativa de reverter a decisão.
O promotor de Justiça Henrique Schneider Neto argumenta que devido à falta de regulamentação específica no processo de inscrição e escolha dos conselheiros pela AL-MT tem prevalecido critérios meramente políticos, em total desacordo com a Constituição Federal e Estadual.
Segundo o MP, a ação civil pública julgada improcedente pela juíza Célia Vidotti foi ajuizada com o intuito de anular os processos de inscrição para indicação do conselheiro que vai ocupar a vaga aberta em razão da renúncia de Humberto Melo Bosaipo.
O promotor de Justiça questiona a ausência de regramento normativo que confira a devida publicidade aos seus procedimentos e a falta de transparência e obediência aos requisitos constitucionais no referido processo administrativo.
“Como se sabe, na prática, em caso de vacância do cargo de conselheiro, esta é comunicada à Assembleia Legislativa do Estado, que promove a escolha do conselheiro como se tratasse de um ato quase que exclusivamente ¨interna corporis”, pois participam como votantes ou candidatos ao cargo, apenas parlamentares. Isso acontece porque não existe nenhum regulamento, legislação ou normativas no âmbito do Parlamento Estadual para direcionar os moldes de análise dos requisitos constitucionais dos candidatos às vagas”, destaca o promotor.
A escolha e nomeação de membros do TCE é ato vinculado aos requisitos estabelecidos na Constituição Federal Os candidatos devem, obrigatoriamente, ter mais de 35 anos e menos de 65 anos de idade, ter idoneidade moral e reputação ilibada, possuir notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros ou da administração pública e mais de 10 anos de exercício de função ou de efetiva atividade profissional que exija os conhecimentos mencionados nestas áreas.
Ele argumenta, ainda, que a ausência de publicidade em processo de tamanha relevância, restringe a participação cidadã ante o desconhecimento das regras para sua participação, e, de acordo com os dispositivos constitucionais, qualquer brasileiro pode concorrer ao cargo de conselheiro. “No entanto, a Assembleia Legislativa, da forma como conduz o procedimento, deixando de dar a devida publicidade ao processo, impede esse direito assegurado pela Constituição”.
Para Henrique Schneider, a mera divulgação da vaga na imprensa, desacompanhada de regras essenciais para a participação de eventuais interessados ao cargo, não confere, absolutamente, a publicidade que o processo exige, dada a sua magnitude.
“O que se pleiteia é a anulação dos procedimentos de inscrições para o cargo de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado pela ausência de atos normativos que atendam os princípios da legalidade, moralidade administrativa e transparência pública para regular a indicação e escolha de conselheiro”, ressaltou o promotor ao requerer ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso a reforma da decisão.
Parâmetros da juíza
Ao analisar o caso, a juíza Célia Vidotti teve como parâmetro o processo de escolha dos Ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) pelo Congresso Nacional, que, segundo ela, não há a exigência dos itens requeridos pelo MPE – elaboração de edital informando a vacância do cargo de Conselheiro e prevendo quais deveriam ser os critérios de análise dos currículos e da vida pregressa dos candidatos; abertura de prazo para inscrição de todos os interessados; abertura de prazo para impugnações; apresentação de certidões negativas e comprovação de titulação; possibilidade de os candidatos defenderem suas candidaturas em Plenário.
“Importante ressaltar que as Constituições Estadual e Federal não fazem qualquer referencia à necessidade de complementação infraconstitucional da matéria que trata do provimento do cargo de Conselheiro dos Tribunais de Contas, não existindo, portanto, obrigação constitucional nesse sentido”, declarou.
A magistrada ainda disse que não cabe ao Poder Judiciário interferir na questão, uma vez que se trata de assunto “eminentemente” político, devendo se respeitar a autonomia dos Poderes, “pois inexiste previsão constitucional de mecanismo de controle desta natureza”.
“Desse modo, atender a pretensão ministerial e impor ao legislativo estadual a obrigação de elaborar ato normativo com conteúdo delimitado e especificado pelo próprio Judiciário, sem que houvesse obrigação constitucional nesse sentido, certamente configuraria uma afronta ao princípio da separação dos poderes, o que pode ser tão ou mais nocivo que a suposta omissão apontada pelo Ministério Público na inicial.”, declarou.
Iniciativa
Célia Vidotti, no entanto, ponderou que, mesmo não cabendo ao Poder Judiciário impor a elaboração de uma normativa para a indicação, a Mesa Diretora não está impedida de trazer mais transparência para tal processo.
“Aliás, neste momento em que se toma consciência da importância do controle social e, por consequência, da imperiosa necessidade de os órgãos integrantes da estrutura do Poder Público disponibilizarem dados e informações para que o cidadão possa conhecer e fiscalizar as ações do poder público, seria salutar que a requerida tivesse a iniciativa de regulamentar o processo de escolha de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso, em estrito cumprimento aos princípios constitucionais administrativos da transparência, impessoalidade e moralidade”, declarou.
Por fim, a magistrada ainda afirmou que o MPE também pode propor outras ações, caso tenha conhecimento de “abusos concretos e falta de observância dos requisitos constitucionais”, cometidos pelos membros do Legislativo.
Com Assessoria