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MP não é livre para conduzir investigação e se submete a duração razoável do processo, diz Perri

“(…) O Ministério Público não é inteiramente livre para conduzir as investigações pelo tempo que lhe aprouver, estando ele também submetido à duração razoável do processo. A base normativa dos chamados PICs é a Resolução n. 181/2017 do CNMP, complementada, no âmbito estadual, pela Resolução n. 35/2009, do Ministério Público do Estado de Mato Grosso. A elas, a autoridade investigadora deve estrita e fiel obediência, inclusive e especialmente quanto ao tempo de sua duração, em tudo comparável às regras do Código de Processo Penal quanto ao prazo para conclusão do inquérito policial (art. 10, caput, e §3º)”.

O entendimento é do desembargador do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, Orlando Perri ao votar pela concessão parcial de um habeas corpus impetrado por um investigado pelos crimes descritos nos artigos 333 e 288 do Código Penal (Corrupção Ativa, Associação Criminosa), artigo 1ª da Lei 9613/98 (Lavagem de Dinheiro), além de crimes de Fraude em licitações (Lei n. 8.666/93) e anular parte das investigações realizadas.

No HC, o impetrado alegou que desde 2019 é investigado por membros do Ministério Público Estadual e por diversas vezes as investigações foram prorrogadas sem a devida fundamentação legal.

No voto, Perri destacou que “é dever da autoridade investigante demonstrar não apenas a legitimidade da investigação, a inevitabilidade e a indispensabilidade de se continuá-la, mas também justificar a sua conduta e postura na direção dela, que, junto ao chamado “tempo morto do processo”, são as causas mais frequentes de retardamento da ação penal”.

“É por isso que a Resolução n. 181/2017, do Conselho Nacional do Ministério Público, que disciplinou o Procedimento Investigatório Criminal, estabeleceu o prazo de 90 (noventa) dias para conclusão das investigações, possibilitando sucessivas prorrogações “por decisão fundamentada do membro do Ministério Público responsável pela sua condução” (art. 13). Referida norma se compatibiliza com a Resolução n. 35/2009, do Ministério Público do Estado de Mato Grosso, que estabelece, no seu artigo 11, transcrito na inicial deste writ, que após uma prorrogação, as subsequentes devem ter a chancela do Conselho Superior do órgão. A exigência não tem fundamento apenas na verificação de eventual desídia do membro do Ministério Público na duração das investigações, que deve ser considerado efeito secundário, mas principalmente no controle da duração razoável do processo, concebido como direito fundamental de segunda geração do investigado”, frisou.

O magistrado explicou ainda que o caso “não se trata de discussão de descumprimento de prazos processuais relacionados ao término da investigação criminal, cuja violação não leva a maiores consequências, especialmente diante da regra jurídica expressa no aforismo francês pas de nullité sans grief”.

Frisou que “a questão nuclear tem a ver com a duração razoável do processo, e não com mera desatenção de prazos processuais”.

“O tempo é o da lei; no caso dos PICs, instaurado por membro do Ministério Púbico, é o prescrito no artigo 13 da Resolução n. 181/2017 do CNMP, estipulado em 90 (noventa) dias, permitindo-se, por igual período, prorrogações sucessivas, por decisão fundamentada do responsável pela sua condução. É a fundamentação quanto à necessidade de prorrogação que confere legitimidade para se continuar com as investigações, notadamente quando houver restrição à liberdade ou de bens do imputado. Na motivação, deve o investigador demonstrar o que já se realizou, os entraves e dificuldades encontrados, a materialidade e os indícios de autoria já coletados e tudo quanto for imprescindível ainda recolher para formação da opinio delicti, salvo quanto às diligências que devam guardar sigilo. A exigência de motivação da decisão que prorroga as investigações presta tanto ao controle do investigado quanto à duração razoável delas, como aos órgãos superiores da autoridade investigadora, para fins correicionais e disciplinares”, destacou.

Perri lembrou ainda que “o STF atribuição ao Ministério Público de promover, por autoridade própria, investigação criminal, delimitou sua realização à observância e respeito aos direitos e garantias do indiciado – entre eles a duração dela por prazo razoável, à reserva de jurisdição, ao controle judicial e atenção às prerrogativas profissionais dos advogados. Assim, o Ministério Público não é inteiramente livre para conduzir as investigações pelo tempo que lhe aprouver, estando ele também submetido à duração razoável do processo.

Trancamento do inquérito

Em seu voto o desembargador destacou que “a solução jurídica deveria ser o trancamento da investigação criminal, que arrasta além do prazo previsto para sua conclusão, principalmente por não haver sido demonstrado, por decisão fundamentada do membro do Ministério Público responsável por sua condução, a necessidade de se prorrogá-la”.

Para ele, a nulidade dos atos perpetua a dilação indevida do processo.

No entanto, destacou que deve se ater ao pedido feito no HC, de nulidade dos atos praticados além do prazo para conclusão do PIC.

Conclusão do julgamento

Convocado para a Terceira Câmara Criminal do TJ, Perri abriu a divergência e seu voto foi seguido pelos desembargadores Rondon Bassil e Gilberto Giraldelli.    

Redação

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