“Houve um dia que a turma do agronegócio julgou ter destruído o reinado dos Campos na política de Mato Grosso. Naquela época os adversários desta família tradicional eram chamados de Turma da Botina e rivalizavam com o grupo de políticos urbanos. Quando ganharam a eleição e assumiram o poder, os novos caciques desprezaram a possível reação daqueles que eles classificavam como atrasados e corruptos.
Mas o plano deu errado. Primeiro porque os novos caciques não entregaram o que prometeram ao povo, e o que era pra ser uma governança de sucesso com empresários dando um novo ritmo ao Estado, transformou-se em um monstruoso caso de corrupção envolvendo Governadores, Secretários de Estado, Assembleia Legislativa e Tribunal de Contas.”.
Esse é um resumo do que falou um dos integrantes de uma mesa de restaurante depois de várias cervejas e uísques, que eu escutava disfarçado, mas interessado, porque tratavam de um período que eu vivi aqui em Mato Grosso.
O companheiro do que discursava, um homem com cerca de 60 anos, completava que os eleitores decepcionados e frustrados com a turma do interior voltaram aos antigos amores: Jayme e Júlio. Esses, segundo ele, recuaram para amolar as ferramentas e aguardar “na moita” a hora de reagir. Lambidas as feridas recomeçaram elegendo a prefeita Lucimar para Várzea Grande e o Jayme para o Senado. Enquanto isso o Júlio se recuperava de uma enfermidade e agora, refeito, busca a vaga de senador, começando como suplente.
Seguindo o ciclo recorrente na política – teorizava um terceiro que parecia contrário aos Campos e aos empresários do agro – o mesmo discurso moralizante que destronou os Campos em favor dos homens de botina, voltou-se contra esses, apoiado no maior episódio de corrupção que o Estado conheceu. Irritado, este teórico afirmava que agora o eleitorado vai optar pela esquerda, porque a direita fracassou em Mato Grosso e que os atuais candidatos, posando de modernos, não são mais que velhos entupidos de botox, que disfarçam as rugas da idade e as baldas do caráter.
Esta é uma conversa típica de mesa de bar em uma sexta-feira qualquer depois de uma biritas. Aliás, os fabricantes de bebidas alcoólicas se esquecem de divulgar a mais visível de todas as qualidades de seus produtos. A cachaça, aqui genericamente representando todas as bebidas, é um poderoso ativador da inteligência, da retórica e da autoconfiança.
Os fabricantes de “bebidas de espírito”, como eram conhecidas antigamente, deveriam também divulgar o caráter democrático dos seus produtos: Lulistas, sob seu efeito, asseguram a inocência do líder que já sofreu várias condenações; outros, negando todas as evidências, acreditam que o Bolsonaro é um estadista.
Não dá pra negar a importância da cerveja na construção das teses políticas do Brasil. Dos botecos onde se reúnem os “intelectuais” da nossa cidade – a maioria de esquerda – saem soluções inteligentíssimas para resolver os problemas locais e do País. Essas ideias maravilhosas não são aproveitadas porque na hora ninguém se lembra de anotá-las e, no dia seguinte, todos já se esqueceram dela.
Renato de Paiva Pereira – empresário e escritor