Maria Júlia Coutinho, a Maju, em participação no programa 'Altas Horas' (Foto: Globo/Reinaldo Marques)
O Ministério Público de São Paulo conseguiu identificar integrantes pelo menos quatro grupos na internet suspeitos de publicarem ameaças racistas contra a jornalista Maria Julia Coutinho, a Maju. O relatório da Promotoria lista mensagens postadas na página do Facebook do Jornal Nacional contra a apresentadora, e sustentou os 25 pedidos de busca e apreensão cumpridos em oito estados nesta quinta-feira (10).
O MP acredita que a operação para apreender provas, como computadores e celulares, por crimes de racismo contra a apresentadora é "a ponta do iceberg" em relação a grupos em redes sociais que fazem ameaças contra negros. O promotor Christiano Santos diz que a "situação é ainda mais grave". Os suspeitos foram levados até o MP de cada região, onde foram ouvidos. Entre eles está um adolescente de 16 anos, que mora no interior de Goiás.
O crime aconteceu em julho deste ano, quando a apresentadora foi alvo de ataques racistas nas redes sociais. À época, no Jornal Nacional, Maju falou sobre a importância de combater o preconceito e agradeceu os apoios que recebeu. “Eu falei isso: os preconceituosos passam e a Majuzinha passa”, afirmou. William Bonner acrescentou: “Somos todos Maju, né, Renata?”. A apresentadora Renata Vasconcellos completou: “Somos todos Maju. Hoje e sempre”.
Relatório
O relatório elaborado pelo MP usou dados fornecidos pelo Facebook, além de cadastros de e-mails e telefones, para identificar os suspeitos dos ataques racistas no dia 3 de julho e os grupos aos quais eles faziam parte. Até o momento, 12 suspeitos foram identificados pela Promotoria.
Em alguns casos, eles eram administradores dos grupos ou mantinham mais de um perfil falso na rede social, conhecidos como "perfil fake". Para cada um deles, o MP faz uma relação com as mensagens racistas publicadas contra a jornalista Maria Júlia Coutinho. Apenas para um usuário o MP não encontrou a relação com os grupos, segundo o documento.
Algumas páginas foram desativadas, mas o cruzamento de informações ajudou na identificação dos autores da conta. Além dos quatro grupos já identificados pelo Ministério Público de envolvimento com os ataques preconceituosos contra a apresentadora, o relatório cita outros grupos que também têm como objetivo "atacar".
Um dos usuários identificados chegou a escrever que estava com saudades de postar ofensas, maldições e coisas negativas para os outros curtirem.
Depoimentos
Na manhã desta quinta-feira, um dos investigados pela participação dos ataques racistas que prestaram depoimento foi o auxiliar de produção Kaique Batista, de 21 anos. O MP, com o apoio da Polícia Militar, foram à casa dele, na Zona Norte de São Paulo, para buscá-lo e apreenderam também um computador.
Kaique disse que não publicou nada no seu perfil em uma rede social. “Não, meu grupo não. Agora, o grupo que publicou, eu sei quem foi. E eu vou falar”, disse o jovem. Questionado se iria entregar quem cometeu os crimes, disse: “Lógico. Não vou segurar o rojão de ninguém.”. Ele é um dos administrados de um dos grupos do Facebook investigados pela Promotoria.
Durante o depoimento, com duração de quatro horas, o auxiliar de produção apontou os grupos que conhece e que escrevem mensagens racistas nas redes sociais. O promotor Christiano Jorge Santos confirmou que é possível o envolvimento de mais pessoas e que outros suspeitos foram identificados pelo MP.
"Nós estamos detectando existência de grupos que não só fazem ataques virtuais, mas também se organizam para realização de atos de violência física, ataques a pessoas negras, ataques a homossexuais, e a membros de grupos rivais".
Suspeito de publicar mensagens com ameaças racistas contra a jornalista e apresentadora Maria Júlia Coutinho, a Maju, presta depoimento no Ministério Público, em São Paulo (Foto: Reprodução TV Globo)
Mesmo prestando depoimento, Kaique Batista continua sendo investigado pela Promotoria sobre as ameaças racistas. Ele disse que, na internet, as pessoas se envolvem nesses crimes porque consideram a rede uma terra sem lei. Já o promotor discorda e explica que, identificados, os agressores deverão responder pelos crimes de injúria, racismo e organização criminosa.
“Podemos pensar em penas que vão variar de dois a cinco anos no caso de racismo, de um a cinco anos no caso de injúria, um a três anos no caso de organização criminosa. E as penas vão sendo somadas”, disse o promotor Christiano Santos. Até o momento, o Ministério Público não pediu à Justiça a prisão de suspeitos pelo crime.
Operação nacional
Os grupos investigados por ataques racistas na internet são grandes, de acordo com o Ministério Público. Só nessa fase, a Justiça determinou 25 mandados de busca e apreensão em oito estados: além de São Paulo, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Goiás, Pernambuco, Ceará e Amazonas.
Em Fortaleza foram apreendidos quatro celulares e um notebook. O suspeito foi convidado a prestar esclarecimentos, mas se recusou e agora vai ser notificado formalmente para conversar com os promotores. O perfil era falso e foi apagado.
“Logo em seguida a injúria que o caso veio à tona, o perfil foi desativado. Mas isso não impede, evidentemente, de se chegar, de se identificar a localização exata de onde saiu essa mensagem criminosa”, afirmou o promotor Manoel Epaminondas.
Um dos líderes dos ataques foi encontrado em sua casa, em Sorocaba, no interior de São Paulo. No celular dele os promotores encontraram outros grupos com mensagens racistas.
A polícia de Rio Verde, interior de Goiás, também cumpriu na manhã um mandado de busca e apreensão na casa de um adolescente de 16 anos. Como colaborou com as investigações e permitiu que os agentes acessassem o computador, o menor não chegou a ser apreendido.
De acordo com o delegado Adelson Vandeo, que acompanhou a operação, foram analisadas postagens feitas pelo adolescente no Facebook dele, que é privado, e ele negou que seja o autor de ofensas.
“Ele simplesmente disse que fazia parte de um grupo, que teria algumas pessoas que faziam trabalhos com áreas de tecnologia, supostamente hackers. Com isso, ele cedeu alguns dados pessoais dele e de familiares para que fosse formado um outro grupo, que foi o que acabou fazendo ofensas a algumas pessoas e instituições. Em seguida, esse grupo foi extinto”, explicou Vandeo.
Fonte: G1