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Mendes prioriza LED, mas ignora serviços de lixo e transporte

Fotos: Ahmad Jarrah

O prefeito Mauro Mendes (PSB) chegou ao seu último mês de mandato sem conseguir licitar o serviço de coleta e tratamento de lixo, que hoje custa R$ 25 milhões ao ano, e nem o novo modelo de transporte coletivo de Cuiabá, orçado em aproximadamente R$ 500 milhões. Somente nesta semana realizou audiências públicas para debater estes dois temas. Porém, segue firme no propósito de concluir a licitação de R$ 752 milhões para implantar lâmpadas de LED nos postes de energia da cidade até 31 de dezembro.

O serviço de coleta e tratamento do lixo e o novo modelo de transporte coletivo não foi priorizado pelo prefeito Mauro Mendes em quatro anos de gestão. Deixou para os últimos meses do seu mandato e o que se constata em estudo é o espalhamento de resíduos pela cidade, a formação de bolsões de depósitos irregulares e a falta de um aterro sanitário em padrões aceitáveis, além das condições degradantes dos catadores de materiais recicláveis.

A licitação aparece no plano de governo do prefeito Mauro Mendes como áreas prioritárias de investimento; no entanto, as propostas para estruturação ficaram para a fase final do mandato de Mendes. A primeira audiência de apresentação do projeto ocorreu nesta terça-feira (6) e, se o cronograma de atividades for mantido, a licitação será concluída apenas ao fim do primeiro semestre de 2017, estimativa que empurra o início de alguma mudança na situação atual dos serviços para daqui um ano.

O custo de manutenção mensal para serviços de coleta de lixo em Cuiabá está hoje em R$ 2,4 milhões, segundo a Secretaria Municipal de Serviços Públicos.

As ações para encontrar uma solução para a padronização de tratamento de resíduos sólidos em Cuiabá se estendem desde 2007. No mesmo ano, houve início de disposição de resíduos na área atual do lixo, e o projeto para atender à lei federal previa condições para receber todo o lixo doméstico da capital por um prazo de 50 anos. Mas, três anos mais tarde, em 2010, a capacidade de depósito chegou ao limite.

Em junho do ano passado, o MPE e a prefeitura firmaram um novo acordo com prazo de três anos para a disponibilização de nova área para a estruturação do aterro. Apenas parte do acordo foi cumprida até o momento e o que foi realizado recebe críticas por má qualidade administrativa.

O engenheiro sanitário e professor da UFMT, Paulo Modesto, diz que as intervenções realizadas pela Secretaria de Serviços Urbanos de Cuiabá são inadequadas, visto que não ocorre o tratamento de chorume e nem a coleta seletiva de resíduos.

“A prefeitura jogou lonas por cima das montanhas do lixo para tentar provocar decomposição, mas o problema só está encoberto, não está acontecendo nada. Além disso, as piscinas para tratamento do chorume estão desativadas, e ocorrem pequenos incêndios pelo local, devido às atividades dos catadores e da própria reação dos materiais dispostos lá”, explica.

Conforme o promotor Gerson Barbosa, responsável pelo TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) determinado à Prefeitura de Cuiabá para adequação do aterro sanitário em Cuiabá, poucos pontos previstos no termo para trabalho de revisão do aterro, hoje considerado em situação de lixão, foram cumpridos.

Na primeira vistoria, realizada em novembro de 2014, foram identificados problemas como descontrole no despojo de resíduos, ocorrência de fogo em vários pontos do aterro; presença de animais domésticos; represamento de chorume em barreiras de solo sem compactação, suscetíveis à ação das chuvas, com risco de rompimento; abandono da usina de triagem com acúmulo de resíduos fora das esteiras e ausência de manutenção dos drenos de gás, por exemplo. Em nova vistoria realizada 12 meses mais tarde, em novembro do ano passado, o Ministério Público aponta piora da situação.

Várzea do Quilombo é o melhor lugar para o aterro

O engenheiro Francisco Oliveira, consultor da Fral Consultoria, afirma que a falta de administração é o principal problema no controle e tratamento de resíduos em Cuiabá. A falha de gestão, por exemplo, levou a desestruturação do aterro montado no começo dos anos 2000 e que teve padronização das atividades até 2007.

“Hoje, classificação do tratamento está em 2,6 pontos, em uma tabela que vai de 1 a 10; ou seja, está em uma situação péssima, conhecida popularmente como lixão. E o que é mais grave é que o controle das atividades de tratamento só funcionou no período em que o comando ficou com a iniciativa privada. Falta muita gestão para área”, explica.

A estimativa é de dez meses para manutenção dos mais de dois milhões de quilo de lixo depositados no local e outros 18 meses para a implantação de um aterro sanitário. O prazo do processo de licitação é esticado por seis meses quanto tempo igual para que o vencedor do certame comece a operar.

Estudos sobre a instalação de novo aterro sanitário foram desenvolvidos pela Fral Consultoria, com pesquisa em 11 glebas ao redor do perímetro urbano de Cuiabá. Esse número foi reduzido a três por averiguação de situação do solo e do subsolo considerados adequados para tratamento de resíduos sólidos, levando em conta a probabilidade de contaminação de lençóis freáticos em decorrência do depósito de lixos, a distância de áreas com concentração de diversidade ambiental e o tamanho do terreno para receber a média de 600 toneladas diárias de resíduos pelos próximos 18 anos.

Conforme Francisco Oliveira, a área do atual do lixão, na região da Várzea do Quilombo, é a mais indicada para instalação do aterro, após serviços de descontaminação.

“As condições do subsolo são propícias porque há sedimentação do solo em profundidade, mas que foi impermeabilizado por elementos finos, como a argila, o que impede a contaminação dos lençóis freáticos. Além disso, possui um tamanho adequado da área para a disposição de resíduos, na quantidade estimada para Cuiabá, nos próximos 18, 20 anos”, explica.

Oliveira diz que o material de análise foi coletado em dois períodos, de seca e de chuvas, para extração de amostras de vários níveis dos subsolos e para identificação da situação do meio ambiente – a população de flora e fauna – e de atividades diretamente ligadas ao solo realizadas por moradores. Foram constatadas 230 espécies de plantas e vegetação, 128 espécies de animais, no período de chuva, e 112 no período de seca.

Segundo ele, foi constatado também um baixo índice de poluição ambiental, restrita à área de depósito de lixo. O nível profundo de invasão de contaminação está a cinco metros do solo. “Isso porque o subsolo de impermeabilização, em nível mais baixo, impede que o chorume passe para camadas mais baixas”.

Situação dos catadores ainda irregular
O prazo para retirada de catadores do aterro sanitário de Cuiabá está vencido desde setembro e não há previsão para regularização neste ano. Hoje, as pessoas que frequentam o local para a seleção de materiais recicláveis estão expostas a variados tipos de perigos que vão de seringa e gazes de lixo hospitalar à contaminação respiratória por gases de decomposição orgânica por falta de tratamento dos mais de dois milhões de toneladas de resíduos jogados no local.

Hoje, cerca de 180 pessoas estão cadastradas na prefeitura como trabalhadores que dependem da seleção e venda dos resíduos retirados do aterro, como meio de sobrevivência. Esse número, no entanto, flutua conforme a demanda por materiais em foco de reciclagem. Em 2013, o Ministério Público Estadual havia contado 70 pessoas, e desde então o número já foi superior a 200, contam os catadores.

A retirada dos catadores do local está firmada em Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado, em junho de 2013, pela Secretaria Municipal de Serviços Urbanos (SMSU). O prazo venceu em agosto de 2014, e um novo foi firmado para segunda retirada dos catadores até dezembro deste ano, visto que os catadores voltaram para o local.

Paralelamente à retirada dos catadores, o TAC previa a adequação das cooperativas para absorção dos catadores para trabalho regularizado. O projeto do que será feito foi debatido entre a prefeitura, quatro cooperativas e outras entidades representantes dos catadores. No entanto, tudo está por definir.

Conforme a presidente do Movimento Nacional dos Catadores de Resíduos Recicláveis, Valquíria Barros, o prazo para a execução do projeto venceu em setembro deste ano e até agora o que foi decidido é a construção de quatro barracões para alojamento das quatro cooperativas registradas na Secretaria de Serviços Urbanos – Acamarc, Amas-MT, Cooperam e Coopermar – e a assistência de R$ 45 mil por empreendimento para remanejamento dos catadores; os repasses terão prazo.

“Conseguimos definir isso com os envolvidos na discussão, mas ainda não sabemos como as cooperativas vão operar a partir desta mudança. Isso ainda será debatido, o que sugere que as adequações não vão ocorrer neste ano”.

Reestruturação do transporte coletivo não saiu do papel

Com atraso de dois anos, a Prefeitura de Cuiabá deu início a audiências para debate do serviço de transporte coletivo. A montagem de proposta se arrasta desde junho de 2013, quando o prefeito Mauro Mendes anunciou o lançamento de edital em um prazo de 12 meses, o que não foi cumprido.

Quinze meses depois, em outubro de 2015, novamente foi anunciada uma estimativa para abertura da concorrência, para dezembro do mesmo ano. E somente na terça-feira (6) foi realizado o primeiro debate público sobre os serviços. Desde então, se mantêm as irregularidades de exploração de serviços, cuja concessão venceu em 2012, e também os mesmos problemas de precariedade dos veículos, baixa circulação e insegurança em viagem. 

Em março de 2013 o Ministério Público do Estado (MPE) deu início a uma contestação judicial contra o prolongamento da concessão de transporte coletivo em Cuiabá às mesmas empresas que, à época, estavam com a exploração do serviço nas mãos há mais de 11 anos e havia conseguido aditamento de outros cinco anos em “renovação emergencial de contrato” pelo então prefeito Roberto França, em 2012, após o vencimento da concessão.

A situação classificada como “insegurança jurídica” pelo procurador Rogério Gallo – visto que a Justiça poderia, a qualquer momento, mandar interromper a nova negociação – teve início no terceiro mês de gestão do atual gestor Mauro Mendes, mas somente no último mês de seu mandato os trabalhos para o lançamento de uma nova licitação começam a sair do papel. O recurso sobre a suspensão de serviços pelas empresas continua em trâmite no Tribunal de Justiça.

Nos últimos quatro anos, a situação do transporte coletivo continuou praticamente a mesma com reclamação de péssima qualidade dos veículos em circulação, falta de segurança aos passageiros e descumprimento de contrato com baixo número de carros disponíveis para atendimento.

 Liminar obrigou prefeitura a fazer adequações

Em 2011, o Núcleo de Defesa da Cidadania de Cuiabá, ligado ao MPE, obteve liminar em ação civil pública que obrigava as empresas de transporte coletivo de Cuiabá a corrigir falhas como: não cumprimento dos horários nos itinerários das linhas de transporte; ausência de plataforma elevatória para pessoas com deficiências; bloqueios no sistema de catracas referentes a cartões estudantis que, mesmo com crédito disponível, acabam não sendo aceitos, entre outras irregularidades. A fiscalização das medidas ficou a cargo da Prefeitura de Cuiabá, sob pena de multa diária de R$ 1 mil.

Em junho deste ano, a Secretaria de Controle Externo de Auditorias Especiais do Tribunal de Contas do Estado (Secex) divulgou uma pesquisa sobre a prestação de serviços em Cuiabá na qual aparecem as mesmas reclamações: desgaste dos carros da frota em circulação; não cumprimento dos horários dos carros nas linhas ofertadas e falta de segurança. Associado ao último item estava identificação de que 28% dos passageiros de transporte na capital já sofreram assalto.

A sensação de impotência dos usuários é aumentada por falha na comunicação com as empresas responsáveis pelo serviço.  Cerca de 70% dos entrevistados responderam não conhecer os canais de ouvidoria. Outra falha na distribuição de informações foi identificada sobre aos itinerários nos pontos de ônibus e no site da prefeitura.

Um mês mais tarde, o juiz José Aparecido Bertolucci, da Vara Especializada de Ação Civil Pública e Ação Popular, acatou pedido do MPE para estabelecimento de novos parâmetros de vistoria das empresas concessionárias em Cuiabá quanto ao cumprimento de contrato. A Justiça quer saber se itinerários previstos na concessão estão sendo realizados; se há pontualidade no cumprimento de horários; se ocorre superlotação nos veículos e se os elevadores para portadores de necessidades especiais funcionam com regularidade. 

Cuiabá tem hoje um fluxo de 5,7 milhões de passageiros mensais (68 milhões ao ano), número que teve queda entre 2007 e 2015 na faixa de 18 milhões pessoas, mas com concentração de lotação em horários de pico. Nas linhas que vão de Cuiabá para Várzea Grande, no período da manhã, o crescimento foi de 90%, entre 2010 e 2016. A quantidade de pessoas que usam o transporte público entre as 6h e as 8h passou de 1,7 milhões para 3,6 milhões/mês. No itinerário sentido região do CPA, o aumento foi de 52% no mesmo período – subiu de 2,1 milhões para 3,2 milhões.

Projeto do transporte custará R$ 500 milhões

No projeto de nova licitação a prefeitura apresenta medidas para tentar sanar as falhas já históricas. A proposta orçada em R$ 102 milhões prevê a divisão de concessão em lotes, que serão assumidos por empresas distintas, que terão direito de exploração por vinte anos. Outros R$ 397 milhões ao longo do contrato.

A circulação dos ônibus seria dividida em arcos Norte/Oeste, Leste/Sul e linha de conexão por meio de micro-ônibus. No primeiro arco, circulariam 224 veículos; no segundo, 175; e no terceiro, 34.  Nesse modelo de arcos, as linhas passam a ser integradas por meio de Estação de Conexão (ECO), a serem criadas em pontos estratégicos nos três arcos.

Na soma passariam a circular pela capital 92 linhas distribuídas em 390 ônibus controlados por três concessionárias, com 3.461 viagens em dias úteis. Esses números estão ajustados à redução de frota que deve ocorrer com a circulação do VLT (Veículo Leve sobre Trilhos), que é estimado para liberação a partir de 2018. Conforme a Semob, as linhas com trajeto por Cuiabá/Várzea Grande devem ter redução em 18% da quantidade atual, e as que circulam somente em Cuiabá, de 25%.

“Isso deve ser controlado por um Centro de Controle Operacional (CCO) que terá participação da Semob, da Polícia Militar e de funcionários das concessionárias, que ficarão responsáveis por montar o centro de controle exigido em edital, para fazer monitoramento em tempo real do que estiver acontecendo no trânsito”, explica o engenheiro Arlindo Fernandes, responsável pela proposta de licitação.

A proposta também prevê a obrigatoriedade de instalação de ar-condicionado em uma quantidade mínima de 30% da frota para ônibus já usados e de 10% para veículos novos. Outra medida é a limitação no tempo de uso dos carros entre oito e 12 anos. Os veículos também deverão ter quatro câmeras de vigilância – três internas e uma externa.

Sem origem e sem destino

Para o engenheiro e professor da UFMT, Luiz Miguel de Miranda, o projeto da restruturação dos serviços públicos de Cuiabá não é possível ser realizado sem informações sobre a origem e o destino dos passageiros, item não apresentado em audiência pública.

“O projeto é muito bom em teoria, mas não apresenta a origem e nem o destino das pessoas que circulam diariamente nos ônibus. Sem essas informações não é possível realizar qualquer tipo de trabalho, visto que não haverá como saber quais são as necessidades da população”, critica.

Ele diz que o conhecimento de partida e chegada dos passageiros possibilita traçar a construção de uma rede adaptada às necessidades de cada região, o que não é marcada somente por densidade populacional. Esses itens influenciam diretamente o tempo de viagem, conforto de passageiros e regularidade em horários, principais cobranças feitas por usuários.

“Também de haver faixa seletiva nos principais corredores de tráfego, porque se a prefeitura quer atrair a população para o uso de transporte público, precisa ter condição de realizar serviço rápido, pontual e confortável”.

O engenheiro diz que a queda acentuada no uso de transporte em Cuiabá nos últimos nove meses se deve em parte à precariedade dos serviços ofertados. A Semob aponta a piora do trânsito devido às intervenções para obras de mobilidade urbana acelerou a mudança. Hoje, Cuiabá tem em média 1,2 carros por habitante.

Prefeito prioriza edital milionário

Ao contrário dos serviços para transporte público e coleta e tratamento de resíduos sólidos, a prefeitura procurou acelerar o trâmite de concessão dos serviços de iluminação pública para conclusão ainda neste ano.  A concorrência no valor de R$ 752 milhões tem candidato único e está em fase de análise da proposta técnica do grupo Consórcio Cuiabá Luz, formado pelas empresas FM Rodrigues e CIA Ltda., Cobrasin Brasileira de Sinalização e Construção LTDA. e Sativa Engenharia Ltda

Após interrupção por sete meses, o trâmite foi retomado no dia 31 de outubro, com previsão de conclusão em 40 dias. Caso haja vencedor, o grupo terá prazo de 90 dias para dar início aos trabalhos. O contrato ficará em vigor por trinta anos.

Conforme o edital, em três anos 67 mil lâmpadas incandescentes terão que ser trocadas por formato LED em toda a capital. Além disso, no primeiro ano de contrato, 27 mil lâmpadas deverão ser instaladas no sistema de iluminação pública em Cuiabá.  

Nesse prazo, as empresas vencedoras terão que desembolsar R$ 56 milhões no primeiro e no segundo anos de contratos para aplicar em serviços e R$ 40 milhões a partir do terceiro ano. Ao todo, o contrato estipula R$ 270 milhões de investimentos pela empresa ao longo dos trinta anos de validade do contrato. Outros R$ 112 milhões terão que ser desembolsados para trabalhos de operação e manutenção.

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Reinaldo Fernandes

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